CAPÍTULO ĪĪ

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O sol resplandecente no céu brilhava para todos naquela tarde, sejam eles monstros, deuses ou servos, os que tinham sede de justiça, piedade e os que ansiavam pelo sangue; todos estavam a caminho da Corte dos Anjos, onde a cerimônia da Ceia de Nirvena iniciava-se.

As vozes dos soldados da corte em comandos, os cavalos trotando sobre o solo das montanhas com a chegada dos representantes de outras cortes, e as badaladas do grande sino de ouro no santuário do reino em longos intervalos de tempo atravessavam pelas janelas da torre mais alta, onde Maylin estava. A mistura de sons a deixava ainda mais nervosa. Talvez suas mãos devessem parar de tremer e suar incontroláveis sobre seu colo e o tecido real imediatamente e, certamente, o olhar julgador de senhora Devorrá desviar-se de seus olhos. O que de tão terrível haveria neles para que essa mulher a olhasse de tal forma?

A serva afastou-se, curvou sua coluna e saiu dos aposentos da garota; a sombra de dor em sua expressão não passara despercebida. Maylin questionou uma vez, assim que chegará ao reino, e Martin não se deteve em castigá-la com três chibatadas de cordas de ouro em suas costas. Haviam regras ali e sua preocupação não era o bastante para quebrá-las. Maylin entendia isso agora, mesmo que sua dúvida ainda estivesse ali. Pois, afinal, Martin descobriu de alguma forma que ela havia falado com a serva muito mais do que ordens, e bem, Devorrá que até então parecia ter problemas de fala, não teve algum quando a delatou à seu guardião. Talvez fosse o rancor nos olhos de Maylin que fizera a serva tão enojada a pouco.

Finalmente sozinha desde que Martin entrou em seu quarto pela manhã, Maylin se levantou e abriu uma brecha entre as cortinas das janelas. Não poderia ser avistada nem mesmo por pombos até que Martin trocasse a ordem. Era cansativo às vezes, se lembrar de todas as regras, mas ela era boa nisso, em obedecer. Afinal, no que mais ela poderia se destacar? Sem dons celestiais e sem asas, só uma humana em uma vida errada. Sabia que tinha sorte em ter seu guardião e tudo que ele lhe proporcionava, mas nada mudava o sentimento real de que não era seu lugar e estava tomando algo que não deveria, mesmo que ela jamais recusasse. Se egoísta fosse um dom, ela o teria em abundância. O suspiro que saiu por seus pulmões foi audível e cansado. Contudo, ser curiosa demais também poderia ser um de seus dons, pois ali estava ela, espionando por trás das cortinas.

O salão de festas estava praticamente sob seus pés, as damas de todos os reinos eram deslumbrantes em seus vestidos volumosos e os cavaleiros esbeltos em ternos ou vestidos a linho e fios de ouro. Não seria a primeira Ceia que aconteceria desde que chegara ali, mas seria a primeira a qual ela participaria.

Maylin fechou a fresta e se afastou das cortinas, não mais testando a sorte. Poderia imaginar o que Martin faria se a visse lá debaixo, e não gostava nem um pouco.

Seu pequeno relógio sobre a penteadeira soou assim que se completaram dez da manhã , o horário que Martin a tomaria para irem juntos ao salão. Ela não poderia hesitar, nunca, por mais que estivesse nervosa agora, não estaria quando ele entrasse pela porta. Respirou fundo e encarou seu reflexo no espelho, tudo em seu corpo era sobre luxúria e poder, as jóias, os tecidos, as partes que o tecido não cobriria conforme seu movimento, o brilho em excesso sobre sua pele naturalmente bronzeada, o cabelo escuro e longo solto em suas costas com finas mechas traçadas em fios de prata d'água.

A porta se abriu, sem batidas como sempre. Ali estava Martin e o brilho em seus olhos era, de certa forma, diferente. Maylin não hesitou, sua coluna reta e seu queixo erguido não se moveram quando seus lábios vermelhos sorriram para o homem completamente vestido por aços e armas, nem quando seus joelhos cederam em uma sútil reverência.

- Se tornou muito boa nisso, querida - observou o guardião.

- A prática leva a perfeição, como sempre disse meu mestre.

Sucumbida Por Estrelas E Mundos  [Em Atualização]Onde histórias criam vida. Descubra agora