14-Umα noite e um menino inesquecível

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Aviso: Suicídio e automutilação. Esta é basicamente uma recontagem das lutas mentais e da tentativa de suicídio de Aspen.



A arma praticamente brilhava à luz do sol. Ela estava sozinha sobre a mesa, pois o dono da mesma havia esquecido de colocá-la de volta ao coldre.

Aspen olhou com tristeza para a pistola solitária enquanto pensava em pegá-la. Ele estava dividido.

Parte dele queria deixar aquilo como está, proteger-se da morte inevitável se a agarrasse.

A outra parte dele queria pegá-la, guardá-la até precisar dela. Até que os pensamentos ficaram tão terríveis e desgastantes que ele não aguentou mais.

Lamentavelmente, foi o último que ocorreu. Aspen lançou um rápido olhar para Thomas e Teresa do outro lado da sala, apenas fazendo seu trabalho, antes de pegar a arma e colocá-la na cintura da calça.

Ele a guardou em seu quarto durante meses.

Ao longo desses meses, ele não permaneceu livre de incidentes, como a lâmina de barbear na mesinha de cabeceira poderia explicar. Cicatrizes e crostas cobriam seu corpo aparentemente frágil, cobrindo-o como um esmalte preto e grosso cobriria uma unha. Um resíduo deixado de tristeza e, mais importante, de dor.

Ele usava aquela mísera lâmina todas as noites, sempre em uma nova parte do corpo. Até que ele ficou sem espaço e começou a examinar as áreas onde as cicatrizes haviam cicatrizado. Ele estava com cicatrizes, carbonizado e inimaginavelmente agonizando.

Chegou um dia, porém, em que ele não tinha mais espaço para cortar. Seu corpo estava cheio da agonia de sua própria mente, e isso estava se tornando demais.

Ele ficou cauteloso, a mente lhe dizendo para seguir em frente e pegar a arma, enquanto seu coração implorava, implorava para parar.

Abrindo a gaveta da mesa de cabeceira, ele agarrou o cabo da arma e tirou-a de debaixo de uma pilha de revistas.

Colocando-a no cós da calça, ele caminhou em direção ao banheiro, trancando a porta com segurança.

Ele desmoronou no chão, com os lábios trêmulos e os olhos vidrados enquanto puxava a arma, tirando a trava de segurança, e puxava o ferrolho, engatilhando a arma. Ele se preparou enquanto suas lágrimas escorriam de seus olhos, um fluxo constante de vida, que logo não existiria mais.

Ele segurou a arma contra sua própria cabeça, respirando fundo enquanto seu dedo avançava em direção ao gatilho. Ele o segurou ali, imóvel, enquanto o contemplava.

A contemplação não venceu, porém, quando ele puxou o gatilho, o tiro disparando da arma em direção à sua cabeça. Só que não foi uma bala que saiu, mas sim uma bala de festim.

Isso não o matou, apenas lhe causou uma pequena concussão, mas ele decidiu não contar a ninguém.

Naquela noite, ele esperou ansioso no banheiro, presumindo que alguém entraria, ao ouvir o tiro. Mas ninguém apareceu, então enquanto ele estava sentado ali, as lágrimas não escorrendo mais enquanto seus olhos secavam, ele estava sem emoção.

Nenhum pensamento atravessava a sua mente, ele encarava fixamente o nada, apenas existindo em um estado agonizante enquanto sua cabeça latejava.

Eventualmente, quando o amanhecer chegou e nenhuma alma veio ver como ele estava, ele finalmente se levantou. O menino voltou para seu quarto, escondendo a arma de volta no lugar, e se trocou para ir trabalhar.

Ele agiu como se nada tivesse acontecido, como se não tivesse tentado se matar naquela mesma noite. Ninguém percebeu, nenhuma palavra foi dita a ele, além de algumas sobre como fazer seu trabalho.

Ele tinha apenas onze anos e ainda assim sua mente já estava dominada por pensamentos terríveis.

Com o passar dos anos, ele viu um menino em particular desaparecer durante um mês. O menino era bastante magro, com cabelos loiros desgrenhados e da mesma idade de Aspen. Ele se agarrou à memória do menino, queria ter certeza de que ele não seria esquecido.

Por que? Não tinha certeza, Aspen não pensava tanto nos outros que desapareceram. Mas esse garoto era diferente, e Aspen não queria que ele passasse despercebido, esquecido.

Ele se agarrou ao menino, com todas as forças que ainda lhe restavam, como uma tábua de salvação, tentando manter a memória daquele garoto.

Aquele menino pulou, aquele menino caiu, aquele menino sobreviveu.

Aspen puxou o gatilho, Aspen mentiu, Aspen sobreviveu.

Talvez tenha sido o destino, que duas pessoas com pensamentos e tentativas de acabar com tudo ficassem juntas. Talvez suas almas estivessem conectadas, talvez não.

Aspen lembrou-se de Newt, lembrou-se de seu desaparecimento, lembrou-se de observar as câmeras enquanto o menino saltava, lembrou-se de ter esperado ansiosamente para ver se havia sobrevivido. E ele se lembrou do alívio que passou por ele quando descobriu que havia sobrevivido.

Newt não sabia que Aspen sabia de sua tentativa de suicídio, e Aspen achou melhor não tocar no assunto. Porque se o fizesse, teria que trazer à tona sua própria tentativa, algo que ele mantinha profundamente escondido, esmagado abaixo da superfície.

Se você mantiver as coisas reprimidas, não precisará se preocupar com elas, por enquanto. Mas eles borbulham, apodrecendo até ficarem cada vez maiores, mais furiosos.

Você não pode manter as coisas escondidas para sempre, mas com certeza pode tentar.

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