everyday, you.

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fevereiro 1997

new jersey

Maldito despertador que esqueci de desativar. Não são nem sete da manhã e me encontro completamente livre de sono.

Acordo com a cabeça esparramada em cima do diário. Cabelos bagunçados, rosto molhado de lágrimas frescas e dores pelo corpo inteiro devido ao mau jeito que estou na cama. Forço o rosto contra o travesseiro, mas é inútil. Não é possível mais pegar no sono agora, então decido me levantar e fazer algo proveitoso.

Mamãe provavelmente já saiu para o hospital, e meu pai deve dormir pelo menos até às dez. Não quero confessar, mas será que é tão ruim a primeira coisa que me vem à cabeça ser a extrema vontade de me encontrar com Atticus? Queria abraçá-lo, agarrá-lo, beijá-lo até sufocar. No bom sentido, é claro. Sinto que ele ficou uma eternidade longe e agora meu único desejo é estar perto dele para sentir o cheiro de sua pele e afar seu cabelo.

Está chuviscando, há indício de chuva mais intensa, contudo decido sair para correr pelo quarteirão. As chances de eu ir até a casa dele são definitivamente enormes. Mas pretendo me conter.

Gosto de usar roupas casuais e nada muito chamativo nas corridas matinais. Um café da manhã balanceado, hoje foi substituído por uma única maçã porque o apetite não está tão grande. O único gosto que me faria bem agora seria o da boca de Atticus, e embora eu já o conheça muito bem, acho que nunca vou enjoar.

Saio a passos apressados de casa. Walkman nos ouvidos com a playlist que meu pai me deu no meu aniversário de catorze anos. Os clássicos da sua juventude que se tornaram os clássicos da minha juventude. Em sua maior parte, interligados a boas memórias com meus pais, alguns amigos que não tenho mais contato, e algumas poucas com ele. Poucas demais, para o meu gosto.

Observo o céu por um instante quando faço uma pausa. Os gotejos começam a se intensificar, então visto o capuz. Mãos apoiadas nos joelhos, uma quantidade maior de suor na testa e os pulmões mais ofegantes do que o comum. Não me lembrava de estar tão desacostumada com as corridas matinais, mas isso com certeza está ligado ao fato de ter diminuído bastante o ritmo nos últimos meses. Não sei bem o que me deu motivação para correr mais hoje do que os outros dias, contudo uma diferença de apenas quinze minutos a mais na hora diária de corrida me deu a sensação de um cansaço três vezes maior.

Decido me sentar no chão. No meio da ciclovia. Cabeça apoiada na cerca do lago. Próxima demais de algo supostamente perigoso em um dia de chuva como uma cerca de aço.

Há pássaros voando pelo céu fugindo da chuva exponencial que se aproxima. Vejo pessoas saindo das ruas, buscando abrigo abaixo de toldos e casais escondidos por jornais que so tornam inúteis com tamanhas quantidade de água. Por um instante o pensamento corre a ele. Quase automático, na verdade. Atticus não daria risada do imprevisto de ser atingido por uma tempestade, não se importaria em me cobrir ou levar para um lugar seco, tampouco estaria preocupado com algo além da sua frustração por ser pego de surpresa por algo tão inconviniente quanto uma chuva. Não sei ao certo como me sinto ao constar isso. Não sei se queria que ele agisse diferente ou mesmo se queria passar por algo assim com ele e saber se ele me provaria o contrário. Atticus, o último romântico. Não dá pra acreditar nisso nem em pensamento.

Uma pessoa tropeça em meus pés e não fico furiosa como ficaria normalmente. Meus pensamentos estão tão nublados com a volta de Atticus que não consigo nem me importar muito com infortúnios do dia a dia.

"Desculpe!" diz de forma apressada. Abro a boca para dizer qualquer coisa, mas não consigo. E a pessoa também. Ficamos alguns segundos nos encarando abrindo e fechando a boca várias vezes sem saber direito o que fazer.

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⏰ Última atualização: Feb 28 ⏰

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