Onde anda você?

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— Amigue, tá me ouvindo?

Eu despertei do meu delírio. Encarei os discos por tempo demais.

— Perdão, pode repetir? Tô avoade hoje — eu ri sem graça.

— Cabeça tá foda, hein Angelina! Enfim, eu perguntei se você viu aquela gatinha vendo as fitas cassete? — minha amiga sussurrou.

Eu estava distraída mas não era boba: demorei uns segundos nos discos novamente, antes de me virar discreta e analisar o cômodo.

A garota balançava os longos cabelos crespos falando animada sobre um assunto trivial, provavelmente sobre uma das fitas, já que ela segurava uma. O garoto do seu lado ouvia atento.

Essa observação ocorreu em menos de cinco segundos. Eu já voltava meu olhar para minha amiga e nós sorriamos com a vista. A garota era cativante.

Minha amiga se apressou para a ala dos quadrinhos, deixando eu e a sala de antiguidades sozinha. E a garota bonita, é claro. O amigo deve ter ido ao banheiro.

Não era uma sala de antiguidades, mas apenas um cômodo reservado as fitas cassetes, discos de vinil e outras coisas retrô.

Sempre adorei levar tempo a escolher os discos, tinha tempo de comprar apenas alguns por mês, e deviam ser perfeitos. Puxei um disco de "Onde anda você". Nunca fui muito desse estilo de música, mas sempre achei interessante. Me distraí tanto que nem percebi a garota se aproximando.

"Eu amo essa música" ela disse.

Como pode?! Até a voz da lazarenta era bonita. Me peguei olhando pra seus lábios e depois seus olhos enquanto dizia obrigada. O momento todo passou como um borrão. A única parte daquela tarde que me foi esquecida. Hoje não consigo mais lembrar direito da tua voz.

Nós conversamos brevemente sobre música. Ela compartilhando seus gostos, e a cada palavra eu me apaixonava mais. No final, ela me passou o telefone. Eu falei que mandaria mensagem. Após cinco minutos de conversa eu sabia seu nome, música preferida e até quantos irmãos ela tinha!

Eu não conseguia parar de sorrir e rir sozinha. O amigo dela saiu do banheiro e ela disse que precisava ir. Mas não antes de me dar um beijo rápido na bochecha. Aí era eu sozinha numa caixa de memórias.

A euforia foi grande no dia na semana, no mês. Ela não respondeu minha mensagem e foi dada como desaparecida. Faz anos e nunca foi achada. Não sabia que tinha como ter tanta saudade assim de alguém que conheceu por tão pouco tempo.

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