Dia difícil para Ruppel Hanski no meio de todos aqueles moradores irritados. Sua maioria esmagadora destilava ofensas, ira e sentenças verbalmente violentas contra sua integridade. O homem amarrado no tronco da árvore central da praça não reagia. Por vezes, olhava seu filho entre os aldeões e desejava que ele tivesse outra opinião, mas parecia irredutível.
Infelizmente Keene também desejava puni-lo.
Lady Jollayne, ajoelhada a alguns metros, ainda chorava copiosamente. Tinha sangue em suas mãos, o sangue de Maris, sua garotinha e única filha. Lorde Lumis a consolou por alguns instantes. Em seguida, o corpulento líder do vilarejo se aproximou do acusado, preso ao tronco, trazendo uma tocha em suas mãos.
— Eu não matei a garota, eu juro. — Dizia o homem que, ao ver o filho, pronto para se juntar ao povo sedento de sangue, começava a perder a compostura. — Foi a fera! — Sua pupila reduziu ao dizer aquilo. — E ela voltará!
— Cale-se, seu moribundo! — Lorde Lumis deferiu-lhe um soco pesado em sua boca.
Ruppel Hanski cuspiu sangue e buscou a piedade do filho, que vez ou outra desviava o olhar, completamente envergonhado. Deu alguns passos à frente, ultrapassando a figura inconsolável de Lady Jollayne, aos prantos.
— Essa fera nunca existiu! — Cuspiu diante do pai. — Ele foi o único a vê-la, decerto criando o mito para esconder seus desejos torpes sobre a pobre e indefesa Maris!
Um coro de cidadãos enfurecidos soou logo atrás. Era um mar de gente em meio às luzes parcas da cidadela.
— Uma fera que ataca e dilacera apenas meninas? — Lady Jollayne berrou. — O verdadeiro monstro aqui é você! Monstro!
Agora o coro de moradores enraivecidos repetia a sentença dada pela companheira de Lorde Lumis.
— Aproxime-se Keene. — Proclamou o Lorde, e ao ver o jovem chegando mais próximo, pediu: — Faça as honras.
Entregou-lhe a tocha.
O garoto não tinha nenhuma misericórdia em seu olhar. O jovem Hanski era apenas um adolescente, mas já tinha em seu âmago o espírito impiedoso comum entre os moradores de Vila Chorosa.
Keene se aproximou, ignorando o olhar desesperado de Ruppel. A chama de sua tocha tocou a base da estrutura, logo se espalhando pelo feno que rodeava o homem.
— Hoje se faz justiça. — Disse Lorde Lumis, ao também contribuir com a crescente fogueira junto da população.
Ruppel gritava enquanto as chamas o consumiam. Ao fim, apenas a carcaça enegrecida em cinzas restaram do camponês. A multidão se recolheu.
Na manhã seguinte, todos acordaram com mais gritos histéricos de uma mãe. A população, assustada, se reuniu novamente, havia mais um corpo, outra criança, misteriosamente dilacerada.
Keene foi empurrado contra a parede de seu casebre.
— Você nos deu sua palavra! — Lorde Lumis afundava o braço contra a garganta do adolescente, que respirava com dificuldade.
— Eu o vi na noite do ataque... — Sentiu o pescoço contrair-se. — Ele estava suado e havia sangue em suas mãos.
— Temos uma nova vítima, Ruppel não era a fera! — O Lorde deu um último solavanco, batendo a cabeça do rapaz, que caiu tossindo muito.
— E-Eu... Tenho certeza...
— Não tem mais, seu merdinha! — Lumis cuspiu. — Seu pai falava a verdade. Que tipo de filho é você?
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Contos para se aterrorizar: porque o perigo espreita as sombras
Short StoryHalloween ou apenas Dia das bruxas é algo que nos remete não só a doces ou travessuras mais também a histórias que nos causam medo. O Projeto Flor de Lotus reune vários contos de diferentes autores sobre esse dia extraordinário. Confira esses contos...