"Há mais perigo em teus olhos do que em vinte espadas!"
William Shakespeare
Já haviam se passado muitas gerações desde que os três filhos de Kim Jun-ho foram acometidos pela presença dos seres do vazio. Seis com exatidão. Desde então, não havia uma geração sequer que não temesse o dia em que os céus mudariam de cor, assim como os olhos de um dos seus descendentes.
Desde a partida de Lazúli em regresso às profundezas do vazio, que o seu temeroso retorno era ansiado por todos.
Principalmente por Eun-ji, uma das últimas descendentes de Kim Jun-ho que restaram.
Obstinada a quebrar o destino etéreo que foi imputado aos Kims, Eun-ji por anos guardou-se e se absteve de qualquer sentimento pagão. Dedicou-se ao sagrado, mantendo seu imaculado coração.
Contudo, a inexistência do vazio era irreal e implacável ao destino daquela pobre alma.
Uma certa noite de lua minguante, um andarilho e seu filho peregrinavam pelas estradas de Basã, carregando em grandes cestos em sua carroça: tecidos, perfumes e belas pedras preciosas. Ele poderia ter contornado a floresta por um longo, porém, mais seguro caminho, ou até ter se arriscado, como de costume, pelas solitárias e secas estradas que cortam ao meio as ermas terras Escarlate. Mas, inexplicavelmente, naquela noite de céu escuro e estrelado, resolveram por Basã passar e daquela noite em diante nunca mais saíram de lá.
A cada nova estação, Eun-ji, a um túmulo, visita.
Bastou um encontro, uma troca doce de olhares e um belo e solar sorriso para o execrado sentimento do seu puro coração se apossar. E em rendição a aquele mero viajante, entregar.
Kim Eun-ji era a manifestação da inútil esperança de se crer em uma vitória contra o destino. E a criança que, antes de morrer, aquele viajante em seu ventre semeou, e que do seu seio sequer se alimentou, era a inevitável certeza de que, enquanto o vazio existir, a imortalidade escolheria e sepultaria a alma que desejasse.
Ekanite e Citrino ouviram o chamado do irmão, mas algo em seu clamor, não condizia com o tempo, tampouco com a apoteótica regressão de um imortal ao finito mundo humano. Suas suspeitas tornaram-se certezas quando a um pequeno casebre, à beira da estrada de pedra, uma mãe dando a luz encontraram. Os gritos de dor e consternação de Eun-ji sonorizavam o clamor de uma mãe que padecia, sentindo a alma se esvair do próprio corpo ao dar vida àquela criança.
No fundo daquele casebre, Jimin e Seokjin encontraram Kim Eun-ji, já sem forças, sozinha, estirada no chão, com um prematuro estranhamente silencioso nos braços, ainda preso a si por um cordão umbilical.
A pobre mãe que nem ao menos o fruto do seu ventre pôde nomear, somente teve a chance, pouco antes de partir, de vislumbrar seus olhos. Lindos, estreitos e brilhantes como um cristal de quartzo, tão belos quanto os do seu único amado, antes de um tom azul deslumbrante invadir sua íris.
Kim Eun-ji morreu dando à luz a um imortal. Trazendo a Ekanite e Citrino, um sentimento que nunca experienciaram.
Temor.
Lazúli ressurgiu prematuramente, em um corpo frágil, pequeno e dependente. E toda a pressa do seu retorno era o anúncio de tempos difíceis.
Seokjin cantou o Cântico aos Mortos, ofertando devoção ao sacrifício daquela pobre e infortuna alma, desejando a ela, descanso. Jimin com toda a compaixão e cuidado, cortou o laço que unia mãe e filha, fazendo o corpo de Eun-ji, imediatamente, em fuligens de fogo se esvair.
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O Conde Escarlate
Hayran KurguTAEKOOK FIC | FANTASIA | + 18 O CONDE ESCARLATE Inimigos desde o tempo da criação, os filhos de Caim tem sua existência ameaçada pelo surgimento dos nascidos da terra. Vampiros e lobos travam uma devastadora e sangrenta guerra que ameaça a existên...