Prólogo

30 6 2
                                    

Tomo mais um gole de chá antes de voltar a digitar no computador. O dia da audiência estava chegando, e eu precisava estar com a papelada pronta e esquematizada, para que tudo desse certo. Li, escrevi, pensei, tomei mais chá. Meus olhos estavam ficando irritados, querendo fechar a cada momento em que eu parava de fazer minha obrigação, para pensar em nada.

É sábado quase meia noite, a chuva fraca batia contra o vidro do escritório, e eu estou sozinha; minha amiga Sandra, que mora na mesma casa comigo, foi para a casa dos seus pais.

Pego a xícara, para beber, mas o chá não chega na minha boca. Afasto e vejo que havia acabado. Solto um suspiro cansada. Me espreguiço e reclamo quando as minhas costas estalam.

Acho que vou ter que tomar mais remédio para a dor.

Coloco as mãos na borda da mesa e empurro a cadeira de rodas contra o chão de madeira. Ando até a janela observando a rua deserta, o vento está forte, o vidro faz barulho, a árvore em frente de casa balança. Nunca gostei do frio, e sim do calor.

Dou as costas e saio do meu escritório deixando a porta aberta para que a luz branca ilumine um pouco o corredor.

Passo em frente ao meu quarto e depois pelo o de Sandra antes de chegar no início das escadas. Olho para baixo encontrando a imensa escuridão. Imagino que a Elise de antes sentiria muito medo ao se deparar com o breu e sairia acendendo todas as luzes que tivesse.

Mas agora, os meus pesadelos são outros.

As luzes do andar debaixo se encontravam todas desligadas, não havia o porquê deixar a casa iluminada, sendo que eu passava mais de quatro horas dentro do meu escritório. Meu dinheiro era precioso.

Piso no primeiro degrau de madeira e ela range a cada passo que eu dou. Coloco a mão no corrimão como um guia para que eu não caísse. O som da escada, das janelas, da chuva e dos trovões ecoam pela casa.

Eu claramente estou vivendo uma cena de filme de terror. Só faltou aparecer o ghost.

No final das escadas passo rapidamente os olhos pela sala encarando várias sombras dos objetos e segui para a cozinha com o objetivo de fazer mais chá e pegar alguns biscoitos. Porém meus pés travam no lugar, meus músculos ficam tensos, meus olhos se arregalam, antes de eu começar a voltar devagar para a sala.

Escondo meu corpo atrás da parede e coloco minha cabeça para o lado visualizando o cômodo. Minha atenção vai para a cortina branca que está fechada, deixando a sombra distorcida iluminada pela luz do poste. Não consigo identificar se era homem ou mulher do lado de fora.

Penso em Sandra, ela sempre esquecia a chave em algum lugar, me perdi das vezes que tivemos que fazer outra. Escorrego a mão na parede até encontrar o interruptor e ligar a luz. Assim que acendo, desaparece.

Coço a cabeça confusa, talvez seja a sombra de uma árvore que tem do lado de fora. Volto para a cozinha, acendo a luz e começo a abrir os armários pegando o necessário. Abro o armário, pego uma xícara, logo em seguida a erva e o leite; encho a panela com água e coloco no fogão. Encosto as costas no balcão enquanto a água esquenta.

Penso no quanto a minha vida melhorou de um tempo para cá. Na minha adolescência se alguém falasse que eu iria ter um futuro brilhante eu diria que estava mentindo.

No entanto, agora estou trabalhando no que eu quero e construindo uma estabilidade financeira que sempre desejei.

Ouço a campainha tocar. Encaro o relógio na parede 00:25. Suspiro suspeitando de quem seria.

ㅡ Vou amarrar uma chave em você ㅡ falo alto o suficiente para que ela me ouvisse do lado de fora.

Sorrio. Sandra sempre teve um neurônio a menos, esquecer as coisas era sua especialidade.

ʟᴏᴜᴄᴏ ᴘᴏʀ ᴠᴏᴄê - 𝐋𝐢𝐯𝐫𝐨 𝟏Onde histórias criam vida. Descubra agora