Capítulo I | MENTIROSA

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MENTIROSA

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MENTIROSA. Minha mente vocifera.

Os meus ossos amolecem, mal sustentam o corpo. O cheiro de sangue pinica meu nariz, provocando uma onda nauseante na boca do estômago.

— Está me ouvindo?! — Uma voz me arranca da desolação.

Andrea aponta a faca contra meu rosto, a mesma que utilizou para matar.

Assassina.

Assassina.

Assassina.

— Assassina. — Cuspo as palavras em voz alta pela primeira vez.

Você a matou. Penso.

Andrea estreita os olhos, olhos azuis que uma vez tanto admirei, mas agora provoca arrepios pela espinha.

— Não aja como se fosse inocente. Lilian está morta e você nem cogitou ligar para polícia.

Recuo.

Há chamas no meu coração após ser apunhalado por suas palavras frias.

— Repita a história, não pode haver brechas. — Andrea rompe o silêncio.

Uma nuvem escura esfumaça a mente, mas minha boca jorra as palavras livremente.

— Bebi muito. Fui ao banheiro, no andar de cima, então ouvi um grito. Com medo, retornei à festa.

Seus lábios vermelhos se erguem em um sorriso.

— As câmeras do andar de baixo registram o momento que você foi para o andar superior.

— Mas eu não voltei. — Argumento.

— Sim, você voltou. A gente se encontrou e ficamos a noite inteira dançando.

MENTIROSA.

— E o corpo?

— Não se preocupe com isso. Apareça amanhã na escola, ainda há alguns pontos soltos que precisam ser alinhados.

Olho para o cadáver. As lembranças me atingem, me sufocam. Me esfolam.

****

Assim que estacionamos em frente à minha casa, Andrea tira a mão do volante e finca as unhas vermelhas no meu braço.

— Essa noite nos conectará para sempre. Estará marcada em nossas almas. Não se esqueça disso: se eu cair, você também cairá.

Absorvo as palavras, permito que elas adentrem meus ossos.

Andrea amaldiçoou meus dias na terra, me condenando a uma vida de arrependimentos e segredos.

****

Entro na banheira, a água tira o suor e a maquiagem acumulados na pele.

À medida que a água esfria, um vazio se apossa do meu corpo.

Não sinto o frescor e a leveza de uma pele limpa. A sujeira e a podridão haviam adentrado a carne, manchando a alma.

Ainda sinto o cheiro de sangue.

Ainda sinto o cheiro de morte.

Uma luz pálida rola pela janela, reluzindo na lâmina de barbear.

ASSASSINA.

Fecho os olhos com força, tentando empurrar as memórias para longe; mas elas parecem animais famintos pela minha dor.

Em um súbito desespero, deslizo a lâmina afiada na pele macia entre as coxas, a água fica escarlate.

Mais sangue.

Vomito.


Essa noite fria de dezembro foi minha morte,

Meu pesadelo,

Meu fim,

E o início das incontáveis mentiras de Andrea. 

AS MENTIRAS DE ANDREAOnde histórias criam vida. Descubra agora