XVI - Um Natal Inesquecível

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Não tem rena no nosso Natal,
Não tem neve em país tropical,
Mas tem amor de sobra.

Amor de Sobra - Família Lima



23 de dezembro de 2023:

-(...) Então, Dona Jussara, vamos recapitular: a senhora vai trazer o Peru e a farofa; a Aline vai trazer o Tender; eu vou fazer o salpicão de frango e o arroz branco; sim, pode deixar – Ele ouviu a mulher rir, enquanto se aproximava da cozinha – eu vou fazer um pouco de arroz com passas e outra versão sem passas. E Marino falou comigo que quer fazer uma receita de pernil assado, receita de família, pelo que entendi. –  Entrou no local e encontrou a mulher sentada à mesa, com o celular na orelha, anotando algo num caderninho – Eu encontrei com Menah  hoje e ela disse que vai fazer o fricassê de frango. Sobremesa? – Eu falei com Graça ontem e ela disse que pode trazer o pavê. A Flor também confirmou que vai trazer as rabanadas. Sobre as bebidas, eu pensei em suco para as crianças e algumas garrafas de espumante para os adultos. O que a senhora acha? – É . Então tá bom.  Então é isso, Dona Jussara, acho que já temos comida suficiente - Lucinda ergueu os olhos do papel e encontrou o marido sorrindo. Marino se aproximou dela e deu um beijinho rápido – Tá certo, então! Até mais! Tchau, tchau!:

- Vocês vão alimentar um batalhão? – Marino brincou:

- É quase isso, eu diria – Lucinda riu também. – Ele arrastou uma cadeira e sentou-se à mesa com ela. Amanhã de manhã nós precisamos ir ao mercado. Você precisa comprar os ingredientes para preparar o pernil. Cê não esqueceu, né?:

- Não senhora! Pode ficar tranquila que amanhã nós resolvemos tudo. Nossa, tô muito feliz com o fato de que vou ter folga no Natal e no Ano Novo e vou poder aproveitar os momentos com vocês. Nosso primeiro ano casados merece ser especial:

- Não vou mentir, também tô muito feliz pelo fato de que você vai tá em casa durante as festas. Você tem trabalhado muito, amor. Você precisa descansar – Ela sorriu, afagando a mão dele sobre a mesa:
- É,  cê tem razão:
- Mãe, tô pronto! – Cristian disse entrando na cozinha – Oi, Marino – Cumprimentou o padrasto:

- E aí, campeão? Beleza? Aonde cê vai?:
- Vou encontrar com meu pai, lá na casa da Gladys. – Marino olhou para a mulher, confuso:

- Gladys vai fazer um almoço de Natal amanhã, aí ela pediu pra eu levar o Cristian hoje, pra ele passar o dia com o pai. Amanhã, no fim da tarde, eu vou buscá-lo para ele passar a noite de Natal com a gente – A mulher explicou:

- Entendi! Se você quiser, eu levo o Cris, amor!:
- Mesmo? – Ele balançou a cabeça confirmando – Ah, se você puder fazer esse favor, eu agradeço, tô meio enrolada com umas coisas aqui em casa.

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- Obrigada por ter ido levar Cris, viu? – Ela agradeceu, enquanto eles preparavam o jantar:

- Imagina, amor:

- Cê sabe que eu só tolero o Andrade por causa do Cristian, né? Se fosse por mim, eu nunca mais olharia pra ele. Mas Cristian é um menino tão bom, ele não merece ter pais que vivem em conflito. E além do mais, ele é o pai, né?:

- É. Cê tá certa. Cê não pode privar o Cris da convivência com o pai; mas isso não quer dizer que você precise impor a presença dele aqui, por exemplo. Faça apenas o que te deixar confortável:

- Não, cê acredita que a Gladys teve a cara de pau de me dizer que Andrade tá diferente? Que a bebida o transformava? Ai, sinceramente. A verdade é  que mesmo sóbrio, ele era um péssimo marido. Eu é que fingia não ver, porque achava que tinha de manter a minha família. Eu não percebia que não existia mais “família” há muito tempo. Mas eu sou uma mulher de muita sorte, sabe por quê?:

- Por que? – Ele perguntou:
- Porque agora eu tenho você – Ela sorriu e esticando o corpo, alcançou os lábios do marido, que picava temperos do outro lado da bancada:

- Eu é que tenho sorte em ter você!

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24 de dezembro de 2023:

-Marino despertou devagar. Lucinda dormia serena deitada em seu peito. Ele sorriu. A vida era mesmo imprevisível. Desde a morte dos pais, há alguns anos, ele  havia parado de comemorar o Natal. A data festiva era apenas mais um dia no calendário e até o significado religioso havia se perdido. No ano anterior, por exemplo, ele saiu pra beber com os colegas de trabalho, voltou cedo para casa, pediu um delivery e adormeceu enquanto um filme qualquer passava na tela. 
Mas agora, era diferente. Ele tinha sua própria família e pela primeira vez em muitos anos estava animado para a celebração:
- Bom dia, meu amor – A voz sonolenta de Lucinda interrompeu os pensamentos dele – Feliz Natal! – Ela sorriu e tocou os lábios dele num selinho rápido:
- Feliz Natal, amor – Ele sorriu – E aí, tá animada pra festa?:
- Ah, eu sempre fico  reflexiva , sabe? Depois que os meus pais morreram, Anely e eu passamos muitos anos  melancólicas nessa época. Mas os nossos avós sempre fizeram de tudo para que nós ficássemos felizes. Eles faziam uma programação especial : café da manhã com nossas comidas preferidas, era o primeiro evento do dia. Depois, nós ajudávamos, do nosso jeito, à preparar a ceia. Quer dizer, eu ajudava. Anely só ficava lambendo as tigelas com as sobras dos doces que vovó preparava– Ela riu e Marino a acompanhou – À noite, antes do jantar, nós fazíamos uma oração, depois comíamos, e pra finalizar, vovô lia uma história pra nós; nós colocávamos nossas cartinhas embaixo da árvore e depois dormíamos. No dia 25, acordávamos cedo para abrir os presentes. E você tinha ou tem, alguma tradição natalina?:

-  Tinha.  Nós montavámos árvores diferentes todos os anos. E passávamos a data na casa dos meus avós. Era uma farra! Mas depois, já adulto, com a morte dos meus pais, festejar a data perdeu o sentido. Este ano, porém, eu tô animado:

- Que bom, então! – Ela sorriu – Inclusive, a gente precisa parar de enrolar na cama, porque precisamos ir ao supermercado comprar os ingredientes para os pratos da ceia – ela disse, tirando o lençol que cobria suas pernas e se levantando. O marido, porém, não fez qualquer movimento que indicasse que sairia da cama – Bora delegato, deixa de preguiça!- Brincou.

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À tarde , Graça apareceu na pousada, acompanhada de Jonatas e Danielzinho e se ofereceu para ajudar a decorar o espaço em que aconteceria a ceia:
-  Obrigada por vir ajudar, viu Graça – Lucinda disse – Organizar uma confraternização nunca é fácil:

- Imagina, Lucinda, não precisa agradecer!-   Você sabe, que decoração tem tudo a ver com moda, que é uma das minhas paixões, então, não vai ser sacrifício nenhum – Ela riu.

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À noite, tudo estava pronto para receber os convidados. Depois de checar mais uma vez de estava tudo bem, Lucinda, finalmente foi se arrumar para a festa. Para a ocasião ela escolheu um vestido longo vermelho ; prendeu os cabelos num rabo de cavalo alto, escolheu acessórios pequenos, como sempre, todos dourados.  No rosto, quase nenhuma maquiagem, exceto pela máscara de cílios e pelo batom. Sapatos de salto, completavam o visual:

- Caramba, como é que pode, logo eu, um simples delegado, ser o marido da mulher mais linda de Nova Primavera? – Marino a encarava sorrindo. O homem tinha acabado de sair do banho. Tinha uma toalha enrolada na cintura e outra ao redor do pescoço:

-E como é que pode, logo eu, ser casada com o homem mais gostoso e mais apaixonado de Nova Primavera? – Ela brincou:

- Ah, quer dizer que você me acha gostoso, é? – Ele se aproximou dela, que estava em frente ao grande espelho que havia no quarto. Abraçando – a por traz, rodeou a cintura dela e cheirou o pescoço da mulher. Lucinda se arrepiou – Devo dizer, que fico muito feliz com o elogio – Ele falou, passando o nariz, devagarinho, por toda a extensão do pescoço dela -  Mas, eu preciso admitir – Agora as mãos dele desciam pela lateral do corpo dela – que para mim – Ele já havia virado o corpo dela e ambos estavam de frente um para o outro – Só há – Disse enquanto a colocava sentada sobre a cômoda do quarto e se encaixava entre as pernas dela, ainda de toalha – Uma pessoa gostosa nesse cômodo  - A encarou com malícia – E essa pessoa é Você , Lucinda. Uma grande gostosa. A minha gostosa.- Decretou antes de beijá-la:

- Caramba, como vocês demoraram pra se arrumar!  - Anely falou ao ver a irmã e o cunhado chegarem ao espaço em que ocorreria a festa - Vocês por um acaso resolveram costurar as próprias roupas? – A mulher perguntou:

- Na verdade, a gente resolveu tirar... – Marino começou – Mas parou de falar quando notou o movimento discreto de cabeça que Lucinda fez, indicando que Cristian também estava ali – Tirar umas roupas pra doação! Foi isso! Foi por isso que a gente demorou – Lucinda o encarou segurando o riso.

Aos poucos, os convidados chegaram preenchendo o ambiente: Aline, Caio, João e Dona Jussara, foram os primeiros. Depois vieram, Jonatas, Graça e Danielzinho; seguidos por Seu Gentil, Mara e Menah. Nina apareceu alguns minutos depois. Flor, Ademir e Rosa, foram os últimos:
- Bom, agora que todos chegaram, nós já podemos começar o amigo secreto! – Anely anunciou – Se quem me tirou, tiver escolhido me dar uma meia de presente, eu faço a pessoa engolir, hein? – Disse de um jeito engraçado - Bom, eu vou começar , então: Meu amigo secreto, que não é mais secreto, é uma pessoa que pode colocar qualquer um de nós no xadrez! – Disse e obviamente, todos sacaram que ela havia tirado o cunhado – Comprei uma camisa com estampa xadrez, pra variar um pouco – Ela brincou, enquanto entregava o embrulho ao homem, que ria – É brincadeira, cunhado! Eu comprei uma camisa, sim! Mas não é xadrez. É uma camisa lisa, azul. Lucinda disse que você fica um gato de azul, e eu concordo! Com todo  respeito! – Riu:

- Bom,  - Marino tomou seu lugar para continuar a dinâmica – o meu amigo secreto, que não é mais secreto, é o melhor desenhista de Nova Primavera!:
- Sou eu! – Cristian disse com animação na voz e todos riram:

- Caramba! Como você adivinhou, rapaz? – Marino brincou:

- É que eu sou muito inteligente!-  O garoto riu. Cristian ficou radiante com o kit de material para desenho que ganhou do padrasto, ele ficou tão eufórico, que quase se esqueceu de dizer quem era o seu amigo secreto:

- Bom, o meu amigo secreto, é um carinha muito legal! Quer dizer, quando ele tá chorando, ele não é legal, não! – riu – O meu amigo secreto, é o Danielzinho!:

- Então , gente – Graça apareceu, com o filho no colo, fazendo uma vozinha infantil, a minha amiga “secleta” é uma pessoa muuuuito legal! Ela sempre fica comigo enquanto a mamãe vai passar com o tio Jonatas e sempre deixa eu enrolar meus dedinhos nos cabelos dela, na “ hola” de dormi – A minha amiga “secleta”, que não é mais secleta, é... A tia Lucinda! – Graça anuncia e Lucinda vem ao encontro deles, sorrindo.  Ela pega o bebê nos braços e a criança sorri – “ Espelo” que goste, tia! – Graça continua, imitando a fala de um bebê. Lucinda agradece o presente e minutos depois, retoma  a brincadeira:

- A minha amiga secreta, que não é mais secreta , é alguém que  tá sempre na moda.  A dona da boutique mais badalada, a mãe do enteado mais fofo! A minha amiga secreta, é a Graça! – Revela. A mulher deixa o filho no colo do  namorado, para receber o presente.
Para surpresa de todos, Graça revela que sua amiga secreta, é ninguém mais, ninguém menos que, Aline. Em seguida, a produtora rural continua a brincadeira e anuncia que Jonatas é seu amigo secreto. Jonatas, por sua vez, diz que seu amigo secreto é Caio. E assim, a brincadeira segue, até o fim, quando todos já estão com seus respectivos presentes. Anely respira aliviada ao constatar que , felizmente, não ganhou um par de meias.
Depois do amigo secreto; todos participam de uma animada disputa de karaokê. O momento rende boas risadas, mas também momentos emocionantes: Lucinda e Marino, abrem os trabalhos e cantam: “ Tem Que Sorrir “, da dupla Jorge & Mateus. Em seguida, Jonatas e Graça entoam a canção “ Final Feliz “ de Jorge Vercilo.  Mara e Menah, elegem a música “  Paula e Bebeto”, de Milton Nascimento; e todos aplaudem quando elas, totalmente desafinadas, mas imensamente felizes cantam: Qualquer maneira de amor vale a pena, qualquer maneira de amor valerá!
A cantoria segue por mais um período e termina com Anely e as crianças cantando Lua de Cristal, de Xuxa:

- Pessoal, a farda tá boa, mas chegou a hora de servirmos a ceia! – Lucinda anuncia e todos vão em direção à mesa:

- Antes de começarmos a comer – Marino diz, de pé, na ponta da mesa, Lucinda ocupada a cadeira posicionada ao seu lado esquerdo – Gostaria de dizer umas palavras. Prometo ser breve! Bem, há anos eu não celebro o Natal. Este ano, porém, tudo mudou. Eu tive a sorte de ser escolhido com o amor da vida da mulher mais incrível que já conheci – Encara a esposa com ternura – Que por um acaso, também é o amor da minha vida. Certa vez, li em algum lugar, que nós devemos nos casar com alguém que seja o nosso lar, antes de qualquer coisa. E é isso que Lucinda é pra mim: lar. E graças à ela, eu tô aqui, hoje. Rodeado de pessoas que me fazem lembrar o que realmente vale nessa vida. Muito obrigado, Lucinda – Ele sorri para a mulher,  que tem os olhos marejados  - E obrigado a todos vocês, amigos, que estão aqui hoje, tornando esse momento ainda mais especial. Um Feliz Natal! – Finaliza e todos aplaudem. Em seguida, Lucinda relembra o significado religioso da comemoração, fala da simbologia da festa para os cristãos e convida os presentes para uma oração em agradecimento. Depois, é a hora do jantar.

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- Nossa, hoje Cristian deu trabalho pra escovar os dentes e pôr o pijama, viu? – Lucinda diz entrando no quarto. – E tudo isso, por causa do presente que você deu! Ele disse que queria ficar desenhando até o Papai Noel, chegar, cê acredita? – Ela ri – Amor?:
- Oi! – Marino respondeu, com a voz embolada e Lucinda percebe que ele está escovando os dentes – Que foi?  - Disse ao sair do banheiro:
- Eu tenho um presente pra você:

Pra mim? Ué, mas a gente não combinou, de só trocar presentes amanhã? Eu até coloquei o seu embaixo da árvore!:
- Eu sei. Mas eu quis antecipar o seu. – Ela disse indo até a cômoda ao lado da cama. A mulher abre uma gaveta e retirando de lá uma caixa – Espero que goste – Estendeu o embrulho ao marido.
O delegado desfez o laço e levantou a tampa da embalagem. Dentro, sobre um papel de seda, havia um mini kimono, vestimenta que pode ser usada nos treinos de Krav Magá; também havia um objeto menor, semelhante a um termômetro e um exame laboratorial em que é possível ler: positivo.
O homem encarou  os objetos em silêncio, depois olhou para a mulher – Espera... É... – Ele disse  com a voz trêmula – Você... Tá...  – Lucinda não se contém, afirmando com a cabeça, enquanto lágrimas escorrem de seus olhos – Você tá grávida? Grávida, grávida? Grávida mesmo?- Ele perguntou de um jeito engraçado e ela riu:

- Sim, meu amor! – Respondeu – Eu tô grávida!- Antes que a mulher possa fazer qualquer coisa, o homem a pegou no colo a girando no ar:

-   A gente vai ter um bebê! Meu Deus! – Ele chora – Eu te amo, Lucinda – Beijou a mulher – Eu te amo! – A colocou no chão novamente, abaixando-se para ficar na altura da barriga dela – Oi , pacotinho de amor, aqui é o papai! – Ele riu entre as lágrimas-  Você ainda é só um grãozinho, mas eu já te amo muito, viu? – Beijou o ventre da mulher. – Obrigada , Lucinda – Ele disse, de pé outra vez. – Esse é o melhor presente que eu poderia ganhar e eu te amo ainda mais por isso.

Aquele sem dúvida, ficou marcado como um Natal Inesquecível.











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