- Não vai dar! - Digo pela milésima vez para minha irmã Maite.
- Dulce por favor, eu preciso da sua ajuda, é só uma hora, o que tem de mais você passar um tempo com ela? - Diz andando atrás de mim.
- Minha querida Irmã - Digo parando no meio do corredor da minha casa - Não vai rolar, eu preciso trabalhar, sem contar que sua filha, vulgo minha sobrinha é uma peste - Falo com entonação - Sem ofensas.
- Eu sei que a Lupita é teimosa as vezes, mas ela gosta de você e eu já te disse, é apenas uma hora, preciso resolver aquele assunto no fórum e não tenho com quem deixar ela - diz implorando.
- E a mamãe ? - Pergunto cruzando os braços.
- Viajem para Milão.
- Papai ?
- Está junto com ela.
- Annie? - Nossa melhor amiga em comum.
- Está em um desfile em Cancún, pelo amor de Deus Dulce - Ela quase grita - Acha mesmo que eu estaria me sujeitando a isso se não fosse importante?
- E o pai dela? - Eu sei,eu sei, fui audaciosa em perguntar.
- Eu juro que vou estrangular seu lindo pescoço se me fizer lembrar daquele maldito novamente! - sua voz alterada me fragilizou.
- Tudo bem, você venceu, eu cuido da pestinha, mas somente por uma hora, nada de atrasos, tenho reunião hoje a tarde.
- É só agora de manhã - diz me abraçando - Bom ela já está lá na sala, tenho que ir agora, beijos - diz beijando meu rosto antes de sair apressada pelas escadas.
Quando chego na sala de estar, vejo Lupita sentada no sofá mechendo em alguma coisa.
- Bom dia pestinha da tia, o que tá aprontando? - paro do seu lado - E que roupa é essa ?
- Bom dia titia - Seu sorriso de criança arteira estava estampado naquele rosto - Hoje é dia das garotas venderem barras de cereal pra arrecadar dinheiro pro próximo acampamento que teremos! - Diz empolgada. Embora tivéssemos dinheiro de sobra pra bancar esses acampamentos, Maite e mamãe diziam que estaríamos tirando essa experiência de Maite e das garotas, de poderem conquistar as coisas pela força de seus braços. Fala sério!
- Sério, que legal - Digo ligando a tela do meu celular pra responder algumas mensagens - Ainda bem que sua mãe vai chegar a tempo pra te levar não é mesmo?
- Não vão não titia- diz com aquela voz de criança banguela. Lupita tinha apenas seis anos de idade, e embora fosse inteligente, não foi o suficiente para evitar o seu tombo no parquinho, que ocasionou na perca de um dos dentes da frente.
- Como assim Lupita? - pergunto, com o olhar fixo nela.
- Porque as meninas vai vender agora de manhã. Mamãe vai me buscar depois.
- E que horas começa isso Lupita? - Eu queria estrangular Maite.
- Nove da manhã titia - diz sorrindo.
Olho as horas no celular e marcavam oito e meia.
- Puta que o par.... - grito, mas paro.
Nem isso eu podia fazer pois, a pestinha viraria uma fita cacete e reproduziria mais tarde. Igual na vez que ocorreu no natal, quando sem querer, querendo, xinguei.
Estávamos na Venezuela, e eu havia perdido o ônibus que nós levaria até a casa de tia Sônia, que por sinal era humilde e odiava dirigir carros. Lupita tinha três anos e era um papagaio em meu colo. Tínhamos ido ao mercado.
- Eu não acredito nisso! não pode ser. Mas que Buceta! - grito com raiva.
- A próxima passa daqui meia hora moça - Havia um casal de velhinhos que estavam ali sentados. Olho para eles rapidamente.
-Bu- Ce- tá ! - A palavra com entonação em cada sílaba doi dita por aquele pequeno ser, meus olhos se arregalaram.
- Maite vai me matar! - sussurro olhando para a menina com o sorriso arteiro no rosto.
- Olha que lindo José, ela chamando o automóvel - Os velhinhos sorriam enquanto eu queria chorar.
Olhei para a mesma menina que agora tinha três anos a mais e um par de olhos curiosos pra cima de mim.
- Você via vestida assim titia? - Olho para mim e eu estava de pijama. Puta que pariu, eu tinha menos de meia hora. Vou estrangular a Maitê.
- Sua mãe, tá ferrada comigo - Digo antes de me virar e subir as escadas - Fica quietinha aí ouviu - gritei.
Após uns vinte minutos eu já estava trocada. Vesti um short jeans despojado, uma regata básica preta, e um par de sandálias. Peguei meus óculos e amarrei o cabelo em um rabo de cavalo. Corri para fora do quarto e por milagre Lupita estava imóvel na sala.
- Vamos - digo e ela me segue. Ao entrar no carro ligo para Lola, minha secretária.
- Bom dia Senhora Dulce.
- Bom dia Lola, preciso que desmarque qualquer coisa que eu tiver agora de manhã, estou resolvendo um contratempo.
- Tudo bem Senhora, mas alguma coisa?
- Não só isso. Tchau.
Desligo o celular e ligo o carro.
- Então, pestinha, pra onde vamos?
- Para o parque da prefeitura.
- Coloca o cinto !- digo dando partida no carro.