Foi uma longa viagem de avião, algo completamente diferente do esperado para uma caipira como eu. Não houveram turbulências, discussões por causa de assento, comida ruim, e nem mesmo um super-herói do lado de fora da janela. Morrer em uma queda de avião seria bastante anticlimático, mas estava com expectativas em assustar os passageiros e me divertir com o caos.
Depois do avião, tiveram os ônibus, este sim foi como imaginei... Um verdadeiro inferno. Filas e filas, atrasos e mais atrasos, um lugar apertado e cheio de gente se esbarrando. Tal jornada enfadonha terminou com o anoitecer, agora me dirigindo a uma região afastada da cidade local. Espero que as economias da vovó tenham sido enfim úteis para alguma coisa, ela com certeza vai demorar a notar a falta do dinheiro, só juntava para emergências que nunca chegavam. Não aproveitar a vida hein, acho que me identifico com ela até certo ponto, ela também precisa de um propósito.
Incomodada com o cheiro forte e a música barulhenta, frente a um grande edifício no meio do nada. Os olhos estreitos do enorme segurança me perfuram, de terno e óculos pretos, de pele negra como ébano, de feição amedrontadora para os desavisados.
"Eu vim para a festa" Anunciei, tentando passar a imagem de energética e despreocupada, com um enorme sorriso estampado no rosto.
"Aqui não é lugar pra criança, dá o fora" O segurança franziu o cenho, rispidamente me expulsando e cuspindo no chão.
"Peço perdão pelo equívoco, não vim para festejar, recebi um convite da Senhorita Melissa para me tornar uma das dançarinas. Se não for um incomodo, eu teria permissão para trocar umas palavras com ela? Ela poderia esclarecer tudo" Eu elucido, com paciência. Acreditar na própria mentira é a chave para torná-la realidade aos olhos do espectador.
O segurança me olhou mais uma vez, procurando em cada borda do meu vestido algo que estivesse errado, que não condissesse com as minhas declarações. Ele parecia irritado, talvez surpreso com a menção do nome daquela mulher.
"Hmm, você tem perfil de 'dançarina'... Entre. Procure pela Isabelle, ela vai te ensinar sobre como se portar com os clientes. Não seja estúpida, um erro e vai se arrepender de ter cruzado meu caminho" Advertiu o segurança, enquanto abria os portões do jardim, os quais levavam a festa no interior do edifício.
"Estarei atenta, muito obrigada senhor" Sorri para o segurança, com uma pequena reverência, e caminhei pela estrada de blocos rumo às portas do festejo.
"É bem desse tipo que eles gostam de foder..." Murmurou o homem, acreditando que eu já não pudesse ouvir.
Sem pressa e com delicadeza, abri as portas do salão e pus minhas sapatilhas a marchar sobre o carpete vermelho de poliéster. A rota de fuga se fechou atrás de mim, feito mágica, e meus olhos viajaram pelo estranho e escuro ambiente. Haviam algumas mesas de jogos, com roleta, sinuca e pôquer, todos pareciam animados e fervorosos com os resultados. Ao lado de algumas pilastras, garotas dançavam na barra de pole dance, de forma lenta e sensual. Suas roupas eram extravagantes e feitas para exibir o corpo, as pessoas ficavam na base da estrutura, babando e jogando dinheiro.
"Pedófilos de merda..." Murmurei, cerrando os punhos e dirigindo meus olhos para o altar acima do salão.
Subi as escadas, degraus pequenos e fáceis de escorregar com uma taça, no topo, me sentei em um dos bancos frente ao bar. Uma variedade surpreendente de vinhos, uísques e coquetéis estavam expostos ali, apesar da clientela se contentar com a básica cerveja. Para minha surpresa, a bartender era uma mulher, apesar de 'mulher' ser um eufemismo para uma garota da minha idade.
A jovem agitava as garrafas com primor, e depois misturava tudo em uma taça de modo dramático, como se fosse um espetáculo à parte. Eu poderia observar aquilo por dias, entretanto, após servir um velho na ponta esquerda do balcão, ela logo direcionou sua atenção a mim.
"Boa noite senhorita, me chamo Isabelle e serei sua Barmaid esta noite. Como posso ajudá-la?"
Me debruço no balcão, segurando e balançando uma das taças abandonada, com apenas uma azeitona girando nas bordas. Olhos claros e cabelos loiros, pele pálida e corpo esguio, uma boa garota, habilidosa demais para ser o aperitivo. Não me parecia inveja, mas uma direção curiosa para contemplar. Se minha mãe fosse como ela, teria sido o banquete principal? Perguntas tolas me distraíam.
Aos olhos do predador, no fim, é tudo comida. Aos olhos da terra, é tudo merda para adubar. Todos naquele lugar, por algum motivo, me davam nojo.
"Sim, me leve até a 'rainha da festa'... Tenho negócios a tratar com a Senhorita Melissa" Eu sorrio, observando sua expressão congelar entre a beleza e o desespero "Seja uma boa menina, sim?"
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𝙸𝙽𝙳𝙸𝙶𝙾 𝙷𝙴𝙰𝚁𝚃
HorrorÉ difícil compreender a monotonia no coração daqueles que não sabem o que significa viver. Pouco a pouco eu começo a entender, o êxtase do momento pelo qual nasci... [Esta não é uma história indicada para todas as idades] [Leia e assista com atenção...