• Prólogo •

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Calei-me diante o mundo durante décadas, sufocado por palavras não ditas, extasiado com ideias nunca executadas, torturado com o falso e único amor que me deram.

No meu momento mais vulnerável, no auge do meu medo, criando pesadelos, fugindo dos meus monstros, me vi como se eu fosse a única pessoa no universo, tão quieto que meus pensamentos ecoavam.

Gostava desse som, do silêncio, sem gritos abafados, sem o som da garrafa de vinho tinto se batendo contra o chão, sem espelhos quebrados.

Nessa quietude, fiz uma cabana com lençóis velhos, suspensos com livros antigos, iluminado com uma pequena lanterna. Ao canto, vi uma caneta e seu tinteiro, com papéis um pouco amassados.

Desembaracei o nó enquanto a caneta dançava, foi a primeira vez que me senti compreendido.

Despejei minha angústia e ódio naquele papel, enquanto minhas lágrimas criava um borrão nas palavras. Folhas e mais folhas, mostrando como a inocência de um ser tão ingênuo poderia ser tomado num piscar de olhos.

Naquele dia, aquele tinteiro, a caneta, o papel, ouviu meu grito silencioso.

Me encontro numa situação parecida de tempos atrás, mas sem ódio, sem medo, mas me sentindo bem.

Meu peito se aquietou e os pensamentos intrusivos se dispersaram enquanto minha alma era lavada com aqueles olhos tão iluminados, um mel tão doce, mas que nunca me enjoaria.

A olhei por alguns segundos e parei, era hipnotizante. 

Não queria me aproximar, mas me aproximei, não queria olhá-la, mas olhei, e apenas estando ao seu lado era como se estivesse naquela antiga cabana de lençóis velhos que um dia chamei de abrigo. Os dois me proporcionavam paz e aconchego.

Como num campo de flores ao entardecer, sua brisa leve me levava aos pensamentos mais loucos que um homem poderia sequer imaginar.

Você era a mais pura poesia, e nem nos mais robustos dicionários, conseguiria achar uma palavra boa o bastante para descrever-lá.

E eu soube, desde a primeira vez que te vi, que corria o risco de te querer.

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