Palram

13 2 0
                                    

Apesar da umidade relativa devido à noite chuvosa, suas roupas não se encontravam tão ensopadas quanto esperava, contudo, ainda se apresentavam desconfortáveis de encontro a seu corpo devido à areia e ao sal que endureciam o tecido, deixando uma sensação áspera igual a uma lixa.

Caminhava pelas vielas com cuidado, sempre retraindo-se às brumas quando via o brilho alaranjado provindo do lampião de uma ronda, logo teria que ficar atento ao som de seus passos também visto que o céu já apresentava alguns escassos raios de alvorada. Não poderia arriscar um encontro com os guardas, estava sem seus documentos e sua aparência não deveria ser a das melhores, a última coisa que gostaria era de ser levado à uma delegacia para prestar esclarecimentos do porquê de estar transitando pelas ruas tão tarde.

Dust tomou um susto quando uma janela se abriu acima de si com uma pancada forte, porém a empregada – ainda levemente sonolenta – não notou sua presença, e ele agradeceu mentalmente por isso, apressando seu passo antes que o som atraísse algum guarda retardatário.

Após mais alguns metros, finalmente seus sapatos atingiram os paralelepípedos que constituíam a rua em que a pousada ficava. O mato crescia vigorosamente sob a escadaria que dava acesso a porta da frente, e ele fez uma nota mental para limpar e reparar os degraus mais tarde. Não sabia quanto tempo ficaria longe do mar, esperava que pelo menos conseguisse voltar a pescar antes do período de defeso, ou não teria como pagar os reparos de Toby. Não que estivesse preocupado com proventos, possuía até uma boa quantia para emergências, o suficiente por até seis ou sete semanas antes de precisar procurar por marinheiros em busca de ajudantes. Estava, na realidade, preocupado com a ociosidade. Não gostava de ficar quieto e em terra por muito tempo, provavelmente porque estava tão acostumado a ficar em um barco em alto-mar que isso se tornara algo intrínseco de sua natureza. Auxiliar Melanie e Lilian a cuidar da pousada ajudaria a evitar que sua ânsia em voltar para a água ficasse fora de controle. Além de que agora, olhando com mais calma, o esqueleto podia notar como os anos pesavam sobre o prédio; haviam rachaduras em diversas janelas, assim como as paredes de madeira precisavam de uma boa demão de tinta, e, talvez, até refazer o letreiro.

Dirigiu-se para a lateral do prédio e, enquanto escalava a sebe com o objetivo de pular o muro e entrar pela porta dos fundos, pensava o quão feliz Lilian ficaria caso aquilo atraísse mais clientes e, possivelmente, novos inquilinos.

Caiu pesadamente do outro lado, escorregando na lama que se formara no pavimento após a tempestade, mas conseguindo manter-se de pé. Olhou ao redor para ver se algum vizinho ou ronda havia notado sua movimentação, todavia, as janelas continuavam fechadas firmemente e escuras; e nenhum som de alarde veio da rua, então acreditou ter se safado.

O quintal era um paralelogramo circundado por uma cerca alta de madeira, com uma humilde horta em uma de suas arestas, um pequeno galpão de ferramentas em adjacência, e compridos varais que constituíam praticamente 70% do espaço central. Havia um cheiro doce e denso no ar, e Dust notou que as damas-da-noite de Melanie, localizadas próximo à parede da pousada, haviam florescido naquela noite. A visão do arbusto fez com que pensasse nela, dominando seu ser com uma inquietude nevrótica.

A porta dos fundos estava obviamente trancada, porém ela possuía uma janela basculante de três sessões embutida na madeira de lei, e Dust sabia muito bem que se forçasse o vidro da janela de cima próximo à dobradiça, ela se abriria. E foi o que ele fez, forçando a peça, as sessões se abriram com facilidade, e ele enfiou seu braço até o cotovelo, achando a chave na fechadura e a girando. Então, ajeitou sua postura e empurrou o resto de seu membro superior pela abertura até encaixar a articulação na quina entre a janela de baixo e a madeira, esticando seus dedos ao máximo com o objetivo de destrancar o segundo trinco que ficava bem mais abaixo. Todavia, suas falanges apenas roçaram o latão, e ele foi obrigado a ficar na ponta dos pés, empurrando ao extremo seu braço, com a janela do meio forçando seu pescoço de uma maneira desconfortável. Finalmente conseguiu alcançar o trinco, e a porta se abriu com um rangido baixo.

Você leu todos os capítulos publicados.

⏰ Última atualização: Nov 27, 2023 ⏰

Adicione esta história à sua Biblioteca e seja notificado quando novos capítulos chegarem!

Amor Por PeixeOnde histórias criam vida. Descubra agora