Ato VIII

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  Quatro batidas, nem mais nem menos, reverberam da antiquada porta no subúrbio da cidade vizinha

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  Quatro batidas, nem mais nem menos, reverberam da antiquada porta no subúrbio da cidade vizinha. Devo admitir que aprecio a construção de casas e ruelas como esta, dão um ar de mistério a cada esquina, apesar dos habitantes comumente temerem por suas vidas. Permaneço a esperar na soleira, balançando minha capa de chuva e ajeitando o capuz. Não me lembro da última vez que senti a necessidade de pular em poças d'água, mas a demora de meu alvo em responder estava me entediando.

"Olááá! Tem alguém aí? Estou aqui para uma pesquisa de bairro, não vai demorar muito!" Eu grito ao pé da maçaneta, com uma voz doce e gentil.

  Mimetizar sentimentos não havia deixado de lado a sua complexidade, ainda existiam cores que jamais poderia experienciar, ou mesmo compreender.

"Não quero saber dessa merda, vá embora!" Exclamou uma voz masculina do interior da casa, a engrossando, tentando parecer intimidador, e falhando.

  O cheiro de nicotina, dizem que o olfato sempre se associa à memória, de alguma forma se confirmava verídico. A imagem daquela coisa me arrancando um dos grampos de cabelo, os gritos horrorizados, e a porta se abrindo com um ranger terrível. Talvez seja uma lembrança, uma boa memória, mas sou boa em imitar o que já vi. Se a burrice é repetir o mesmo erro, gostaria de ser louvada como sábia.

  Sem que chamasse a atenção de minha presa, o grampo deslizou suavemente pelas entranhas do cadeado, nada me surpreendendo com o estalar de minha façanha. A porta decrépita rangeu como naquela noite infernal, mas desta vez o meu sorriso era vibrante e genuíno

  No interior do ambiente, apesar de escuro, era possível avistar a figura de um homem de frente para um enorme setup, com brilhantes monitores. Praticamente não havia móveis na casa de cômodo único, nada além de uma geladeira, um colchão e o local onde estava.

  O homem, de barba espessa e olheiras visíveis, inclinou-se na cadeira para ver o que havia acontecido, assustado com a luz do sol além das nuvens queimando sua retina.

"Que merda você... Uma garotinha? Escuta aqui, sai da minha casa!!" Esbravejou o homem, limpando seus dedos de comida na roupa e tentando erguer seu corpo gordo da cadeira, enquanto sorrateiramente fechava certas abas do navegador.

"Eu realmente não estou com tempo para brincar com você agora, então vamos direto ao ponto" Apesar de minha fala, parte de mim hesitava em provocar aquele homem, havia de ser um experimento intrigante.

  Ignorando minhas palavras, o homem saltou em minha direção. Ele era diferente dos demais que enfrentei, era desajeitado e sem qualquer noção de caça, quase como abater um coelhinho indefeso. Não, um coelho encontraria uma forma de escapar...Atacar de forma burra é a pior escolha para os encurralados, principalmente aqueles que não perceberam a jaula ao seu redor.

  De modo sutil, me esquivo da investida lenta da presa, e lhe acerto com um murro na nuca. O homem é facilmente lançado ao chão, gemendo de dor e gritando como um animal alvejado. Tão lindo, tão satisfatório. Eu desvio o olhar por um segundo, não era o momento para perder a compostura, ainda que o júbilo fosse tamanho.

"Q-Quem é você... Eu não fiz nada, me deixe em paz...!" Suplica a presa, tão patética quanto o esperado.

  Graciosamente me ajoelho em frente ao homem, acariciando sua barba com uma mão e colocando o cano da pistola em seu crânio com a outra. Ele começa a suar frio, engolindo a saliva e palpitando com o medo se instaurando em seu ser.

"Você pecou meu caro, e não seja petulante. No entanto, meu objetivo não é você, e sim a pessoa que 'vocês' chamam de Mel" Eu articulo, ainda o acariciando como um cachorrinho de rua, prestes a ser abatido pela fome e o frio.

"O-O-Olha eu não sei como você sabe da gente, mas eu juro que não sei quem é a Mel, a gente só recebe ordens e o dinheiro das exportações!" Balbucia a presa, se reprimindo para não mexer um músculo e o meu dedo escorregar no gatilho "Eu s-só entrei nesse negócio pelo dinheiro, por favor não me mate!"

  Meu sorriso se torna aparente, estava difícil suportar tamanha demencia.

"Eu sei quem é você... Ghost"

  Aterrorizado, perdendo o controle de si, dominado pelo pavor e a agonia, o homem tenta me estrangular com seu último suspiro. O som cacofônico do tiro e seu crânio rompendo enterram a melodia junto ao silêncio.

"Que desperdício..." Eu suspiro, fitando seus olhos vidrados e o sangue que escorria pela sua própria sujeira "Bem, a polícia já estava para encontrá-lo... Cassiel pode estar fora do caso, mas os documentos dele levariam seu sucessor até aqui, mais cedo ou mais tarde"

  As luzes sobre mim, lindos raios brilhantes iluminando meus pensamentos, uma revelação divina. Talvez o deus que minha mãe ensinou ainda estivesse do meu lado, afinal, eu já lhe confessei todos os meus pecados... E o maior deles, era não viver. Oh sim, eu me sinto tão viva que poderia destruir tudo no meu caminho por isso, a minha cruzada estava apenas começando...

  Meus olhos caíram na tentação da luz, onde os computadores, em uma aba minimizada, era possível ler o seu nome nitidamente em uma chamada de bate-papo.

"Melissa Triadonna... Mel..."


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𝙸𝙽𝙳𝙸𝙶𝙾 𝙷𝙴𝙰𝚁𝚃Onde histórias criam vida. Descubra agora