Capítulo 11 - Precisamos conversar

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É meio da tarde, estou empilhando alguns desenhos no balcão quando vejo Tris entrar. Ela me encara, e sua expressão é de angustia.

- Olá Tris. – digo e olho para Bud, ele está concentrado no desenho de leão que está fazendo no braço do homem. Tris e eu podemos conversar um pouco. - Vamos para os fundos.

Vou para a segunda sala, fecho as cortinas, para que nem Bud, nem as câmeras possam nos ouvir ou ver. Me sento em uma das cadeiras e Tris senta ao meu lado.

Consigo sentir de longe a sua angústia, algo está errado.

-O que foi? - pergunto, quebrando o silêncio - Como estão indo as simulações?

Tenho medo de sua resposta.

- Muito bem. Parece que bem até demais.

- Ah. - respondo. Como eu imaginava, ela deve estar saindo em um tempo muito curto, o que está fazendo com que se destaque na iniciação.

- Por favor, ajude-me a entender. O que significa ser... O que diabos eu sou? O que isso tem a ver com as simulações?

Minha vontade é de manda-la embora, mas o fundo do meu peito diz para não fazer isso com ela, vou responder suas dúvidas, porém parecendo o mais dura possível. Não gosto de falar da Divergência, lembra muito George e a morte dele ainda me causa dor.

Minha expressão se fecha, apoio as costas na cadeira e cruzo os braços.

- Entre outras coisas, você ... - como explico isso? - você é alguém que tem consciência, quando está em uma simulação, que o que está vivendo não é real. Alguém que pode, portanto, manipular a simulação ou até mesmo encerrá-la. - lembro que foi por causa das simulações da paisagem do medo que fez com que George e Amah fossem descobertos. - E também - me inclino para frente e a encaro - Alguém que, por também ser da Audácia, provavelmente irá morrer.

Ela fica quieta por um tempo e parece que vai entrar em pânico, mas ao invés disso, ela solta uma risada seca e depois diz:

- Então eu vou morrer?

- Não necessariamente. - explico - Os líderes da Audácia ainda não sabem a respeito de você. Eu apaguei os resultados do teste de aptidão do sistema imediatamente e cadastrei o seu resultado manualmente como Abnegação. Mas pode ter certeza: se eles descobrirem o que você é, eles vão te matar.

Eu a encaro, enquanto ela me observa, quando contei a Lauren e Nikki sobre a verdade da morte de George elas disseram eu estava ficando louca. Mas Tris é como meu irmão e ela parece confiar em mim.

- Você está paranóica. - ela diz. - Os líderes da Audácia não me matariam. As pessoas não fazem essas coisas. Não mais. É por isso que temos tudo isso... as facções.

Inocente, ela realmente acredita na fachada do governo, assim como Lauren e Nikki ela acha que estou paranóica. Não tem outra solução, se quero ajudá-la, e por algum motivo realmente quero, preciso contar a ela de George.

- Você acha que não? - pergunto, irritada. - Eles pegaram meu irmão, então, por que não pegariam você? Por acaso você é tão especial assim?

- Seu irmão? - pergunta ela cerrando os olhos.

- É. Meu irmão. Nós dois nos transferimos da Erudição, mas o teste de aptidão dele foi inconclusivo. No último dia das simulações, eles acharam o corpo dele no abismo. Disseram que foi suicídio. Meu irmão estava indo bem nos treinamentos, estava namorando outra inicianda, estava feliz. - enquanto falo, as memórias brotam em minha mente, a felicidade de George com Lauren, na época minha melhor amiga, quando vi seu corpo no abismo... balanço a cabeça até que as lágrimas que se formaram vão embora. Não vou chorar aqui. Lembro de Tris preocupada com o irmão no dia do teste de aptidão.

- Você tem um irmão, não tem? Você não acha que saberia se ele tivesse tendências suicidas?

Não importa o que os outros dizem, irmãos próximos se conhecem melhores do que ninguém. Se George tivesse pensamentos suicidas, eu teria percebido.

Ela me olha, com o olhar baixo, seu olhar cai sobre o desenho do rio no meu braço direito. Fiz essa tatuagem depois de um ano da morte de George, em sua homenagem. Em sua homenagem porque ele era apaixonado por imagens de rios, mesmo que não temos tido muita oportunidade de ver um. E também, porque, de alguma forma, retrata como ele morreu, empurrado é afogado pela correnteza da água do abismo.

Para ela parar de encarar a tatuagem, continuo o assunto. Desta vez com a voz mais baixa.

- No segundo estágio de treinamento, George começou a sair bem muito rápido. Ele disse que as simulações nem o amedrontavam... elas eram como um jogo. Então, os instrutores começaram a prestar mais atenção nele. Eles se amontoavam na sala durante as simulações, em vez de deixar que o instrutor registrasse os resultados. Sussuravam a respeito dele o tempo todo. No último dia das simulações, um dos líderes veio nos observar no teste. E no dia seguinte George se foi.

Estou triste, mas é bom falar disso com alguém. Espero que Tris acredite em mim.

- E essa é a nossa única característica? Apenas conseguir mudar as simulações? - ela pergunta.

Eu não sei, mas duvido muito.

- Duvido de que seja, mas é a única que conheço.

- Quantas pessoas sabem sobre isso? - ela pergunta. - Sobre a manipulação das simulações.

Ela parece que está com problemas.

- Dois tipos de pessoas. As que querem matar você. - como Eric, Max e os outros líderes da Audácia. Ou que já passou por isso - como Quatro e Amah -, diretamente ou indiretamente, como eu.

Tris pensa um pouco. Quatro está aplicando as simulações, ele não entregaria ela, já que também é Divergente, mas se todas as vezes ele simplesmente apagar as simulações dela, irá ficar suspeito para os dois.

- Não entendo. - ela diz devagar. - Por que os líderes da Audácia se importam de eu consigo ou não manipular as simulações?

Ahh Tris, se eu soubesse isso...

- Se eu tivesse descoberto isso, já teria contado para você. A única coisa que consegui descobrir é que não é com a manipulação da simulação que eles estão preocupados; ela é apenas o sintoma de outra coisa. É está outra coisa que os preocupa.

O que não conto a ela, porque já foi muita informação pra ela por hoje, é que a Erudição está envolvida nisso tudo.

Eu não quero o mal dela, seguro suas mãos e as aperto entre as minhas.

- Pense bem. Essas pessoas lhe ensinaram a usar uma arma. Eles lhe ensinaram a lutar. Você realmente acha que não seriam capazes de machucar você? De matar você?

Chega! Preciso ir. Solto as suas mãos e me levanto.

- Preciso ir agora, ou Bud vai começar a fazer perguntas. - eu a encaro. - Tome cuidado, Tris.

- Está bem. Obrigada Tori. - ela diz e saímos da sala.

Tory Wu - Uma história DivergenteOnde histórias criam vida. Descubra agora