(dia 2: Chuva)
Bakugou observou a janela, vendo a chuva cair na rua, o vidro molhado e embaçado. A água corria rápido pelo chão, o vento rápido curvava os galhos das árvores com violência. Era igualmente assustador e lindo, e ele assistia um pouco obcecado, ouvindo o barulho das gotas contra o teto.
A água da chuva sempre o deixava um pouco reflexivo, contudo, talvez fosse a duplicidade da água em geral que o deixava assim, divagando sobre a natureza, sobre conforto e cuidado e violência devastadora ao mesmo tempo. Sobre coisas assustadoras e lindas que eram melhores se observadas de longe e belas apenas dentro do conforto de um abrigo. Às vezes ele se perguntava se não era exatamente assim.
Seus espinhos talvez ficassem brevemente escondidos sob a face bonita, todavia, se mostravam logo quando ele abria boca, o que ainda era um instinto. Mesmo todo esse tempo depois, ainda era quase compulsiva a forma como ele falava coisas agressivas. Coisas das quais se arrependia. Mentiras. Ou verdades, também, recheadas de um pouco de crueldade. Sua agressividade ainda era uma constante, algo que nem sempre fazia sentido para ele mesmo.
Sua respiração acelerou, e, inconscientemente, ele levou a mão ao peito para puxar o binder, esquecendo que já não o usava há meses. As cicatrizes em seu peito, cobertas agora por uma tatuagem que tomava todo o seu tórax e abdômen, apesar de escondidas ainda destacavam em sua mente. Um lembrete de sua liberdade.
Katsuki respirou fundo. Segurou. Soltou o ar, exalando. Repetiu.
Estava deixando sua mente espiralar em autopiedade e ódio. Esquecendo o quanto ele se esforçava para evoluir. Era fácil esquecer tudo isso, tão fácil. Ele sabia bem as pessoas que tinha machucado ao longo do tempo, e o fato de toda essa raiva ter sido herdada não mudava a sua responsabilidade. No entanto, assumir sua culpa e erro muitas vezes se misturava com o ódio e desprezo que ele nutriu por si mesmo por tantos anos, cuidando e regando como se fosse seu, apesar de, hoje, saber que não era.
Bakugou puxou a manga de sua camisa, que envolvia seu pulso, tentando segurar seus pensamentos. Estava só chovendo, não era motivo para uma crise de ansiedade. A chuva forte e o frio eram apenas motivo para aproveitar a folga merecida no conforto de sua casa, não para alimentar a espiral de ódio dentro dele.
Katsuki fechou os olhos, respirou fundo. Segurou. Soltou o ar, exalando. Repetiu.
— Ta com frio? Toma.
Braços fortes o envolveram por trás, colocando uma caneca quente em sua mão com cuidado.
Katsuki abriu os olhos devagar, um sorriso pequeno aparecendo em seus lábios. O líquido claro na caneca tinha um cheiro suave que ele ligou ao chá de amora e ele riu antes mesmo do outro se explicar.
— Eu peguei o primeiro que apareceu na minha frente, tem dez mil chás diferentes no armário, não ri! – Kirishima reclamou.
Ele estava enrolado em Katsuki como um coala, os braços apertados em volta dele e a cabeça descansando em seu ombro confortavelmente, observando a chuva com ele. Naquele momento, Bakugou se permitiu esquecer tudo. Os pensamentos sobre seus espinhos, sobre ser olhado de longe. Ele sabia que tinha seus defeitos, erros e culpa, todavia, nos braços de Eijirou era impossível achar que ele era algo belo a ser observado de longe.
Seu namorado obviamente não pensava assim: Kirishima o abraçava de corpo todo. Braços apertados em volta de sua cintura, peito colado em suas costas, quadril rente ao seu. Ele quase deitava em Katsuki, isso toda vez que o abraçava. Era confortável para si, um abrigo.
Entretanto, talvez pela primeira vez na vida, Bakugou percebeu que devia ser confortável para Eijirou também. Ele não era algo belo a ser observado de longe, mas alguém que merecia ser envolvido num abraço quente e carinhoso, apertado. Pelo menos, era isso que Kirishima demonstrava naquele abraço. Seus espinhos ainda estavam ali, contudo, não eram motivo para se isolar ou odiar: seu namorado era forte o suficiente para aguentá-los com um sorriso. Ele valia a pena o esforço: seu amor valia a pena o esforço.
Bakugou fechou os olhos de novo, rindo. Quanta besteira clichê e melosa. Seus pensamentos estavam uma bagunça hoje. Porém, tudo bem, esse era um segredo só dele.
Ao invés de responder o comentário de Eijirou sobre seus chás, Katsuki falou apenas:
— Eu te amo. — Ele sussurrou.
Kirishima o beijou, apertando-o ainda mais forte, e a caneca de chá foi esquecida por mais alguns minutos no batente da janela, esfriando. Dentro da casa, o barulho da chuva passou a ser acompanhado por risadas.
NOTAS: juro que não vai ter muito angst nessa fic!
continua!!!
VOCÊ ESTÁ LENDO
And still I will live here
FanficKirishima e Bakugou são casados. Kirishima e Bakugou são melhores amigos. Kirishima e Bakugou são melhores amigos (coloridos!). Não importa o momento do relacionamento deles, o amor transbordou em cada toque, fala e gesto. Vários momentos da relação...