Dedilhar as palavras que pairam no ar, nem sempre era uma tarefa fácil, e adquirir cuidado com a pessoa pelo qual você aceitou fazer parte dos seus planos e bagunçar sua rotina, misturar o cheiro ao seu, saber sentir sua presença sem ao menos enxergar sua face. Sentir as faíscas, a necessidade de olhar com delicadeza e suprir sonhos construindo tudo juntos, mas também, acima de tudo, dar uma palavra sincera.
Pedro sempre pensou em como seria uma mistura de João com ele, mas nunca pensou na paternidade de um jeito mais crú e real da palavra. Era fácil enxergar o romantismo de ter o fruto de um amor tão crescente, mas de ponta a ponta, de dentro para fora, uma visão ampla, tudo aquilo tinha um peso e causava pânico. Uma criança, eles seriam responsáveis pelo futuro e pelo resto da vida de um ser, este mundo não estava preparado para receber a pessoa que Pedro mais amaria na vida, seu filho. Ele não estava preparado.
– não quero ter filhos, nem curto crianças eu gosto do Thomás por obrigação – ele respondeu a pergunta, enquanto sorria de lado, era uma piada. Mas o rosto de João havia desmanchado.
– entendi… – o cacheado desviou os olhos para o celular rolando a tela.
– e porque essa pergunta do nada? – Tófani desligou o último fogo e se aproximou do outro, que encolheu seu corpo.
– não sei, coisa boba da minha cabeça – riu sem humor e se levantou. – a bela tá me ligando, já volto. – caminhou até a ponta da escada e a subiu até o final em direção ao quarto.
No fundo, eram palavras difíceis de serem ouvidas. Os planos futuros de Pedro não eram como os seus. Ele sabia que eram muito diferentes em inúmeras coisas, mas como as coisas iriam fluir se a tão sonhada família que queria formar, seria arquivada?
Pensando sobre aquilo, João não percebeu quando o outro o olhava. Ele estava na porta com a bandeja que servia o almoço do cacheado e ainda vestia um avental de cozinha.
– conversar com a bela, eu não peguei essa desculpa – o mais alto soprou, diante a isso seus olhos voltaram na direção do chão. O cacheado ainda sentia os olhos do outro em si.
– ela não me atende, não sei o que aconteceu – coçou a garganta.
Tófani aproximou seu corpo até chegar na ponta da cama e se abaixou onde João estava sentado, ficando em sua altura.
– você pode me contar tudo meu amor, eu quero te ver bem, mas pra isso temos que trocar tudo que sentimos de ruim, hum? – suas mãos foram até as do mais novo entrelaçando seus dedos.
– é que eu sempre quis ter filhos, não no plural, mas uma família sabe? – suspirou sem coragem de encarar o outro, mas acariciava seus dedos. – eu não sei se isso é bom, você não quer – soltou das mãos do outro para passar por seus olhos.
– hey olha pra mim – o moreno pediu colocando sua testa na do outro, ele finalmente o encarava. – eu só tenho medo de ser um péssimo pai – riu de lado. – mas eu aceito fazer terapia de casal, visitar abrigos, podemos até apadrinhar uma criança e ver como funciona, podemos tentar no futuro e a nossa família com certeza vai ser linda, quando eu estiver pronto, mas em um futuro – dizia acariciando os cachos do namorado, que soltou um sorriso ladino.
– podemos ter gatos e eles serão os nossos filhos até você estar pronto – Romania parecia mais calmo, puxou o namorado pela gola da camisa para cima da cama.
– mas só depois que a gente se casar, né? – aproximou seus lábios dos de João, acariciou o nariz do castanho com o seu e selou os pequenos lábios dele em um beijo quente e carinhoso.
– quando a gente casar? , eu não quero casar com você, não quero me mudar pra fazenda – João brincou rindo entre o beijo, recebeu um pequeno beliscão em sua cintura.
– eu ia adorar te mostrar meu celeiro bonequinho de plástico.
A noite chegou.
Durante o resto daquele dia, eles conversaram sobre a ideia da terapia. Pedro dizia ao cacheado que ele precisava de médicos para cuidar de tudo que ele havia passado, e que ele o apoiaria em todos os momentos. João não gostou da ideia de cara, mas o namorado o jurou que também passaria com um terapeuta para o encorajar.
A verdade, é que ele sabia que precisava de ajuda e que velar seus sentimentos por muitos anos criaram feridas irreparáveis, agora alguém segurava sua mão e o obrigava a estar bem por inteiro, o amava de verdade.Após a conversa sobre terapia, Pedro marcou ao cacheado uma sessão naquela semana, eles fizeram compras para a casa que estava praticamente sem estoque de comida, João fez careta com muitas das escolhas de Pedro que dizia que ele precisava de verduras. Se deu conta que mais uma vez, seu pai havia bloqueado seu cartão, ele tinha algo guardado em sua conta, mas precisava economizar e por isso fez suas próprias compras.
No final do dia, Pedro o esperou dormir antes de ir embora. João queria pedir para que o mais velho ficasse lá, ele queria que Pedro estivesse sempre, mas não queria se precipitar ao pedir. Afinal, eles só eram namorados.
Chorou sentindo o vazio, as paredes eram grossas e o silêncio fazia muito barulho. Sua mente visitava sua casa antiga, seus pais e seus cachorros. Ele abraçou o travesseiro tentando imaginar como seria se seus pais tivessem dito “eu te amo” quando tudo veio à tona. Caminhou até a varanda, fumou e bebeu meia taça de vinho. Quando pensou em virar um pouco mais do líquido da garrafa, seu celular apitou.
Meu caipira💗
Áudio – boa noite meu amor, sei que você demora pra dormir então eu tenho um filme pra te recomendar pra você ver até pegar no sono.
espero que durma bem! Te amo, estou mentalmente te dando vários beijos e abraçando seus cachos com as minhas mãos.
VAI DORMIR!
Https/ocentantofilme.
O sorriso nao precisava de um disfarce, não mais. Caminhou até a cama procurado pelo filme, nem percebeu quando seus olhos se fecharam. Do outro lado da cidade, Pedro agradecia a lua e pedia as estrelas e aos seus guias que protegesse o seu amado.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Lábios de vinho: glória e dor ( pejão)
Fantasyapós enfrentar tudo por seu grande amor, João agora precisa lidar com as consequências, o que ele fará diante a tantas confusões internas?