"Nothing in the world belongs to me, but my love is mine, all mine"
~ My Love Mine All Mine - Mitski[●○•★•○●]
Nikolai não apareceu na tarde seguinte. Não apareceu nem na segunda, tem na terceira tarde. Ele simplesmente desistiu, como Fyodor preveu que ele faria.
O russo percebeu o quanto sua vida era entediante sem um palhaço para o entreter. Na quinta tarde, ele foi a procura do bobo-da-corte.
Talvez porque, com Nikolai, ele parecia voltar a sentir algo. Talvez, por que a presença do ucraniano o fizesse esquecer que não existia esperança. Ou talvez porque, no fundo, ele mesmo não tinha conseguido parar de amar aquele idiota chamado Nikolai.
Ele entrou na casinha amarela que ficava no fim de uma rua deserta. A porta estava aberta, como da última vez que ele foi lá. Tudo estava em completa desordem, mas, de algum jeito, aquilo o fazia ter certeza que aquela casa pertencia ao palhaço.
Ele atravessou a cozinha e entrou no quarto de Nikolai, o quarto que brilhava com luzes de Led e decorações típicas de um circo. Ele encontrou o bobo-da-corte deitado na cama, dormindo, pacífico, ao lado de alguns narcisisos ensanguentados. Ele se agachou ao lado da cama rebaixada e afagou os cabelos brancos e despenteados.
— Nikolai! — Ele chamou. — Levante!
O bobo-da-corte não se mecheu. Fyodor revirou os olhos. Nikolai parecia estar morto naquela cama, mas ele podia ver sua respiração pesada enquanto o ucraniano dormia. Não era seu objetivo invadir a casa de Nikolai para assisti-lo dormir, mas era exatamente isso que Fyodor estava fazendo. Ele tentou chamá-lo mais uma vez.
— Nikolai! — Ele bateu em Nikolai com a mão, gritando para acordá-lo. — Levanta!
Nikolai resmungou algo. Fyodor se levantou, impaciente, e foi em direção a cozinha, voltando de lá com um copo de água cheio.
— NIKOLAI! — Ele jogou o líquido de uma vez no rosto do palhaço. — LEVANTA, PORRA!
O palhaço se levantou com um susto, resmungando e reclamando, mas se animando ao ver o rosto do assassino.
— AAAAAAH! — Nikolai gritou, batendo em Fyodor por reflexo ao ser acordado tão brutalmente. O assassino desviou por pouco. — DOSTOY?
Fyodor o encarou por um momento, observando os Narcisos espalhados pela cama. Ele pegou um deles e o girou em sua mão.
— Nunca mais vou aceitar qualquer tipo de Narciso que você me der! — Ele jogou a flor para o lado. — Vamos, levante-se, minha sala está muito vazia sem flores.
Nikolai piscou algumas vezes.
Então Fyodor estava lá apenas para pedir mais flores?! O mesmo russo que dizia odiar flores?! Ele recolheu os Narcisos da cama e os entregou a Fyodor, como um buque, mas o russo não os pegou.
— Você ainda está bravo comigo? — Nikolai perguntou.
— Nunca estive bravo com você — Fyodor afirmou.
— Então por que não vamos ao parque? — O Bobo-da-corte reclamou.
— Por que minha sala ainda está vazia e sem flores. — Fyodor contou.
Eles ficaram em silêncio.
— Dostoy é sempre tão ruim comigo... — Ele choramingou, fazendo um bico infantil. — Ele só me quer quando eu tenho flores... — Ele sorriu. — É bom te ver de novo, mesmo assim — O assassino riu.
O ASSASSINO RIU?!
Fyodor colocou a mão sob a própia garganta, com medo que novas flores aparecessem lá. Era a primeira vez que ele ria em semanas, mesês talvez, e, obviamente, o motivo era o bobo-da-corte a sua frente. Nikolai pode sentir sua garganta sendo fechada por flores ao ouvir a risada cansada do assassino.
— Dostoy? — Ele se levantou com pressa, segurando as mãos do assassino e as colocando perto de si, sem medo de ser morto. Seu sorriso era enorme, Fyodor lembrou do gato de Alice no País das Maravilhas. — Eu ouvi o que eu acabei de ouvir?
— Não, não ouviu — O russo se afastou, mas não soltou as mãos de Nikolai.
— Claro que eu ouvi, não sou tão burro assim! — O palhaço parecia irritado, isso só fazia a vontade de rir que Fyodor sentia aumentar. — Viu só? Está vendo? Isso é um sorriso no seu rosto! Então não minta pra mim, Dostoy! Você mesmo disse que Deus acha iss–...!
Fyodor acabou de vez com a distância que os separava. Ele selou seus lábios aos do palhaço com um gesto dócil.
Derepente, a agonia dos Narcisos foram embora. Derepente, seu colação acelerou sem causar dor ao seu corpo. Derrepente, Nikolai voltou a se sentir nas nuvens.
Fyodor sentia tudo que podia sentir ao mesmo tempo: sentia-se feliz por poder se sentir feliz, sentia seu coração vibrar e acelerar por ter o bobo-da-corte por perto e sentia-se irritado por não ter percebido aquilo antes, por não ter percebido a cura bem diante de seus olhos.
Quando Fyodor se afastou, ele pode ver os olhos arregalados do bobo-da-corte.
— Está tudo bem? — Fyodor perguntou, com um sorriso pequeno.
Nikolai parecia prestes a flutuar. Ele sorriu o maior sorriso que tinha e começou a pular feito um idiota.
— Sim! SIM! — Ele riu. — MEU DEUS, EU TE AMO TANTO, DOSTOY!
— Não jure por Deus, Nikolai... — Fyodor riu. — Isso é pecad–
— AH, VÁ A MERDA! — Nikolai gritou antes de beijar Fyodor de novo.
Por mais que Narcisos fossem belas flores, Nikolai tinha absoluta certeza de que não sentiria a falta delas.
— Eu também te amo, Nikolai — Fyodor sorriu pequeno, se afastando, mas sendo puxado de volta pelo bobo-da-corte.
Fyodor sabia que o vazio não duraria para sempre, sabia daquilo desdo dia em que agendou a cirurgia. Mesmo assim, estar naquele momento, naquele quarto, ao lado de Nikolai, o fazia sentir que tudo o que ele tinha feito valia a pena.
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Hanahaki | FyoLai [Por Favor, Me Perdoe]
FanficJá faz meses que a doença Hanahaki atormenta a vida de Fyodor Dostoyevsky, mas, mesmo com a enfermidade em seu estágio final, ele se recusa a contar o que sente para o principal culpado disso, Nikolai Gogol. > História inspirada na doença fictícia...