Recomeço - Parte I

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Naquela noite, Jenni demorou um pouco mais no jantar, sua mente estava repetindo pela trigésima vez tudo que iria dizer, mas tinha medo de entrar naquele quarto e não conseguir dizer absolutamente nada.

Agora parada na porta de Alexia ela respirou fundo algumas vezes, sacudiu os braços, encostou sua testa na porta, os olhos fechados e a mente a questionando se realmente ela faria aquilo, se alguém passasse no corredor, certamente não entenderia nada.

Uma última respiração profunda e ela ergueu o corpo, 3 batidas na porta que imediatamente se abriu, a expressão no rosto de Alexia dizia que ela estava repetindo o mesmo ritual dentro do quarto.

A loira deu um passo para trás e Jenni entrou, muito menos confiante do que dias atrás, quando elas compartilharam uma tarde ali dentro.

As duas ficaram estranhamente em silêncio por um momento, até Alexia fazer um gesto para que Jenni se sentasse na cama.

A atacante caminhou mancando um pouco, sem fazer nenhuma questão de esconder o resultado da pancada que tomou no jogo. Ela não mancou na frente de ninguém, mas aqui com Alexia ela sabia que podia se permitir sentir aquele incômodo.

- Obrigada por me deixar vir. Fiquei malditos 15 minutos decidindo se bateria na porta ou não.

Alexia assentiu, um pequeno sorriso querendo flutuar em seus lábios, mas a tensão no quarto era palpável demais, o medo de uma palavra dita fora do lugar ou ser mal interpretada pairando no ar.

Alexia foi até o frigobar, pegou uma bolsa de gelo e enrolou numa toalha própria.

Jenni não pôde deixar de notar: Alexia se preocupou em ir na fisioterapia buscar aquelas coisas, ninguém além de Blanca tinha aquele material no quarto.

Pequeno detalhe, mas que a muito tempo não estava presente entre elas.

Alexia sentou em uma cadeira e com 2 tapinhas no colo pediu que Jenni colocasse seu pé ferido ali, a loira retirou a meia e colocou a toalha, depois a bolsa de gelo por cima, o tornozelo estava um pouco inchado.

A morena tinha que admitir, Alexia ganhava seu coração nessa pequena demonstração de cuidado.

- Você devia ter pedido a substituição no intervalo, Jen. - Alexia disse genuinamente preocupada.

- Dar ao Jorge o gostinho de me punir todos os dias desde que cheguei aqui e ainda me substituir? Eu jogaria de pernas quebradas, mas não pediria para sair.

- Blanca disse que você teve sorte por não estar com o pé fixo no chão. – A loira continuou.

Jenni percebeu que Alexia estava desesperadamente tentando falar de seu pé para fugir do assunto real, ou para aproveitar ao máximo essa trégua de bandeira branca entre elas (ela preferia acreditar na segunda opção), mas a morena não podia deixar aquele surto de coragem passar.

- Nós não estamos aqui para falar sobre meu pé, Ale.

- Eu sei. – Alexia continuou segurando o gelo enquanto mordia o canto da boca sem perceber.

Jenni reconheceu isso como um sinal claro que ela estava nervosa naquele momento e sabia que teria que acalmá-la. Ela tirou o pé do colo de Alexia e puxou a cadeira para que a loira ficasse mais perto e ela pudesse segurar suas mãos.

- Eu só quero dizer algumas coisas. E então, se você quiser, podemos conversar ou eu posso ir embora. A escolha é sua, ok?

Alexia assentiu, sem saber se poderia confiar na própria voz.

- Eu te disse isso há quatro dias, mas acho que é um ponto importante para começar. - Ela olhou para Alexia e esperou pacientemente até que a loira encarasse seus olhos. - Eu te amo. Madre mia, eu te amo além da medida. Eu te amo no seu melhor dia. Eu te amo no seu pior dia. Eu te amo muito mais do que eu consigo te falar ou te mostrar. Mas, eu sempre, sempre e sempre te amo Alexia.

Alexia permanecia olhando para Jenni, mas seus olhos se encheram de lágrimas.

- Apesar de todo esse amor que sinto, existem coisas com as quais eu não posso mais conviver. Eu nunca pediria que você fosse alguém diferente de quem você é.

Jenni limpou cada uma das lágrimas que Alexia tentou, mas não conseguiu conter.

- Eu amo as suas imperfeições e até elas fazem você ser perfeita para mim. Mas não posso estar com alguém que tem vergonha de estar comigo.

- Jenni, o que você está dizendo? Eu... – Alexia engasgou.

Jenni levantou a mão para impedir Alexia de falar.

- Não, por favor deixe-me terminar, Ale. Você precisa saber o que eu sinto.

Alexia permaneceu em silêncio.

Jenni olhou para as suas mãos unidas, ela pegou o dedo indicador de Alexia e passou pela tatuagem 1994 em seu pulso.

- Essa foi a primeira tatuagem que fiz para você. Nós éramos tão jovens e você chegou como uma brisa leve na minha vida, eu carregava na pele o amor por toda a minha família, então era justo carregar você também.

Alexia sentia que ia chorar de novo.

- Depois fiz essa – Ela levou o dedo de Alexia até o XXI – 10 e 11, lado a lado, como um código que era só nosso. Depois as suas iniciais no meu pé esquerdo, porque todos os meus gols são pra você. Aí fizemos o cacto juntas..

E Jenni foi relembrando com admiração cada uma das muitas tatuagens que havia feito para Alexia em diferentes partes do seu corpo, até que chegou na última:

- Você sabe que nunca foi pela cidade, para mim você é o que existe de mais precioso lá, não tem nada no mundo que se compare ao seu valor pra mim, Alexia. Você é a minha Flor de Barcelona. O meu corpo grita que te ama, Ale.

Alexia chorou e Jenni a abraçou por um momento.

- Mas sempre respeitei o fato de que você precisa de privacidade em sua vida. E eu nunca pedi para você mudar isso.

- Aonde você quer chegar, Jenni? – A voz de Alexia não passava de um sussurro quase inaudível quando elas voltaram a ficar frente a frente.


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