I

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   Lembro-me da primeira vez em que estive no reino de Fítia, lembro-me também de insultar o seu príncipe, Aquiles, que de forma maçante, achou graça.
   Menoécio, meu pai, me castigou por isso, disse que nós poderíamos até mesmo entrar em guerra por conta de minhas palavras. Mas Aquiles decidiu não se queixar de mim, o que me foi mais maçante ainda.
   Nesse instante, estou indo para Fítia novamente, fomos convocados pelo rei Peleu para um jantar afável. Não posso dizer que me encontro afável também, muito pelo contrário, estou bem irritado.
 

   Chegamos no grande castelo de Fítia, não posso negar que tudo aqui é realmente luxuoso e bonito. Ao entrar posso ver quadros e vasos retratando histórias sobre as guerras que Peleu pelejava, criadas para todos os lados, grandes janelas, algumas das inúmeras crianças que viviam no castelo, e por fim, nos esperando em frente a uma grande escadaria, Aquiles e Peleu.

   -Vocês chegaram! Que bom é vê-los aqui. -Disse o rei soando afável.

   -Peleu! Eu que o diga. Eu e meu filho estamos honrados por estar aqui nesta noite. -Disse meu pai com o mesmo tom do rei.

   -Aquiles, meu filho, estava ansioso por hoje, não parava de contar as horas para ver Pátroclo.-Eu? Aquiles queria me ver? Ah! Que os Deuses me ajudem a aguentar está noite.

   Assim que olho para o lado, consigo notar o príncipe me encarando. Tem olhos claros e marcantes, um maxilar definido como o de um adulto, mesmo tendo a minha idade, cabelos louros e na altura dos ombros, particularmente bonito, do meu agrado. O que estraga sua beleza é concerteza sua personalidade impertinente e arrogante. Ele me olha com olhos astutos, e presumo que esteja julgando cada poro em minha pele.

   -Pátroclo!-Exclama-Venha comigo, ainda tem tempo até o jantar.

   -Menoécio, Peleu.-Disse apartado enquanto saia da sala junto a Aquiles.

   O príncipe de Fítia me leva até um quarto, um quarto quase vazio, preenchido apenas por um banco e um baú de madeira com detalhes em dourado.

   -O que você quer?-Disse.

   -Sua companhia, isso não está claro?

   -E de que a minha companhia te serve, príncipe?

   -Não me chame de príncipe, Pátroclo. Quero sua companhia pois a dois anos atrás vc me insultou, e isso me chamou atenção.

   -Com todo respeito, você é algum tipo de masoquista? Posso te insultar mais, se quiser.

   Aquiles fez uma breve pausa, quase imperceptível, e disse:

   -Você me intriga, não sou masoquista algum, mas sou curioso. Talvez seja ignorância minha, mas ninguém me dirige a palavra igual a você, não tem medo? Sou aristos achaion.

  -Sua postura de semideus não me assusta. E caso queira saber, é sim ignorância sua.-Aquiles sorri para mim, como quem acha graça. Se acha tão superior assim?

   -É isso o que gosto em você, quero ser seu amigo, venha morar comigo, seja meu therapon!-Significa companheiro, o homem mais próximo do rei, nesse caso, príncipe.

   -Pronto, devo estar louco, eu também sou um príncipe! Não sou nenhum exilado, tenho um reino para assumir também! Não percebe tamanha arrogância?-Meu punhos estão cerrados e sinto minha palma doer a medida que forço mais e mais os meus dedos.

   Aquiles arqueia seu cenho e abre a boca diversas vezes, mas não consegue falar.

   -Não, não vou ser seu amigo e muito menos seu therapon!-Digo batendo o pé.

   -Puff!-Aquiles solta uma risada infantil porém viril.-Você é engraçado, eu sei que você também é príncipe, mas estou certo de que tem irmãos também. Não sei o motivo de sua cólera por mim, mas quero muito ser seu amigo, Pátroclo!-Diz risonho.

   -Minha cólera por você? Assim que eu entrei em seu castelo a dois anos atrás você passou longas duas horas falando sobre como tinha me achado miúdo e frágil, igual a uma garota! Sem contar que você se acha o último guerreiro do mundo. Não se esqueça que você nunca foi a campo, ainda.

   -Eu feri o seu orgulho? Jura que ainda se sente ofendido? Falei de bom coração, te achei fofo como uma garota! Apesar de nunca ter pensado isso de uma. Só para constar, apesar de ser Aristos achaion, não estou afim de lutar. Vamos, passe uma semana aqui em Fítia, não, duas, e eu lhe mostrarei que vale a pena estar comigo!

   -Não vou passar mais tempo que o combinado neste lugar, vou ser educado apenas na frente de meu pai e Peleu. Se quiser me provar algo vai precisar de muito esforço. E se me chamar de fofo como uma garota mais uma vez arranco seu escroto¹ com as minhas mãos.

   -Por favor não toque em meu escroto, ainda.-Meu rosto fica vermelho em cólera.-Temos um acordo? Juro ser um bom garoto.

   -Faça o que quiser. Vou até meu pai, adeus.-Me viro para a porta e pego a maçaneta, porém sinto a mão de Aquiles sobre a minha.

   -Não! Fique aqui, quero lhe mostrar algo.-Ele vai até o baú e de lá tira uma lira, uma lira muito bonita. É de madeira clara e tem pinturas em um marrom adorável.-Sente-se, por favor.

   Contragosto me sento no tapete que fica no centro da sala, e me aconchego com algumas almofadas que se encontram ao lado. Aquiles se senta no banco a minha frente, e por um instante sua pele realmente reluz como a de um semideus. Ele ajeita a bela lira em seu colo e começa a tocar. Me vejo arfante em meio a este som, sua voz é suave e seus dedos são fugazes na lira. Seus olhos estão fechados, suas bochechas estão rosadas e seus cabelos estão reluzindo feito ouro, tudo isso lhe da um ar adorável de garoto. Aquiles termina sua canção e diz para mim:

   -Gostou? Posso cantar para você todos os dias se isso te fizer ficar!

   Sinto minhas bochechas queimarem em vergonha. Desvio meu olhar do de Aquiles e digo:

   -O que você quer de mim? Não tenho nada para lhe oferecer e mesmo assim você me trata como se não pudesse viver sem mim.

   -Já disse, eu te acho adorável e quero ter você para mim.-Diz descaradamente.

   -Você falando assim... não vê que eu sou um homem? Não tenho ceios e nem belas curvas como as outras garotas tem! Se você me acha parecido com uma delas sinto em te dizer, eu não sou.

   -Quanto a isso não se preocupe, tenho ciência de que você é homem, e não ligo para isso. Sou aristos achaion, faço o que eu quiser e ninguém pode reclamar disso.

    -Você é de fato irritante. Não pode dizer coisas assim, não entende!-Agora me levanto do pequeno amontoado de almofadas e vou na direção de Aquiles, estou a alguns centímetros de seu rosto.-Você não pode ter tudo o que quer, só porque quer.

   -Você estando perto assim de mim, imagino se isso não é algum convite... -diz ignorando completamente o que eu disse.

   -Você? Eu estou indo embora, adeus!

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1-Vale ressaltar que escroto é literalmente as bolas de um homem.

Beijos da Maingui🩷

Aristos AchaionOnde histórias criam vida. Descubra agora