Karina segurava e descascava uma batata, cena comum naqueles dias em que decidiu não discutir mais com o pai e passou a se aventurar durante tardes inteiras na cozinha do navio, ao lado de um saco daqueles odiosos tubérculos. Em uma semana, a tarefa parecia não incomodá-la mais. Subiu as mangas da camisa de linho branca até os cotovelos e apoiou os braços nos joelhos, enquanto cantarolava uma música de marinheiro velha.
- Bisbilhotar o serviço dos outros é feio. Que tu queres? - Perguntou sem se virar, sabia que estava sendo observada por Winter há pelo menos quarenta minutos. Continuou atirando as batatas descascadas no balde e buscando outra dentro do saco. Não precisava de olhos atrás para saber que a menina tinha arregalado as orbes, surpresa por ter sido descoberta e depois sorriu pelo mesmo motivo, movimentando a cabeça levemente para tirar os fios dourados que caíam-lhe sobre os olhos, aquele par de olhos cor de jabuticaba malditos. - Dê o fora daqui.
Winter deu quatro passos para se prostrar ao lado da morena, torcendo o nariz em puro nojo com o cheiro forte de pescados recém-abertos que estavam em cima da mesa de madeira. O sol abaixava no horizonte, alaranjando as águas do mar, o navio inteiro, as duas e o cais. Partiriam rumo ao destino final ao raiar da manhã. Karina odiava como aquela burguesinha sem vergonha olhava para aquele local imundo, para o canivete com que ela cortava as batatas e para tudo que tinha a ver com o mundo dela. Olhava como se tudo que Karina tocava fosse imundo. E era mesmo. Desde suas mãos até sua cama em que Winter gemia madrugadas inteiras até ficar rouca.
Foi uma surpresa assistir a menina passar a mão numa das banquetas, tirando o pó, para se sentar. Karina quis rir. Não via motivo nenhum para Winter, com todo o seu porte de princesa, estar se sujeitando a sentar naquele local pavoroso, mofado, que fedia à entranhas de peixes. Atirou mais uma batata no balde, enfiando os dedos no saco em busca de outra, mas parou quando a mão branca e macia segurou seu pulso com muita firmeza.
- O que vai acontecer quando o navio atracar de novo? - Winter encarou o rosto da filha do capitão por mais tempo que pretendia. Perdeu-se naquele rosto bonito, suado, nariz afilado e lábios naturalmente rosados e grossos. Karina tinha dezessete e ela dezesseis. - Eu vou te ver de novo?
Winter se entregava todas as noites - de corpo e alma -, atirava o orgulho e a arrogância da nata da alta sociedade no lixo pela filha do capitão. Karina era daquelas que dava nomes aos pertences. Somente nomes de mulheres. De mulheres gostosas, segundo ela. Mas os nomes em objetos aleatórios, como o do canivete por exemplo, não importavam quando as mãos bruscas da morena rasgavam suas camisas de cetim, quando ela tirava as calças sem abrir um mísero botão, ou quando a empurrava contra a parede do quarto e a xingava de qualquer coisa que Winter jamais ousaria pronunciar na vida, mas que na boca de Karina soavam tão quentes.
- Um amor em cada porto, loira. É assim que as coisas funcionam.
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Ciúmes e outros casos de amor
FanficCiúmes e outros casos de amor é um compilado de one-shots winrina [ Winter e Karina ]