Capítulo 3

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Hoje eu iria participar da patrulha em Salwah. Eu não costumo fazer isso muitas vezes, mas havia combinado com Hala e Uri que iria com eles hoje. Vai me fazer bem espairecer um pouco. Por mais que estejamos em serviço, cavalgar pela cidade e as redondezas do deserto me parece muito bom. Nós três estávamos indo ao estábulo pegar os cavalos.

Os outros soldados que fariam parte do grupo já deviam estar quase prontos também. Estávamos conversando e rindo até que sinto uma batida forte dentro de mim, como se algo tivesse explodido dentro do meu peito, porém não há dor. Paro o que estou fazendo e coloco a mão no peito, parece até que tudo ficou silencioso por alguns segundos. Os dois continuam selando seus cavalos e não percebem nada. Isso foi estranho, mas não tenho porque me preocupar, se foi apenas algo passageiro.

Termino o que estou fazendo e monto o cavalo. Saímos pela cidade em trios e passamos por cada rua, a fim de garantir que nada fora do normal esteja acontecendo.


Ao terminar a patrulha pela cidade o grupo se reúne e vejo que três pessoas foram detidas. Dois homens e uma mulher. Pelo que entendi, são dois ladrões e um agressor. Digo para os levarem ao palácio até Raffá, pois ele os direcionará a partir daí. O resto, assim como nós, sai em trios para cobrir uma área maior do deserto ao redor.


Já estávamos há um bom tempo no deserto e nada estava fora do normal, até o momento que sinto novamente outra batida ainda mais forte dentro de mim. Dessa vez me sinto ficar um pouco tonta, mas logo passa. Não menciono nada pois não quero atrapalhar a patrulha, e afinal já estava ficando tarde, o que significa que logo voltaríamos pra cidade.


-O sol já esta indo embora. Hora de voltar. - Ouço Uri dizer mais a frente virando seu cavalo.


-Hoje foi ótimo. Formamos um trio na patrulha, está tudo sob controle, nenhum incidente fora do normal.- diz Hala agora do meu lado enquanto voltamos até Salwah.- Só falta uma coisa pra esse dia ficar melhor.


-Deixa eu adivinhar...- finjo pensar um pouco e depois eu e Uri dizemos juntos- Bolo de Mel.


-Exatamente. Como sabem disso? -ela diz sinceramente confusa.


-Intuição - Diz Uri sorrindo e dando de ombros.


-Sei. -ela semicerra os olhos pra ele desconfiada.- Pois minha intuição é muito boa também e ela me diz que em uma corrida até o Palácio eu ganharia. -diz se gabando


-O que uma coisa tem a ver com a outra Hala? - pergunto sorrindo por ela ser tão aleatória.


-Quem chegar por último tem que pagar tudo que eu quiser na festa da lua.


-Ninguém tá aceitando na...


-Iaah


Antes que Uri pudesse terminar de falar Hala faz seu cavalo começar a correr na frente. Vejo Uri grunhir frustrado e correr atrás. Só nós sabemos o prejuízo que ela pode dar quando se trata de comida. Acabo chegando por último e vejo Hala comemorar descendo do cavalo.


-Ainda bem que você chegou por último Mishi. Se fosse depender do soldo do Uri eu não ia comer quase nada. -diz ela feliz como uma criança.


-Pois bem. Na festa da Lua você pode comer o que quiser. Por minha conta.- digo sorrindo pra ela que me abraça.

Olho por cima do ombro dela pra Uri que gesticula um "desculpa" com a boca me fazendo achar graça daquilo.


- Já esta tarde. Vocês vão dormir no Palácio ou vão pra casa?


-Vamos pra casa mesmo. Mas amanhã nos vemos. -diz Uri me dando um beijo na testa e se despedindo junto com Hala.


Dito isso, vejo os dois indo embora e me sinto só nesses momentos. Queria que eles pudessem morar aqui.
Hala e Uri moram juntos desde que ele entrou no exército aos quinze anos. Hala ingressou três anos depois. Eles moram com o tio de Uri que também faz parte do exército desde que o pai de Hala morreu atacado por um Buzori. A mãe dela morreu durante o parto e seu pai a criou sozinho até o ocorrido. Uri cresceu com o tio e não sabe nada sobre seus pais. Por mais que seu tio viva o dizendo que eles não o abandonaram, ele tem uma mágoa muito grande deles.
Eles são muito fortes por passarem por isso e se manterem firmes. Fico feliz que tenham um ao outro desde pequenos, e sou muito grata ao espírito de Magower por ter permitido que eles entrassem na minha vida.


Decido entrar pois já estava ficando escuro e preciso tomar um banho, pra tirar toda essa areia do deserto de mim. Hoje resolvi comer no meu aposento mesmo, estou muito cansada pra sair, só preciso de uma boa noite de sono.


Acordei no meio da noite. E não foi pelo sonho dessa vez. Outra batida dentro de mim me fez despertar. Sinto meu corpo quente e me sinto tonta pela febre. Decido ir até a varanda pra tomar um ar, aqui dentro está muito quente, eu mal consigo respirar.


Sinto o vento frio da noite do deserto bater em mim, me trazendo uma alívio quase imediato. Olho pra cidade a noite, ainda que todos já tenham ido dormir, ela continua bem iluminada. Salwah é realmente linda a noite, não consigo explicar o quanto amo o meu reino.


Pensei que já estava melhorando quando sinto outra batida reverberar em mim. Dessa vez foi tão forte que preciso me apoiar no parapeito da sacada pra não me desequilibrar. Abaixo minha cabeça e tento respirar fundo, minha visão está embaçada, não sinto dor, mas é como se eu não tivesse controle sobre mim, estou sem forças.

Olho para o lado, além da cidade, na direção do deserto e em meio à escuridão, eu a vejo com dificuldade. Uma tempestade de areia. Tão grande que parece uma parede colossal tampando o horizonte. Não tenho certeza do que vejo devido ao meu estado, mas sei que ela esta lá pelo enorme vento que agora me atinge.

Uma tempestade como essa trará grandes consequências à cidade. Preciso avisar alguém pra que alguma medida seja tomada.


Porém o que quero fazer não é o que posso. Não consigo sair do lugar. Não tenho forças pra isso. Só consigo continuar olhando aquela visão ainda que turva sob o meu olhar. E então não vejo mais nada.


A tempestade de ShiakOnde histórias criam vida. Descubra agora