Não está tudo igual

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Voltei.  Fugir não está no meu sangue, então vou ficar aqui mesmo e viver a minha vida.

Eu tenho a minha profissão,  ganho o meu dinheiro, nunca dependi de macho para o que quer que fosse.

Bati na porta da minha amiga Beatriz e pedi um tecto por uns dias.

Trabalhamos as duas como escriturárias numa repartição pública.  Ela acolheu-me sem questionar.

Tenho pena de Rodolffo.  A doença dele tem tendência a piorar.  Eu fiz teste de compatibilidade para lhe doar um rim, mas ainda não saiu o resultado.  Se ele não encontrar um dador vivo, terá que entrar na lista de espera para os dadores mortos.

Não sei de onde apareceu aquela prima.  Achei muito esquisito da parte dele pois nem sabia da existência dela, mas ele quis assim.

Quero ver aquela dondoca a preparar as refeições dele como tem que ser.  Legumes cozidos em duas àguas, batatas deixadas de molho de véspera e outros procedimentos que os alimentos precisam para se lhe retirar o máximo potássio possível.

Enquanto isso, Rodolffo já enfrentava uma série de advertências da médica da clínica de Hemodiálise.

- Rodolffo, de um momento para o outro, aumento de peso? E estes níveis de potássio?  Você estava a ir tão bem.  O que aconteceu?

- Nada.  Está tudo igual.

- Igual não está senão não havia estas alterações.

- Então não sei.

Letícia vivia fazendo saladas verdes e saladas de fruta, coisas que faziam mal a Rodolffo.   Ele até sabia , mas comia.

Rodolffo começou a  cansar-se da prima.  Trabalho, zero.  Rodolffo suportava todas as despesas sozinho e por vezes até das compras pessoais dela.  A casa não via uma limpeza desde que Juliette saiu.  Rodolffo até tentava fazer alguma coisa, mas a saúde não permitia.

O orgulho dele não permitiu que procurasse a mulher.  Não sabia onde ela estava nem procurava saber.  No entender dele era melhor ela estar longe do que viver com um homem doente.

Hoje foi para a clínica para mais uma sessão de Hemodiálise depois de ter tido uma pequena discussão com Leticia.   Voltou 4 horas depois e ela não estava.

Foi deitar-se e adormeceu.  Acordou assustado com alguém que o abraçava.   Era Leticia.

- O que estás a fazer?  Quem te deu a liberdade de entrares no meu quarto?

- Rodolffo,  eu quero ajudar-te.

- Ajudar-me a quê?

-  Eu quero ficar contigo.  Eu gosto de ti.

- Sai daqui, por favor.  Espera na sala para conversarmos.

Rodolffo ajeitou-se e foi até à sala.

- Não sei onde pensaste que poderias ter essa liberdade.

- Juliette foi embora.  Ela deixou-te, só prova que não gosta de ti.  Podemos tentar.

- Vais arrumar as tuas coisas agora e deixar esta casa.

- Mas eu não tenho para onde ir.

- Não me interessa. Sais daqui agora mesmo.

Contrariada ela foi fazer a mala e saiu a resmungar desaforos contra ele.

Rodolffo devia tê-la mandado embora depois que Juliette o deixou, mas por comodismo deixou andar e ela interesseira via ali uma oportunidade de se dar bem.

Rodolffo sentou-se no sofá e pela primeira vez chorou.  Estava triste e desanimado.  A sua condição de saúde também não lhe trazia qualquer ânimo.

Sentiu saudades dos primeiros anos junto da sua morena antes da maldita doença ter aparecido.  Eles foram muito felizes, mas após o diagnóstico ele ficou insuportável.

Nos dias seguintes contratou uma senhora de meia idade, viúva para o ajudar com a casa.  Instruiu-a quanto aos cuidados com os seus alimentos.

Vera possuía uma lista do que poderia ou não comprar no quesito de legumes e frutas.   Havia restrições em qualidade e quantidade.  Ela passou a fazer as compras todas da casa.

Vera tornou-se uma espécie de mãe para Rodolffo.   Mãe e conselheira.

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