Flores ao meu Amado [IV]

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"I wanna feel it... I bet on losing dogs... I aways want you when I'm finally fine"
~I bet on losing dogs - Mitski

[●○•★•○●]

Depois de uma semana, Fyodor foi liberado para voltar para casa. Sua cirurgia tinha sido bem sucedida e o processo de cicatrização de suas feridas estava indo muito bem. Sorte, era o que todos diziam, mas ele já tinha deixado de acreditar nisso.

Ele chegou em sua casa e deixou ao botas na entrada. Tudo estava incrivelmente limpo, diferente do que ele tinha deixado.

Outra coisa diferente: O bobo-da-corte não estava por perto.

Ele não achou estranho, afinal, ele mesmo tinha expulsado o acrobata de lá! Mas era como se a casa ficasse mais vazia agora... Ele deu de ombros, aquilo não fazia diferença.

Tudo estava anormalmente quieto. Olhando o relógio, ele percebeu que já eram quase três da tarde. Ele fez a contagem regressiva, como de costume.
3...2...1-

Um borrão roxo disparou pela sala de jantar. A figura derrubou um vaso de flores cheio de água em cima do violoncelo, que descansava perto da lareira. O vidro se estilhaçou no chão, quase atingindo Fyodor, que usava apenas meias em seus pés.

- Dostoy?! Você por aqui? - Nikolai gritou, tentando esconder a bagunça e rindo docilmente. - Por que essa cara?

- Tive um dejavu - Fyodor contou, sua expressão morta. Nikolai sorriu, se aproximando do assassino com os braços abertos.

Fyodor não estremeceu ao toque quando Nikolai o abraçou, o bobo-da-corte já tremia o suficiente. Fyodor pensou em matá-lo por um instante, mas aquilo seria muito cruel da sua parte, além disso, ele não teria forças para esconder o corpo. Nikolai o abraçou um pouco mais forte antes de soltá-lo.

- Senti sua falta! - Nikolai sorriu.

Fyodor se afastou com pressa, evitando encarar os olhos bicolores de Nikolai e atravessando a sala, se trancando em seu escritório. Nikolai o seguiu, apanhando as flores que tinha derrubado no chão.

- Não entre nos cômodos quando a porta estiver trancada, é falta de educação - Fyodor pediu quando Nikolai atravessou a madeira da porta com seu portal. - Eu não sei nem o motivo da sua presença na minha casa, então, se você puder se retirar...

- Eu te trouxe flores, Dostoy! - Nikolai anunciou, fazendo um bico e estendendo um buque a Fyodor. - Você não gosta delas?

Fyodor observou o buque de Narcisos com atenção, percebendo que as flores estavam frescas, como se estivessem sido colhidas a pouco tempo.

- Nunca gostei de flores - Ele disse, porém, pegou o buque com delicadeza. - Eu odeio Narcisisos.

Fyodor se levantou com calma e saiu do escritório, voltando pouco tempo depois com um jarro cheio de água, os narcisisos dentro do objeto.

Nikolai sorriu e saiu da casa.

[●○•★•○●]

Os dias pareciam passar rápido demais.

Nikolai trazia um novo buque de Narcisos a cada tarde. Fyodor trocava a água das flores com frequência.

Os dias pareciam passar muito devagar.

A doença se espalhava pelo corpo de Nikolai, a dor o enfraquecia. Fyodor parecia não o retribuir nunca.

Os dias pareciam repetitivos demais.

Nikolai aparecia na casa de Fyodor a tarde e entrava em seu escritório. As flores do dia anterior nunca estavam lá, apenas o jarro vazio.

Nikolai apareceu naquela tarde, como aparecia em todas as outras. Ele entregou o buque e se sentou ao lado de Fyodor, coisa que nunca fazia nos outros dias do mês.

- Eu te amo, sabia? - Ele contou, se encostando no ombro de Fyodor melancolicamente.

- Eu te amei, percebeu? - O assassino respondeu, sem tirar os olhos do computador. Mas na tela preta cheia de códigos, ele via o reflexo do bobo-da-corte.

Os dias logo iriam acabar.

- O que você fez com os Narcisos que eu te dei? - O bobo-da-corte perguntou.

Fyodor se levantou com pressa, fazendo Nikolai cair quando perdeu o apoio de seu ombro. O assassino foi até o armário, que ele usava para guardar armas, e tirou do fundo dele uma caixa de sapatos marrom. Ele a entregou a Nikolai e voltou a se sentar.

O bobo-da-corte já tinha se acostumado com aquele tratamento não verbal, então não perguntou nada sobre a caixa, apenas a abriu com cuidado. Ele se surpreendeu ao achar vários buques de Narcisos dentro dela, alguns já se despedaçando e outros ainda frescos.

- Tudo isso veio de mim? - Ele perguntou, quase rindo de felicidade. - Você guardou!

- Eu sempre odiei flores - Fyodor lembrou. - Mas Narcisisos me lembram de você.

Nikolai se virou para Fyodor, com a impressão de ter visto um sorriso em seus lábios, mas o rosto do assassino continuava sem vida. Ele sorriu dolorosamente e saiu do escritório.

Ele foi em direção ao banheiro e se reencostou sobre a pia. Folhas em sua garganta e pétalas em sua língua. Ele sentiu o gosto da flor em sua boca, mas a agonia era tanta que ele não pode descrevê-lo. Cuspiu tudo na pia, observando as flores amarelas e sangrentas. Ele choraria, mas isso só deixaria ainda mais claro que estava condenado a sofrer por sua ignorância.

Ele abriu a torneira e segurou o narciso em baixo da água, observando o sangue escorrer. Chacoalhou a flor para que ela não ficasse tão molhada. Quando ele voltou ao escritório, os Narcisos que ele presenteou naquela tarde já não estavam mais no vaso, ele os substituiu por novos.

- Adeus, Dostoy! - Ele se despediu, com um sorriso. - Muito obrigado por tudo.

Ele deixou um beijo na testa de Fyodor, que mantia seus olhos vidrados no computador.

- Adeus... - Fyodor respondeu quando ouviu a porta de entrada se fechando. O assassino se levantou de sua cadeira giratória e se espreguiçou. Ele pegou o Narciso do jarro de água.

Ele se virou para o armário de armas novamente, andando até ele e tirando outra caixa de sapatos do fundo do móvel. Essa, diferente das outras, guardava seu último buque de Jacintos, que já estavam abarrotados e murchos. Ele colocou o Narciso junto com as outras flores.

"Eu realmente odeio Narcisisos" Ele pensou. "Odeio me lembrar de você..."

Hanahaki | FyoLai [Por Favor, Me Perdoe]Onde histórias criam vida. Descubra agora