Em meio a esse processo de descobrir o amor-próprio, eu descobri alguém que já havia me descoberto muito antes.
Durante a aula, enquanto voltava para uma das últimas carteiras depois de mostrar o caderno para o professor, escutei uma piada. Não me recordo totalmente agora de como era, mas me recordo de sorrir, e foi por sorrir que eu escutei:
-"Helena, senta aqui na frente com a gente."
Era Lúcio, que estava sentado ao redor de outros dois meninos. Ao passar dos anos, a classe continuava a mesma, não havia rotatividade de alunos, então todos nós nos conhecíamos um pouco. Lúcio notou meu sorriso, e me convidou para sair do fundo e ir para a frente, e assim eu fiz, já que afinal, lá trás não existia mais nada nem ninguém importante para mim.
Não foram poucas, mas também não muitas vezes em que trocamos algumas conversas, mas quando me sentei ao seu lado, tive um pequeno flashback de todas as vezes que conversamos. Ele também parecia não se importar com o amor, ele tinha mais interesse pelo cinema e pelas piadas ruins que nos faziam rir. Após esse dia, eu quase não frequentava mais os banheiros durante o intervalo, nós discutíamos sobre tantas coisas e que muitas ambos tínhamos em comum, e foi durante esse "em comum" que eu descobri que Lúcio também não era amado, assim como eu.
Meus dias sozinha no banheiro eram quase inexistentes, acontecia apenas quando Lúcio não ia a escola, e eu me encontrava com a tristeza somente de noite. Eu estava bem.
-"Eu gosto de você tem algum tempo".
Essas palavras foram como ruídos altos em meus ouvidos e uma navalha afiada adentrando em meu coração. Em meio a esse caos interno, tudo o que consegui dizer foi:
-"Por que?"
-"Porque você sempre foi legal comigo, a gente é parecido" - Disse Lúcio, da maneira mais natural possível enquanto eu enfrentava uma guerra dentro de mim.
Eu havia me enganado, ele se importava com o amor.
Eu devolvi a resposta dele com um sorriso, mas não era igual o que eu o tinha dado no passado por causa da piada, era um sorriso como se fosse um pedido de perdão. Ele entendeu e voltamos a conversar normalmente sobre outra coisa, mas na noite desse mesmo dia eu senti as consequências daquela navalha no coração e dos ruídos em meus ouvidos.
O amor me rejeitou de novo, mas era diferente. Ele rejeitou adentrar dentro de mim e corresponder para quem havia me dado ele, e isso acabou comigo.
"Por quê? Por quê? Por quê? Por quê? Por quê?"
Apesar disso, continuamos amigos e nunca mais tocamos nesse assunto, mas essa pergunta ficou presente todos os dias até o dia em que me formei no ensino médio.
Entretanto, havia alguém, ou melhor, havia algo que eu amava cada vez mais, quase como se fosse um vício. Era a tristeza, "minha querida velha amiga". Sempre me intrigou porque ela é considerada algo negativo, quando na verdade era ela que me colocava para dormir pois eu não havia vontade de ficar acordada, era ela que me fazia não comer pois não queria engordar mais, era ela que me fazia derramar lágrimas pelas coisas que mereciam terem as lágrimas derramadas. Eu via a maldição como uma benção, porque ela foi a única que não me rejeitou.
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Até que o amor me defina
General FictionHelena cresceu com todos os tipos de sentimentos, com exceção de um. Em uma briga constante entre sentir a tristeza, que foi o primeiro sentimento que ela se lembrava de ter aprendido, e entre sentir aquilo que ainda não havia conhecido, ela também...