Capítulo 1 - A Palavra Que Machuca

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           Nunca entendi bem o conceito de amizade. Como uma pessoa pode ser especial sendo apenas uma amiga? E se amigos são tão especiais, por que eles se vão com o tempo? Meu pai foi amigo de minha mãe grande parte da vida dele, e sabe o que ele ganhou em troca? Foi trocado por outra pessoa e a amizade deles se transformou em ódio. Até seus últimos dias, ele amaldiçoou minha mãe por ter sido abandonado, levando todo esse sentimento de tristeza e ódio consigo mesmo para seu túmulo. Não quero terminar como ele, me lamentando por ter sido apenas um amigo.

         Chamo-me Abel Correia, mas detesto meu nome; acho estranho me chamar Abel. A maioria das pessoas me chama de Bel, o que também não me deixa feliz — afinal, é um apelido de menina. Atualmente tenho onze anos, e com a morte recente de meu pai estou indo morar com minha mãe que nunca vi em toda a minha vida. Sinceramente, isso não é algo que quero fazer.

          Sempre vivi bem e meu pai era um homem muito bom, apesar de sempre ter tido problemas com relacionamentos por causa da minha mãe. Nas vezes em que ele estava bêbado, costumava contar de como ela nos abandonou e preferiu trocar um filho recém nascido por um cara que era amante dela. Sim, eu sei o que é um amante. Meu pai me contou muitas coisas sobre mulheres, sobre como elas são guiadas por emoções e desejos, acabando por largar as coisas que deveriam ser importantes e trocando-as por aventuras. Na verdade mesmo, nunca entendi bem o que ele dizia, mas sei de uma coisa: por ter escolhido me trocar por outra pessoa, minha mãe é má.

          Meu pai se chamava Charles, um nome que para mim também era um bem estranho e engraçado; parecia nome de cachorro. Ele sempre fez tudo por mim, nunca se casou e nem se quer namorou. Cuidou de mim a vida dele toda, até que teve câncer. Ele fumava muito e a doença acabou levando-o para o céu. Isso já faz uns três meses. Após muitas discussões judiciais, minha guarda acabou indo para a minha mãe. Não que minha tia gostasse muito de mim, aliás pareceu bem feliz em se livrar da minha presença. Mas eu realmente não queria ir morar com minha mãe, já que nem a conheço... A única coisa que sei dela é o nome: Larissa.

          Finalmente estamos chegando, parece uma vizinhança boa, com muitas casas. Minha tia fica fitando o local com um pouco de desdenho, como se morasse em algum palácio. De fato, ela não parece estar contente em ter que me trazer aqui, já que nunca gostou de minha mãe e vivia dizendo como ela havia estragado a vida de meu pai. Também não gostava muito de mim, dizia às vezes que eu era parecido com minha mãe e que tinha os olhos dela. Nunca gostei dessa comparação.

          – Já estamos chegando, Bel – me disse minha tia enquanto apontava uma casa à frente. — É aquela casa ali.

          – Aquela pintada de azul? — perguntei.

          – Sim – me responde secamente, realmente parecendo bem feliz de se livrar de mim. — Aquela.

          Na frente da casa, vejo uma mulher não muito alta, pálida e de cabelos loiros, trajando um vestido longo e florido. Só pode ser ela... Minha mãe. Nunca a vi na vida, nem por fotos. Meu pai tinha uma foto dela guardada, mas nunca pedi para vê-la realmente por não ter a menor intenção de conhecê-la.

          Assim que o carro para, minha tia sai e eu em seguida. Só depois de sair, percebo que havia um homem parado ao lado da mulher de vestido florido. Ele é alto, barbudo e tem cara de mau, os cabelos eram escuros, tinha um enorme nariz, e foi exatamente com ele que minha tia foi falar.

          – Bom dia, Marcos – ela diz sorrindo ao apertar as mãos dele. Em seguida se vira para a mulher de vestido florido e apenas faz uma reverência. – Larissa.

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