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Capítulo Quatro

Nos dias que se seguiram, Hoshi parecia um pequeno ajudante boneco. Bom, não completamente, já que ele não conseguia mover mais do que os membros e a cabeça. Mas, mesmo assim, aquilo era incrível. Hoshi era incrível!

Um dia, nos meus sonhos, Hoshi e eu decidimos começar o novo ritual assim que a casa ficasse vazia, o que ocorreu na semana anterior a do Halloween, quando toda minha família estava cuidando das vendas na loja do centro da cidade. Tudo estava perfeito, eu estava com expectativas de que aquilo iria dar certo.

Fomos para o jardim e colocamos tudo o que precisaríamos sobre o gramado. Preparamos o círculo de proteção, as velas, e o encantamento que eu havia escrito no meu Grimório. Hoshi foi posicionado no centro do círculo. Esperei do lado de fora, acendendo as velas e preparando as demais coisas. Algumas palavras e afirmações depois, as chamas das velas se balançavam como se tivessem vida própria, e os elementais do fogo pareciam tornar sua presença conhecida.

A grama abaixo de Hoshi também começou a se mover, como pequenas ondas verdes. Continuei a entoar as palavras, maravilhado com tudo. Quando toda a cera da vela queimou em poucos minutos, uma grande cortina de fumaça de fonte desconhecida cobriu todo o círculo. Isso me impediu de ver Hoshi. Hesitei por um momento sobre continuar o encantamento ali ou interrompê-lo, mas eu continuei.

E quanto mais próximo do fim eu estava, mais forte soprava o vento e mais alto subia a cortina de fumaça. Todas as flores e plantas da minha avó balançavam. Eles estavam fazendo um barulho estranho. Pareciam sussurrar o nome de Hoshi. Ou talvez eu tivesse enlouquecido de vez.

— Faça desse boneco um garoto de verdade! — eu pedia, repetindo algumas vezes.

Nos minutos seguintes, pensei que tudo o que havia acontecido nada mais era do que invenções da minha mente louca. Já havia acontecido antes. Então, quando a fumaça não sumia, eu passei a questionar se havia feito algo errado. Quando ainda conseguia ouvir o barulho das plantas, eu me perguntava se realmente havia enlouquecido de vez.

O som da porta da frente sendo aberta tirou a minha atenção, então eu me desesperei. Desde a vez que coloquei fogo nos crisântemos da vovó com incensos naturais, ela havia me proibido de pisar no jardim de novo. Como eu iria limpar tudo aquilo se a fumaça insistia em continuar ali? Eu estava muito ferrado, então corri para dentro da casa e tentei agir naturalmente.

Jihoon-ah, voltamos! As vendas estavam fracas hoje. — Vovó dizia com sua voz cansada de senhora.

Cadê você? Trouxemos besteiras para gente comer! — minha mãe contou rindo, talvez porque provavelmente comeriam tudo sozinhas caso eu não aparecesse.

E foi nesse momento que elas chegaram na cozinha e encontraram um Jihoon sorridente, com uma mão apoiada na geladeira e outra na própria cintura. Super normal. Nada suspeito. Eu era um mestre em agir naturalmente.

— Oh, ei! Minhas duas mulheres preferidas no mundo inteiro! Como estão? Por que só vieram vocês? — disse em disparada.

Minha progenitora franziu a testa no mesmo momento, logo questionando:

— Cheiro de fumaça... você aprontou? — pareceu mais uma afirmação do que uma pergunta. Mamãe tem um faro ótimo para essas coisas.

Talvez eu tenha feito merda e não faço ideia de como desfazer.

— Carne. — eu disse apressadamente. — Estava fritando carne.

— Você não é vegano? — Vovó perguntou, agora com o mesmo olhar desconfiado que minha mãe.

— Carne vegana, Vó. Tentei fazer uma receita nova e não deu muito certo. — sorri com o sorriso mais sínico do mundo.

Tá, eu sou um péssimo filho e um péssimo neto, eu sei. Mas não é como se eu pudesse simplesmente dizer: "Vó, oi! Sabe o jardim que a senhora me disse para ficar longe? Então, eu não fiquei e agora tem uma fumaça com vida própria perto dos seus cactos e alfazemas. Rárá, tomara que elas não morram que nem o crisântemo. E mãe, ah mamãe, lembra quando me disse pra não fazer nada que eu não soubesse desfazer depois? Pois é, eu fiz. Espero que não vire a Annabelle e mate a gente".

— Então, o que trouxeram? — tentei desconversar quando ninguém falava nada. Deu certo, pois agora as duas sorriam e me mostravam os doces sem as pobres cochonilhas nojentas na receita. — Eu amei isso! Com certeza vou comer tudo. Só deixa eu jogar o lixo do quintal fora!

E corri para a outra porta que dava acesso ao jardim, abrindo devagar e fechando rapidamente. Minha alma quase deixou meu corpo quando eu cheguei no círculo. A fumaça não estava mais lá, o que era bom, mas a parte louca era que Hoshi tinha sumido também. Será que eu havia criado a Annabelle 2.0, versão boneco de pano mal costurado?

De qualquer forma, eu não tinha muito tempo para pensar nisso, tinha que me apressar em colocar tudo em um saco e sumir de vista. Minutos depois tudo estava na lixeira da calçada nos fundos da casa, onde tínhamos acesso a rua de trás, O jardim agora não tinha mais sinais da minha bagunça. Entretanto, uma coisa ainda incomodava meus pensamentos... onde diabos Hoshi se meteu?

Talvez a fumaça tenha lançado ele para a casa vizinha? Eu torcia para que fosse isso, mas o universo as vezes gosta de me foder.

Boneco Encantado •ksy + ljh• ⚣︎ [SoonHoon]Onde histórias criam vida. Descubra agora