Meu espetáculo... terá fim?

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Às vezes, gosto de observar as lanternas enquanto caminho pelas ruas de Fontaine e lembrar dos espetáculos em que vi, mas isso sempre me fez pensar se aquela mulher do espelho conseguirá cumprir o que disse, que iria salvar todos daquela nação enquanto eu ficaria fingindo ser o Deus que eles querem.

Já fazem Quinhentos anos que não a vejo, não recebo notícias e nem mesmo sei como ajudar todos. Penso às vezes se isso vai realmente dar certo, se depois disso poderei aproveitar a vida como os humanos aproveitam. Até mesmo esqueço quem sou e às vezes acabo acreditando que sou realmente a Arconte.

Hoje estava caminhando pela rua e encontrei uma loja cheia de gatos e doces, estava me sentindo cansada que quando estava brincando com um gatinho, nem mesmo percebi que lágrimas estavam brotando em meus olhos e escorrendo pelo meu rosto.
Todos os dias paro em minha cama suspirando enquanto choro, apenas queria que isso se encerrasse, queria contar a alguém o que estava sentindo, tudo isso é tão doloroso.

Me sinto uma marionete em meio às minhas próprias palavras, é como se elas não fossem minhas. Minha alma dói ansiando por uma liberdade que é quase impossível.
Será que serei feliz?
Poderei amar alguém um dia ou até mesmo aproveitar a vida como os outros?
Será que conseguirei ajudar o povo de Fontaine?

Minhas lágrimas são como as inúmeras cachoeiras dessa nação, às vezes acho até mesmo que as minhas lágrimas será o motivo da inundação dessa nação. Me sinto uma máquina cansada sendo forçada sempre ao mesmo trabalho de matar quem sempre quis ser, de matar todos os dias a mim mesma para ser o que os outros querem que eu seja.
Uma Deusa.
Uma autoridade.
Uma divindade que realmente demonstra sabedoria e superioridade.
Tudo que nunca soube ser, apenas fingir ser.

Fingir é muito mais fácil de saber, pois assim as pessoas acreditam, já que elas não procuram saber sobre a verdade.

Sonho todas as noites poder contar a todos sobre quem realmente sou, sobre o meu sacrifício que ando fazendo todos esses séculos.
Não quero ser reconhecida, quero ser livre de um fardo infernal que me faz afundar no meu próprio desespero.

Tenho medo de ser insuficiente.
Tenho o enorme medo de que minha presença seja inútil para a população dessa Nação.
Quero provar que estou me esforçando.
Quero que todos vejam as minhas ações atentos como ficam ao ver uma apresentação de teatro.

No primeiro dia em que apareci para todos, prometi que faria todos reconhecerem o que era a verdadeira justiça e como eu executaria.
Mesmo assim, consegui falhar miseravelmente em um dos julgamentos e passei vergonha na frente de todos, principalmente do Viajante.
Aquele ser que nem mesmo consigo compreender.

Sua determinação me deixa admirada, posso não saber sobre suas reais intenções, mas tenho inveja de sua força e audácia de desafiar as pessoas sem qualquer medo.
Mesmo assim, continuarei fingindo que sou mais forte e que minha autoridade supera qualquer um de seus feitos.

Chegarei no palco e falarei que seus feitos são inúteis, por mais que saiba que apanharia caso lhe chamasse para um duelo oficial.

Me olho no espelho na esperança de poder saber o que aquela mulher viu em mim para ter que fazer isso tudo. Meu coração é uma lata velha que já não consegue se manter firme, um mínimo momento de conforto e já terá lágrimas em meus olhos, essas que irei dizer que apenas a demonstração de um poder que nem mesmo tenho. Agradeço todas as vezes que Neuvillete me ajudou me retirando da frente das pessoas e me deixando em um local mais confortável, é um companheiro em que admiro.

Quando lhe vejo naquela grande cadeira iniciando os julgamentos, me sinto como se estivesse numa aula, pois espero um dia poder ser como ele. Sua postura em momentos de julgamentos é incrível, me deixa admirada ver também a sua lealdade mesmo ainda tendo dúvidas de que sou realmente uma Deusa que sabe sobre Justiça.

Me pergunto se isso algum dia irá durar...

Meu espetáculo é tão bem planejado que nem mesmo eu sei se um dia terá fim. Anseio para que essa rotina repetitiva acabe, pois minha pobre mente já não aguenta mais essa descarga de responsabilidade que nunca pensei que iria aguentar por quinhentos anos seguidos. Quero apenas aproveitar o espetáculo normal da vida, não um que sou obrigada a seguir pelo bem de todos, estou farta.

É como todos os dias vestir a mesma peça de roupa.
Beber da mesma bebida.
Comer da mesma comida em que você já comeu tanto que não sente nem mesmo o gosto.
Caminhar pelas mesmas ruas fingindo ser alguém incrível.

É cansativo, não consigo me deitar na cama e dormir pois sei que quando acordar, terei que usar a mesma máscara todos os dias se quiser que todos sobrevivam. Ninguém poder saber da verdade, esse é o objetivo desse espetáculo?
Não aguento mais olhar para aquele espelho e imaginar a mulher aparecendo e dizendo que agora estava livre, que poderia contar a todos quem realmente sou e que poderei agir como uma garota normal.

Estou constantemente ansiosa pensando em que tudo afundará, como se tudo fosse feito de areia e uma grande onda batesse contra tudo e não deixando nada para contar história.

Quero poder acordar um dia e não ter que sempre ser aquilo que os outros querem. Será que a vida um dia vai me dar esse luxo?

Constantemente quero poder apenas correr pela praia e gritar bem alto como odeio tudo ao meu redor, mesmo sendo mentira. Gosto das pessoas de Fontaine, mas apenas quero ter uma casinha fora dessa nação e poder conhecer o mundo como alguém normal.

Me disseram que Sumeru tem florestas lindas, mas às vezes penso que o calor de lá irá me matar então logo desisto pensando mais em ir para a nação dos ventos, onde a liberdade é algo de todos.

Imagina poder acordar e ver que nada ao seu redor pode te afetar, que nada precisa depender de você.

Minha imaginação gosta de criar cenários onde estou acima do penhasco das estrelas com os braços abertos gritando de felicidade sentindo os ventos acariciar meu rosto limpando minhas lágrimas que finalmente conseguiram expulsar meu cansaço rotineiro.

Mulher do espelho... Você me deu um nome e um objetivo, mas queria nem mesmo ter nascido. Esse cansaço é sofrido. Quero apenas ter adormecido e não ter acordado mais.
Mesmo assim, você quer que eu continue.
Então continuarei nesse espetáculo me perguntando...

Meu espetáculo vai ter fim...?

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[Carta escrita por Furina antes dos acontecimentos da profecia em Fontaine].

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