- Eu estou faminto – Rusth murmurou enquanto tentava encontrar a melhor posição para dormir.
- Não estou muito diferente. – Fang completou irritado, antes de se deitar ao lado de uma árvore. – Está cada vez mais difícil encontrar selvagens por aqui. A comida está escassa.
Uma fina garoa caia sobre a floresta. O vento de outrora havia cessado e tudo o que se ouvia no horizonte era o canto dos grilos.
- A revogação das leis de proteção à caça nos colocou nessa situação. – O lobo chacoalhou a cabeça para se livrar da água da chuva. Fang, por outro lado, não se importava com as gotas que molhavam seu pelo.
- Ele quer nos suprimir, retaliar-nos por um crime que não cometemos.
- Todas as características do assassinato levam a crer que foi cometido por um feral.
- Por um tigre feral – Fang lembrou com amargura. – E como o suposto responsável não foi encontrado, ele decidiu punir a todos. Isso não é justo.
Rusth manteve o olhar impassível de sempre. Diferente do seu amigo, ele não tinha o costume de externar suas emoções. Sim, ele também estava com raiva e frustrado, mas preferia guardar esses sentimentos para si, mesmo que Fang soubesse exatamente como ele se sentia. Era seu modo de lidar com as coisas.
Pensativo, o lobo levantou a cabeça para encarar o céu escondido sob as folhas das árvores.
- Você tem razão, não é justo, mas isso pode mudar com a vinda do príncipe à Pandorn.
- Não estou contando com isso – o tigre disse olhando para seu parceiro. – Ele vive na capital, não conhece a nossa realidade. Em Menestréia não há ferais vivendo em florestas, Zaoth poderá manipulá-lo por conhecer melhor a região.
- Isso é relativo, vamos esperar e ver o que acontece. – Havia certa esperança no tom de voz do lobo. Ele tinha fé que a vinda de Hector pudesse mudar a situação deles. - Por hora, precisamos pensar em algo para não morrermos de fome.
- O quão disposto você está para conseguir comida? – Fang inquiriu em um sussurro sombrio.
- Por que a pergunta repentina?
- Estou considerando seriamente a possibilidade de invadirmos uma vila humana para roubar carne.
Os olhos de Rusth encararam o tigre com incerteza diante a sugestão pouco convencional.
- É um plano muito arriscado.
- Podemos atacar pela noite, os humanos não enxergam bem na escuridão. Por outro lado, nós possuímos essa vantagem. Se formos sorrateiros o suficiente, conseguiremos passar despercebidos.
- Isso só vai acentuar a crise que vivemos com eles.
- Se não fizermos isso, vamos morrer. E não iremos atacar ninguém, apenas pegar um pouco de carne.
Rusth virou o rosto e deu um longo suspiro. Por mais que odiasse admitir, Fang tinha razão. Não havia para onde correr. A cada dia que passava, eles perdiam peso, força e energia.
O lobo não queria fazer isso, mas que escolha tinha?
- Espero que nós não nos arrependamos disso – disse resignado.
***
A viagem do porto até o palácio durou cerca de vinte minutos. Hector, Bela, Zarius e Aubrey foram na carruagem, enquanto Dalibor os acompanhou montado em seu cavalo. Eles não conversaram durante o trajeto. Com o líder da Guarda Provincial por perto, qualquer diálogo a respeito da missão poderia comprometer o disfarce.

VOCÊ ESTÁ LENDO
Floresta Setentrional
FantasyEste livro integra a série As Crônicas de Zordium, mas pode ser lido de maneira independente. A província de Pandorn vive momentos de incerteza. Humanos e ferais - animais dotados de razão - estão próximos de iniciar uma guerra civil. Enquanto o reg...