Capítulo 1

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ALAN PARKER

—Tem certeza que não vai?—

Kai me pergunta pela milésima vez. Ele estava fazendo o possível para me convencer que seria uma boa ideia matar a aula de embriologia para ficar na biblioteca escolhendo livros. A faculdade de Medicina não era nada fácil,escolhi esse curso para fazer a vontade de meu pai. Meu desejo mesmo era fazer fotografia. Deis do meu aniversário de doze anos quando minha mãe me presenteou com uma câmera,eu fiquei obcecado pelo ramo. Pesquisei sempre sobre as faculdades de fotografia e sempre tive o apoio de minha mãe,mas tudo mudou quando ela teve um infarto e não resistiu.

Me lembro como se fosse ontem,era meu aniversário de dezesseis anos,eu não queria festas ou presentes. Eu só queria a presença dela. Ficamos até tarde vendo nosso filme favorito,O Mágico de Oz. Era um filme mágico para mim,mas no final percebi que não era o filme que era mágico,e sim ouvir ela cantando todas as músicas do musical com sua voz doce que o tornava mágico. Na metade do filme ela já tinha os olhos fechados,eu não deixei o sono me levar e continuei assistindo até ouvir a respiração de mamãe ficar mais forte e todo o seu corpo ficar agitado.

Não lembro muito bem oque aconteceu depois,fiz o possível para apagar essa memória ruim da minha cabeça. A única coisa que lembro é de chamar meu pai e me trancar no meu quarto logo depois com medo de ver ela naquele estado. Eu desanimei com a fotografia depois de sua morte,não tinha mais motivos para seguir com isso sem ter ela aqui para me apoiar.

—Eu não sei não Kai—falo suspirando—não acho uma boa ideia perder as aulas da faculdade só para olhar uma estante de livros velhos.

—Não são livros velhos,Parker—fala com uma cara nada boa—são cultura,e na biblioteca da faculdade tem autores muito melhores do que os que tinha na escola.

—Tudo bem,mas só se você comprar um maço de cigarro antes de voltarmos pros dormitórios—Falo com um sorriso sarcástico.

Kai tinha acabado com meu maço todo ontem a noite. Tínhamos acabado de chegar em uma das festas da fraternidade ontem e Kai acabou esbarrando com sua ex namorada,Nathalia. Ela era o capeta disfarçado de gente,fez um inferno na vida dele. Traiu ele com um dos seus amigos mais próximos e agiu como se nada tivesse acontecido. Vendo ela naquela festa o deixou nostálgico e ansioso ao ponto de acabar com todo meu maço de cigarro.

—Eu já seria obrigado a comprar mesmo—Fala conformado e me arrastando em direção a biblioteca.

As prateleiras da biblioteca estavam cheias de livros antigos de capa dura e mole,autores famosos como William Shakespeare,Charles Dickens e James Joyce. Havia por volta de dez pessoas espalhadas concentradas nos livros que seguravam,não se ouvia nada,nem um cochicho ou uma conversa desconexa. Por isso odiava bibliotecas,parecia um hospital de tão silencioso. Na verdade,nem um hospital é tão silencioso. Kai sempre me obrigava a acompanhá-lo porque pelas palavras dele,"É horrível estar sozinho em seu lugar favorito".

—Será que você pode agilizar e escolher logo "Kaizinho"?—

Ironizo seu apelidinho ridículo criado por Nathalia. O relacionamento deles era muito meloso,viviam cheios de grude e apelidinhos ridículos. Não posso negar que mesmo sendo enjoativo presenciar aquilo tudo,era legal ver meu melhor amigo feliz daquele jeito. Mas a felicidade que ele sentia não foi nada comparada com a tristeza que ela o fez sentir. Kai entrou em depressão,passou a frequentar todos os terapeutas possíveis e não demonstrava nenhuma melhora. Até que nas férias de verão o levei para visitar sua família em Boston.

Me sentia totalmente acolhido com a família de Kai,eles eram carinhosos e prestativeis. Sempre se preocupavam muito comigo também,eles eram um dos lugares favoritos de Kai. Passamos maior parte das férias lá,e quando voltamos,Kai tinha voltado também. Eu costumava provocá-lo fazendo piadinhas sobre a vadia da Nathalia,mas não era para deixá-lo triste,e sim para tornamos isso um assunto qualquer e sem importância ao ponto de não afetá-lo.

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