CAPITULO ĪĪĪ

2 1 0
                                    

Sem o véu, Maylin sentia-se nua na frente de todos, os olhares a oprimiam e seu nome era murmurado por todos os lados em sussurros desagradáveis. Era confuso para eles, mas não tanto para ela, pois Martin já havia falado em entrelinhas por anos sobre esse dia, então era esperado... Todo rei precisava de uma rainha, poderosa e perigosamente bela, submissa, porém mortal. Seu rei não era diferente, e Martin não conhecia niguém melhor que ela para aquele papel. Ele foi seu cuidador por tantos anos, que Maylin sentia-se em dívida, então ela se esforçou muito para que hoje seu rei estivesse com os olhos cheios de luxúria. Era sua conquista particular, mas bem, Martin não precisava de detalhes, apenas que ela era o que ele desejava que fosse.

No entanto, o que ela deveria fazer agora? O que sentir? A sua vida sempre fora ditada por Martin, aparentemente e, agora também seria pelo Rei dos Anjos, seu futuro marido. A ideia não agradava, todavia, pelo que brigaria? Não havia nada além daquele castelo para ela, apenas a conquista de todo o reino bem aos seus pés; e se eles confiavam no potencial, isso não deveria deixá-la... feliz? Estavam entregando a ela o poder em uma bela bandeija de prata reluzente.

Um dos servos se aproximou, sua postura elegante e cordial, os cabelos marfim em duas longas tranças e as vestes longas brancas tão leves quanto o ar, e um sorriso discreto. Ele serviu-a de uma taça com líquido fluorescente, logo após ele mesmo provar um suave gole. Maylin tomou a haste da taça entre seus dedos e o gosto agridoce dançou pela sua garganta, realmente divino. Grata, sorriu para o serviçal que, timidamente, enrubesceu seu rosto pálido e abaixou a cabeça.

— Obrigada. Isso está perfeito — disse Maylin. O servo do rei curvou-se em reverência e afastou-se, indo em direção ao rei.

E Maylin ao ouvir o som alto das gargalhadas do rei por algo que seu Bobo da Corte havia dito, adiantou-se na direção oposta do trono, descendo pelos degraus e o imenso tapete vermelho.

Ela ouvira tantas histórias sobre os outros reinos desde sua infância, em relatos desenhados em seus primeiros livros, as inúmeras histórias que Martin contava a ela antes de dormir nas noites de fortes tempestades, sempre fora fascinada por todas elas, mesmo quando tudo que parecia real eram paredes de pedra e serviçais que mal dirigiam-lhe a palavra. Era difícil acreditar que havia tudo aquilo, realmente. Parecia muito mais encantador do que sua mente seria capaz de imaginar. Estava deslumbrada por tudo, de tal modo que seus olhos se perdiam pelo imenso salão adornado em ouro e peças finas, as diversas esculturas angelicais nas colunas do espaço, e com todas as mais diversas e belas criaturas.

Um grupo de jovens garotas estava em frente ao banquete, e suas peles douradas realmente cintilavam, como micros raios de sol que se desenhavam por todo o corpo, como delicadas runas incrustadas por toda pele, os cabelos longos e loiros enfeitados com peças de esmeralda, e seus vestidos eram de um tecido parecido à seda das fadas do campo, e seus sorrisos eram tão fáceis e fascinantes. Certamente eram de Migarden, o reino das luzes, do sol, e de todas as cores e sentimentos vibrantes. Maylin não acreditava no paraíso após a morte, mas se acreditasse, Migarden seria o lugar.

À direita, quatro homens em vestes tecidas em fios de morte e sangue, representação de alta honra do exército, que apenas as magas mais antigas sabiam costurar. A roupa se agarravam à suas peles como opala líquida. Eles atraiam os olhos de Maylin ao mesmo tempo em que faziam seus ossos tremerem. Entre eles, a mulher das longas unhas vermelhas e postura esbelta que havia visto antes. Ela parecia, embora fosse quase impossível, mais fria que os homens ao seu redor, mais cruel. Definitivamente era capaz de matar, como a deusa Nifertary, ao qual Maylin estudou junto com Martin algumas temporadas atrás - “Ela era a morte, mas a morte era bela, fria e fatal". - Isso estava nos olhos daquela mulher e Maylin desviou os seus de imediato quando eles se encontraram com os dela, um impulso idiota, que a fazia parecer uma tola não uma futura rainha... Tantas falhas para reparar.

Com o desvio, seus olhos encontraram seu noivo observando-a, o olhar tão fixo que deixava suas palmas quentes. Ela esperou tanto pela sua aprovação e agora a tinha, mas por que parecia tão superficial? Talvez houvesse algo naquela bebida, mas Maylin não poderia negar a beleza do Anjo, seus cabelos ruivos, os olhos tão quentes como fogo puro, o poder em suas envergaduras. Seu corpo era grande e forte e sua posição naquele trono deixava claro a quem todos ali estavam sujeitos essa noite. A quem ela estava também.

Maylin ouvira sobre suas histórias, seus atos heróicos, a sua fome por poder e sua inteligência em governar. Claro, Martin era um admirador de seu Rei. E havia, por outro lado, os boatos - curtos cochichos abafados pelos corredores e as paredes grossas - sua fome por guerra, sua sede por mulheres casadas e tantos outros. Mas ali estavam eles agora, prestes a serem um só pelas leis de seu povo e sem ao menos saberem mais do que boatos. Na verdade, ela sabia algo novo sobre o Rei de Niverna: como seu olhar era dominador sobre ela. Tão penetrantes, como dos gaviões que estudavam sua presa. E ela, uma jovem que apreciava as poucas janelas de liberdade em suas decisões, queria jogar com isso, ao menos essa noite. Afinal, seu rei a estava vendo, finalmente, e ela queria que ele o fizesse mais e mais, que todos vissem a quem ele desejava. Sua bebida foi reposta em sua mão sem ela mal perceber e de repente, seus pés foram levados ao centro do salão onde as jovens de Migarden dançavam animadas com as garotas aladas de Nirvena.

Maylin se sentiu livre naquele momento, como não se lembrara da última vez daquele mesmo sentimento. Ela só queria dançar, dançar até todas as suas dúvidas se transformassem em certezas e seus pés adormecessem. Seu vestido se moldava ao seu corpo, acompanhando seus movimentos como ondas. Seus longos cabelos escuros se soltaram aos poucos do belo penteado e sua pele suava quente enquanto girava e dançava ao centro do salão, sozinha, sem notar que a maioria dos representantes das cortes vizinhas fitavam-na.

Maylin se movia com tanta segurança, seus passos profissionais de aulas exaustivas que faziam seus pés sangrarem. Ela havia feito aquilo tantas vezes, seus sapatos viviam esfolados, mas a dor era como uma prévia do sucesso. Maylin sabia que sem poderes angelicais seria nada mais do que uma vergonha para seu cuidador, então ela se projetou nas artes, tão perfeita quanto possível para Martín parabeniza-la. Para aqueles que a observavam, Maylin era como o anjo negro das lendas apocalípticas, belo e terrível.

Ao lado oposto, o Rei dos Anjos estava eufórico em seu trono. Nunca, em tantos anos, seu corpo havia desejado tanto se deitar ao lado de uma mulher e aquela era sua, como ninguém mais seria. A pele da jovem era um tom de caramelo claro que fazia sua boca salivar, tão impecável quanto porcelana, seu cabelo longo esvoaçante ficaria mais belo entre os seus dedos naquela noite, e a boca dela... Tudo nela o pertencia antes mesmo de suas existências. Seus dedos se apertaram nas laterias de seu trono, os nós esbranquiçados. Mal poderia esperar por ela, e sabia o que ela estava fazendo quando os mais belos olhos de avelã olharam por cima de seus ombros delgados, fitando-o, e seu próximo movimento fez o tecido deslizar por suas coxas femininas e lineares.

Um espírito livre num corpo preso desde há muito tempo. A jovem anjo parecia implorar pelas chamas e o rei mal poderia esperar para conceder-lhe.

Sucumbida Por Estrelas E Mundos  [Em Atualização]Onde histórias criam vida. Descubra agora