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— Se isso é algum tipo de trote atrasado, vocês estão todos dispensados de ser meus amigos — digo, fazendo com cautela o caminho pelo corredor.

Isabelle está tampando meus olhos com as duas mãos enquanto Matteus me guia pelo braço.

— Não é trote — ele jura —, embora eu fique meio surpreso quando penso que não temos esse tipo de coisa nessa escola.

— Esse lugar parece mesmo o tipo ideal de espaço pra trotes — Isabelle concorda, e eu reviraria os olhos se eles não estivessem cobertos.

Alguns minutos antes eles chegaram no quarto prometendo uma “surpresa”, e eu deveria ter sido mais esperta do que ter contribuído com a brincadeira. Seja o que for, tenho a sensação de que Vanessa está envolvida. Faz uma semana desde nossa conversa sobre a passagem de avião e, mesmo que ela não tenha tocado no assunto de novo, eu sei que Vanessa não desiste assim tão fácil.

Talvez seja por isso que eu me deixei levar com tanta boa vontade por Isa e Matteus.

Tenho alguma noção de onde estamos. Nós descemos até o primeiro andar e posso ouvir o chiado daquele único radiador perto do estúdio de arte que está sempre dando problema, mas, fora isso, estou firmemente Sem a Menor Ideia do que estamos fazendo aqui embaixo.

Porém, tenho certeza de que, se formos pegos, nunca mais sairemos da detenção.

— Seja lá o que for — aviso —, é bom valer a pena.

— Vai valer — Matteus promete, e então meu nariz detecta o cheiro de… batata-doce?

Sim, batata-doce com aquele cheiro de açúcar caramelado de marshmallow e, por cima disso tudo, o aroma delicioso da sálvia.

— Gente — começo, mas então Isabelle tira as mãos dos meus olhos e fico sem reação.

Estamos na sala de arte e ali, arrumado em cima da mesa, tem um minibanquete de Ação de Graças. Então percebo uma pequena ave assada que não é um peru, mas que está cheirosa demais, e alguns pratos de porcelana, um deles com macarrão com queijo, outro com as amadas batatas-doces com marshmallow. Tem uma torta também, e um antigo candelabro de prata ilumina tudo, mas meus olhos ficam retidos em uma única coisa.

A garota que me aguarda de pé atrás da mesa.

— Surpresa! — Vanessa exclama, batendo palmas.

Ela veste jeans e um suéter, com os cabelos soltos ao redor do rosto, sorrindo. Um sorriso de verdade, e estou surpresa.

Mas não pela Ação de Graças em miniatura que ela fez para mim.

Não, o que me surpreende é a percepção repentina, estonteante e indiscutível de que, mesmo sem querer, eu me apaixonei por uma verdadeira princesa.

O sorriso de Vanessa se desfaz um pouco, suas mãos se abaixam.

— Você não gostou? — ela pergunta, olhando para a comida. — Está errado?

Tenho que engolir em seco antes de conseguir falar.

— Não — eu a tranquilizo, dando um passo à frente.

De canto do olho, vejo Matteus e Isabelle trocando olhares.

— Não, é perfeito — digo. — Quer dizer, faltam três semanas para o Dia de Ação de Graças, mas, ainda assim. Isso é… eu não sei o que dizer.

Aquele sorriso ilumina o rosto dela novamente, e meu coração bate tão forte dentro do peito que me surpreende ninguém ouvir. Minha cabeça gira e minha garganta está tão seca que eu bebo feliz a latinha que Vanessa me oferece.

E imediatamente me arrependo dessa decisão quando um gosto meio sem gás de chiclete bate na minha língua, e eu afasto a lata para fazer uma careta.

— Eca.

— Isso é Irn-Bru, a bebida nacional da Escócia, queridinha — Vanessa diz, fingindo se sentir ofendida ao pegar a lata de volta, e quando nossos dedos se esbarram, eu juro que sinto um choque.

Mas me obrigo a fazer uma careta e digo:

— Você também não achava que o veado era o animal nacional da Escócia? E onde fomos parar por causa disso?

— Onde fomos parar por causa disso, de fato — Vanessa contesta. — Somos amigas agora. Não seríamos se não fosse por aquele veado estúpido.

Ela tem razão, mas tudo que consigo pensar é que deve ter sido ali que tudo começou. Não foi na lavanderia ou na dança na estufa ou olhando juntas para minhas pedras – foi aquela noite lá em cima da colina que nos trouxe a este momento, quando percebo que estou afim dela. Eu deveria ter percebido antes a maneira como as coisas tinham mudado entre a gente.

Nós comemos nosso pequeno banquete felizes, Vanessa nos deliciando com a história de como ela conseguiu reunir essa comida toda.

— Eu não sei como Glynnis conseguiu achar alguém pra cozinhar tudo isso — Vanessa comenta, pegando a colher nas batatas-doces e mexendo no prato —, mas a mulher é uma super-heroína.

E então Vanessa me encara, seus dentes mordiscando o lábio inferior.

— Droga. Isso é demais também? Mandar um contato da realeza arranjar comida? Eu sei que você disse que a passagem de avião era muito…

Estendo a mão e toco em seu braço, sacudindo a cabeça.

— Não, isso foi só… o uso de recursos disponíveis. É diferente de jogar dinheiro em alguém.

Vanessa quase se envaidece com isso, levantando o queixo com um sorriso confiante.

— Sabia.

Do outro lado da mesa, vejo Isa e Matt trocando olhares, algo se passando entre eles, mas ignoro.

Por enquanto, tudo parece... agradável. Legal.

Quase normal.

Mas então vemos um clarão na janela.

Notícias interessantes (eu acho, se você curte esse tipo de coisa) para reportar hoje na Escócia. A princesa Vanessa conseguiu se manter fora de confusão nas últimas seis semanas, deixando a todos em choque, tenho certeza. Talvez aquele colégio draconiano para o qual ela foi enviada esteja funcionando? Ou talvez seja outra coisa.

Aparentemente tem um espião lá nas Terras Altas. Um estudante tem vazado informações sobre Vanessa para a imprensa e, de acordo com a fonte, a princesa Vanessa ficou muito íntima de sua nova colega de quarto, uma garota do Texas chamada Giovanna Lima. A intimidade foi tanta que elas não são mais colegas de quarto, de acordo com nossa fonte. Algumas semanas atrás, a princesa e sua nova amiga foram colocadas em quartos diferentes. Pode ser que elas sejam apenas amigas, mas a fonte parece pensar que elas são mais do que isso. Enfim, aqui está uma foto borrada das duas comendo… um banquete de Ação de Graças? Com outras pessoas? Vai saber.

Pessoalmente, espero que Vanessa esteja namorando uma garota americana ajuizada, mas eu não desejaria Vanessa para meu pior inimigo, então as chances são meio a meio aqui.

(“Princesa Vanessa faz alguma coisa, eu sei que você vai clicar, eu preciso comer”, Cortem-lhes as cabeças)

Sua Alteza Real; ginessaOnde histórias criam vida. Descubra agora