Capítulo 2

67 13 14
                                    

Uma mudança tão grande quanto aquela tinha as suas vantagens, e uma delas era que se instalar na nova casa foi um processo muito mais rápido, principalmente porque as malas estavam em sua grande maioria cheias de roupas. Melinda precisou de apenas um dia para colocar tudo no lugar, enquanto seu marido resolvia a burocracia da escola das crianças. Não era um sacrifício, ela se comprometeu com todas as malas quando percebeu que teria que sair por aquela porta novamente, e a viajem até ali já era bagagem o suficiente pra digerir o resto do dia.

-Mais pra esquerda! -comandou.

-Você disse que era direita!

-Esquerda! -resmungou.

Atticus estava ajudando a instalar os móveis, mas a verdade é que os dois tinham uma relação tão ruim que a comunicação precária atrapalhava as tarefas mais simples como centralizar uma pequena prateleira.

-Aqui?!-gritou, irritado.

-É! -devolveu, no mesmo tom.

-Oh mãe! - Emma desviou a atenção pra si. -Tem gente jogando basebol na esquina! Posso ir?!

-Se o seu irmão for.

-Ele não quer sair daquele vídeo game!-protestou.

-Então você não vai.

-Mas...

-Chicago não é Honolulu, Emma. É uma cidade grande e perigosa.

-Eu levo ela! -propôs Atticus.

-Nós dois ainda não terminamos aqui.

-Eu estou cansado! -dramatizou. -E sobrou pouca coisa pra fazer!

-Ok. -concordou, para alegria dos dois.-Qual é a regra?

-Ficar de olho no tio Atticus. -respondeu Emma.

-Não perca o seu tio, e ele não perderá você. -concordou, tirando uma garrafa de água da geladeira.

-Isso chega a ser ofensivo. -Atticus cruzou os braços. -Vamos garota, antes que eu desista de sair!

Com a garrafa gelada nas mãos, Mel relaxou os ombros e subiu uma caixa pequena até o andar de cima. Essa casa era maior do que a anterior, e até onde seu esposo comentou, também tinha porão e sótão. Esses dois últimos cômodos eram indispensáveis, porque ambos tinham paranóias quanto a segurança das crianças, e isso praticamente definiu a escolha daquele lugar quando perceberam que muita coisa estava faltando na planta.

-Kai? Já arrumou o seu quarto? -cobrou, apoiando o tronco no batente da porta.

-Só falta aquelas caixas ali!

-Então para de jogar essa coisa e vai arrumar.

-Eu to no meio da partida!

-Não deveria nem ter começado.

-Perai mãe!

-Vou contar até três...

-Oh mãe!

-Um...

-Qual é! É rapidinho!

-Dois... não me faça chegar no três...

-Que droga! -resmungou, finalizando a partida. -Pronto! Viu?

-Termina de arrumar o quarto, quando o seu pai chegar quero tudo isso bonitinho.

-Timini di arrumi o quarti...-sussurrou irritado, assim que a mãe deixou o quarto.

Melinda estava pronta para voltar e tirar definitivamente aquele vídeo game, mas o celular vibrou alto no bolso traseiro da calça e interrompeu aquele castigo. Era uma mensagem do seu marido sugerindo que os dois se encontrassem numa espécie de bistrô a algumas quadras, tudo indicava que os novos colegas de trabalho queriam conhecer os dois e isso era péssimo. Ben já teve uma "equipe família" antes e as coisas não terminaram bem. O problema é que esse nível de confiança familiar só era atingido quando ambas as partes sabiam o suficiente sobre a vida do outro, e perguntas era tudo o que Melinda mais odiava.
Demorou alguns segundos para pensar numa desculpa plausível, e mesmo assim o marido parecia decidido em deixar o assunto da mudança para outro dia. Soltou um gemido frustado, e respondeu informado que demoraria alguns minutos entre se arrumar e chegar no local. Não havia como evitar um encontro que uma hora ou outra iria acontecer, e desde que aceitou aquela loucura já sabia os desafios que poderiam surgir.
Por estar distraída demais, se arrumou mais rápido do que tinha planejado e partiu em direção ao tal bistrô, mas não antes de pedir a sogra que tomasse conta dos netos. O local definitivamente não parecia com o nome, e por causa do horário estava tão vazio que não teve dificuldades de identificar o esposo em uma das mesas. A surpresa foi ver que o cunhado já estava ali de banho tomado, quando ela nem sequer viu o momento que Emma retornou.

Crime Inestimável Onde histórias criam vida. Descubra agora