Cinque.

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Scott adorava os intervalos entre as corridas, embora não conseguisse aproveitar tanto a pausa pela ansiedade que sentia para voltar logo às pistas. Ali, entretanto, ele podia respirar sem se preocupar muito com aquela pequena ansiedade que borbulhava seu peito toda vez que deitava a cabeça no travesseiro. Era apenas ele e a varanda de seu apartamento, em Maranello, o céu aberto com poucas estrelas e o silêncio, ou quase isso, já que ele ainda era capaz de ouvir a cidade relativamente agitada mesmo que já passasse das dez.

Ele se apoiou ali, seus cabelos balançando conforme o vento o atingia. Scott ainda tinha os fones no ouvido, mesmo que nenhuma música soasse nos aparelhos e seu celular estivesse no sofá, largado muito longe para que, mesmo que quisesse, ele desse play em algo. Mas ele gostava assim, apenas ouvir o barulho ambiente e respirar.

Respirar.

Às vezes, Scott esquecia de respirar. Esquecia que tinha que parar, não pensar em nada e só... respirar. Talvez fosse por isso que sofresse de crises de ansiedade com uma certa frequência. Às vezes, e só às vezes, Scott sentia como se tivesse o peso do mundo nas costas. As coisas não saíam como ele esperava ou previa mesmo que desse seu melhor sempre, e isso o consumia o resto do tempo, como se fosse sua culpa. Como se tudo fosse sua culpa.

No ano passado, a Ferrari virou piada nas redes sociais por ter estratégias terríveis durante as corridas e sempre acabar estragando as chances de vencer que ele e Jinki tinham. Os fãs ficavam desacreditados e os pilotos mais ainda. Scott perdeu a conta de quantas reuniões eles tiveram em equipe para discutir as estratégias com os engenheiros, e mesmo que, durante essas reuniões, eles tivessem ideias realmente boas, na hora de colocar em prática, parecia que tudo apenas desandava. Era como se houvesse alguma outra reunião que apenas Scott e Jinki não participavam, onde eles discutiam formas de arruinar as corridas.

Ele sabia que a culpa de perder uma corrida não era sua. Seu carro sempre dava problema, as estratégias mudadas no meio da corrida sempre o faziam perder posições, os pitstops demoravam. Sua cabeça esteve um caco naquele ano, e mesmo sabendo que a culpa não era sua, Scott não podia não se sentir culpado. Como se, mesmo com tudo aquilo, ele ainda tivesse a chance de ganhar e simplesmente não o fizesse por incompetência própria.

Para aquele ano, diversos estrategistas foram demitidos e, novos, contratados. Mesmo que Scott não estivesse correndo graças ao pulso quebrado, ele sempre estava por perto para saber o que estava acontecendo, e ficava realmente feliz de ver que todo o desastre do ano anterior não estava se repetindo. Ele chegou a parar no TikTok após curtir um Tweet de uma fã dizendo que finalmente a Ferrari estava tendo estratégias descentes. Quem poderia culpa-lo? Scott, junto de Jinki, era um dos maiores afetados pelas estratégias ruins da equipe.

Mas, veja ele agora, ele sequer completou sua primeira corrida desde sua volta. De novo, se sentia culpado.

Se lembrava de apontar o dedo no rosto de Febatista e dizer que o culpado era ele, mas Scott apenas estava com raiva e machucado naquele momento. Agora, mais calmo, ele repensava se havia sido realmente culpa do loiro. Se ele não tivesse tentado ultrapassar, talvez nada daquilo teria acontecido, talvez tivesse passado em outro momento e subido ao pódio, talvez, quem sabe, poderia ter ganhado em primeiro lugar. Talvez, talvez e talvez. Scott era cheio de "talvez" em sua vida, sempre com "e se" ou "quem sabe". Era difícil viver a realidade sem imaginar as possibilidades infinitas que poderiam ter acontecido se ele tivesse tomado outras escolhas, principalmente quando a realidade era tão frustrante e ruim para si.

Respirar.

Scott esqueceu de respirar novamente.

Ele puxou o ar com força, deixando o peito se encher apenas para ter a satisfação de senti-lo descer e esvaziar conforme o vento noturno começava a arrepiar seus braços e pernas. Scott observou todos suas diversas pulseiras que ganhava dos fãs, quase todas com seu nome, seu número, seu apelido ou apenas pulseiras de amizade, que ele e algum fã, em algum lugar do mundo, deveria estar usando naquele mesmo momento. Havia uma única em verde e amarelo, sem nenhum dizer, apenas as cores do Brasil. Ele sorriu pequeno, sentia tanta falta de casa.

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