020#O tempo passou

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Logo após o divórcio, o desejo de reviver aqueles velhos sentimentos, ser aquela velha pessoa que vivia intensamente e pouco se importava com tantas coisas, Ela saiu para um evento de fantasia, como tantos outros que já foi anos atrás. Deixou o filho com o pai durante o fim de semana e foi. Sozinha mesmo, já que agora não tinha ninguém. Havia dado as costas aos velhos amigos conforme "crescia".

Ao andar pelo evento, viu pessoas jovens e de certa forma se sentiu jovem igualmente. Tirou fotos, sorriu, encontrou velhos amigos, estava rindo, falando como eles tinham envelhecido... E ao ver seus filhos, fantasiados também, já do seu tamanho, o tamanho que ela lembrava ter quando veio a um evento deste pela última vez, teve total consciência que ela também.

O tempo era sempre implacável, embora não fosse culpa de ninguém, todos criamos o hábito de nos sentir terrivelmente mal e, até um tanto humilhados, quando o tempo mostra que passou para nós também.

Ela engoliu em seco, conversou mais um pouco e estava se afastando, se sentindo deslocada, quando viu uma coisa que a tanto tempo não via. Uma Sakura florescendo... Parou e observou-a, o tanto que ela tinha crescido, quantos galhos tinha a mais desde a última vez que a viu. E estava mais bonita, estava tão bela.

Até que um braço a envolveu pela cintura de repente, a pegando de surpresa. Ela sentiu seu corpo todo saltar conforme se inclinava para trás para ver quem era a pessoa que estava tão ousadamente a abraçando, encaixando o corpo no seu.

Ela viu um homem, vestido como um anjo caído, um personagem de um jogo que ela foi muito fã quando mais nova. Seu coração por um momento palpitou, a fantasia estava perfeita, era como se estivesse diante do seu amado personagem.

— Faz tempo que não a vejo... — disse ele com a voz rouca.

— Quem é você? — perguntou ela, ainda meio confusa e agitada pelas emoções que ele causou com aquela aparência.

— Você se esqueceu de mim, parece que não fui tão memorável assim na sua vida, Melany.

— Não é que não seja memorável, você está fantasiado e de maqui... Me chamou de Melany?

— Sim, Melany.

— Quem é você? Quase ninguém me chamava assim que me conhecia a 15 anos atrás.

— É simples, não te conheci aqui. Te conheci na vida... Lembrou de mim?

— Não....

— Isso fere o meu coração...

— Não posso fazer muita coisa, seria uma mentira dizer que me lembro e a revelação da verdade teria doido mais ainda.

— Sempre assertiva.... Sou eu, Brian.

— Brian?! Você fez plástica?

— Nossa eu era tão feio assim? — perguntou num tom falsamente magoado.

— O tempo te fez bem, não era feio mas ainda sim, o tempo te fez uma nova pessoa.

— A nova pessoa tem uma chance com você?

— Não sei dizer. Não sou mais a pessoa que você conheceu.

— Aparentemente eu também não.

— Não brinque comigo usando a aparência do meu personagem favorito...

— Realizar fantasias tem alguma valia.

— ...

— Te deixei tentada, não é?

— Tá bem, mas só hoje. Só por um dia.

— Só por um dia?

— Acha pouco? Então talvez deva me esquecer e seguir a sua vida.

— Você é cruel...

Ela se afastou após ser propositalmente fria com ele. Ele sempre foi um cara legal. Lembrava de seus sorrisos quando mais novo, como sempre corria em sua direção, a pegava nos braços e a girava como se ela fosse a melhor coisa que já existiu. Ele não precisava dela, hoje ela tinha muita carga, seja emocional ou não.

Ele ficou parado no mesmo lugar e quando ela teve a certeza que ele não a seguiria, se virou para ele sorrindo.

— Boa escolha, Brian. Foi a escolha mais certa. Nunca, por ninguém, não importando quanto goste dessa pessoa. Aceite uma situação de uso e descarte, você sempre foi incrível, doce e gentil. Duvido que isso teria sumido com o passar dos anos.

Ela se virou e voltou a andar, ela se sentiu feliz por reencontrá-lo. Ele estava mais bonito, mas talvez fosse pela maquiagem e fantasia impecável. Ela seguiu andando, indo até a saída do evento. Afinal, apesar de tudo, aquilo, o passado já tinha acontecido, ela tinha a certeza que não poderia reviver, pois ela já não era mais a mesma pessoa.

Mas, contra tudo que ela estava pensando enquanto andava, uma mão voltou a alcançá-la, segurando a sua mão e refreando a sua caminhada. Ela olhou para trás surpresa, imaginando quem seria agora. No entanto, ainda era ele. Era o mesmo homem, com uma fantasia agora toda torta, como se ele tivesse corrido em sua procura.

— Por que?! — disse entre os seus ofegos.

— Porque?

— Porque foge de mim?

— Ah! Isso? Você é um homem bom. E na minha vida atual, diferente da pessoa que já fui. Você não seria a minha prioridade e eu não acho justo com você. Primeiro, antes de tudo, meu filho, então minha carreira, meus auto cuidados e então, viria você. Você merece alguém que não tenha carga emocional pesados como eu e familiar, não precisa de mim.

— E se eu quiser tudo isso?

— Você diz da boca para fora...

— Não foi eu que quebrei seu coração, me deixe...

— Não... Claro que não foi você, talvez, se eu tivesse escolhido você aquela época. Seríamos nós dois fantasiados e nosso filho. Mas eu escolhi outro caminho, um caminho que me moldou e me causou grandes cicatrizes que você não merece. Desculpa, Brian. O nosso tempo passou.

Ela amou ele a sua maneira, e ainda amava. Mas a pessoa que se tornou, o fardo que carregava. O problema não era a idade, tampouco ser divorciada, ou o filho, se ela fosse sincera. Era que a vida bateu nela de tal forma, que sabia que acabaria ferindo alguém que não merecia. Suas escolhas foram os seus pecados. Agora, apesar de tê-lo encontrado após tantos anos, faria um último gesto de amor.

O deixaria ir embora, um pouco triste e de coração partido. Mas ainda seria melhor assim.

•••

Obrigada por ler.

Nota: Eu estou com muito sono, mas essa pequena história de amor me veio à mente e quis escrever. Não sei se expressei bem o que queria, mas por hoje, é isso pessoal. ❤️

Pecados - Escritos à sangue.Onde histórias criam vida. Descubra agora