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Pov Camila


— Decidi que vou lambuzar o saco do detetive Lux de pasta de amendoim e o jogar no lago Pontchartrain — minha mãe diz. — Deixar que ele seja castrado pelos peixes.

— Essa é nova —  Comento, agachada atrás de um carrinho de pratos sujos, o único lugar dentro da Billy onde o meu celular consegue mais do que uma barra anêmica de sinal.

Estou com a cara a cinco centímetros de uma omelete meio comida. A vida em Nova York é extremamente glamorosa.

- O que ele fez dessa vez?

— Mandou a recepcionista não repassar minhas ligações.

— Eles te falaram isso?

— Assim, ela não precisou falar. Mas deu para notar. - Mordo o interior da bochecha.

— Bom. Ele é um bosta.

— É — ela concorda. Consigo ouvir ela tentando abrir as cinco fechaduras na porta de casa, chegando do trabalho. — Enfim, como foi o primeiro dia de aula?

— O de sempre. Um bando de gente que já se conhece e eu, a figurante de um filme universitário.

— Bom, eles devem ser todos uns idiotas.

— Provavelmente. -  Consigo imaginar minha mãe dando de ombros.

- Você lembra quando roubou a fita de Digam o que quiserem dos vizinhos? — Minha mãe pergunta.

Começo a ri sem querer.

— Você ficou tão brava comigo.

— E você fez uma cópia. Sete anos de idade, e já sabendo piratear um filme. Quantas vezes peguei você assistindo àquilo no meio da noite?

— Tipo, um milhão.

— Você sempre se matava de chorar com aquela música do Peter Gabriel. Você tem um coração mole, filha. Eu tinha medo de que se machuque. Mas me surpreendi. Você superou isso. Você é como eu, não precisa de ninguém. Lembre-se disso.

— Pois é. — Por meio segundo constrangedor, minha mente volta ao metrô e à garota da jaqueta de couro. Engulo em seco. — É, você tem razão. Vai ficar tudo bem.

Afasto o celular do rosto para ver a hora. Merda. O intervalo está quase acabando.

Eu tive sorte de arranjar um emprego, mas não sorte suficiente para ser boa nele.

Talvez eu tenha sido convincente demais quando Lucie, a gerente, ligou para o número de referência e deu no meu celular reserva. O resultado: direto para o salão, sem treinamento, aprendendo tudo na prática.

— Porção de bacon? — o moço da mesa dezenove pergunta quando eu sirvo o prato dele.

É um dos fregueses que Niko apontou no meu primeiro: um bombeiro aposentado que há vinte anos vem todos os dias tomar café da manhã. Pelo menos ele gosta tanto da Billy que não liga para o meu péssimo atendimento.

— Merda, desculpa. —  Me encolho. — Desculpa por dizer “merda”.

— Esqueceu isso — diz uma voz atrás de mim com um forte sotaque tcheco. Lucie chega com uma porção de bacon do nada e me puxa pelo braço na direção da cozinha.

— Obrigada. — Digo sentindo as unhas da gerente cravadas em meu cotovelo. — Como você sabia?

- Eu sei de tudo — Lucie retruca, o rabo de cavalo vermelho-vivo balançando sob as luzes encardidas. Ela me solta  perto do balcão e volta para o sanduíche de ovo e o rascunho da escala da semana seguinte. — Você deveria se lembrar disso.

A Garota do Metrô- CamrenOnde histórias criam vida. Descubra agora