Uma pessoa passa em média doze anos de sua vida aprendendo coisas básicas para uma boa formação acadêmica. Matemática, língua materna, ciências. Enfim, coisas úteis. O problema surge quando alguém acredita fielmente nessa narrativa, quando acreditam que realmente vão aprender matérias específicas passando horas numa sala dominada por sede de poder e ilusões estruturais. Eu passei doze anos nesse ambiente, mas feliz ou infelizmente isso chegou ao fim hoje, no dia da minha formatura do último ano escolar, num domingo. Não posso falar que não tive fortes emoções neste período de tempo, claro que tive, mas tudo chegou ao fim e tenho que encarar.
Minha vida em geral sempre foi repleta de questionamentos, nem sempre tão profundos assim, mas fortes o suficiente para me levar a lugares que nunca imaginei que estaria. Dois desses lugares me marcaram profundamente: o primeiro seria a solidão, o sentir-se só. O segundo já é mais palpável, traduzido na biblioteca que costumo frequentar. Acho engraçado o fato de estar nestes dois lugares agora logo depois de ter vivido um momento que deveria ser especial para mim. Mas não posso mentir dizendo que gostaria de passar mais um ano da minha vida cercado por hormônios à flor da pele e desprezo nos corredores. Eu estou aliviado, na verdade. Finalmente cheguei no ponto final. Mesmo não sabendo onde ir daqui em diante.
Para falar a verdade, me sinto perdido e vazio por dentro. Perceber que tudo pode acabar num piscar de olhos depois de tanto tempo de dedicação é desesperador e te faz perder seu rumo, principalmente para mim que nunca tive um caminho próprio. A boa notícia é que, apesar de tudo, a biblioteca fecha somente às 12h, então eu ainda tenho tempo antes da virada da noite para a madrugada. A formatura ainda está acontecendo, mas a parte da cerimônia já acabou, então aproveitei para me despedir daquele lugar, dar uma última olhada, e sair por aí. Por que eu não fiquei? Por que não fiz um discurso breve e emocionante? Por que não chorei? Por que não? Eu não sei. Já passou. A paralisia que o medo nos traz pode ser reconfortante às vezes, mesmo sendo torturante. Eu passei minha vida toda tentando de alguma forma me aproximar de alguém, mas no fim nunca consegui de fato me sentir confortável nesse tipo de situação. Todas as minhas chances de acabar com a solidão foram embora hoje, e eu não sei o que fazer. Eu estou apenas aqui, do lado de fora da principal biblioteca da cidade, esperando que algo aconteça.
Seu jardim é grande, com um bom corredor de arbustos indicando a porta de entrada iluminada por luzes amarelas fortes. A estrutura do lugar é antiga, mas bem cuidada. Venho a este lugar desde criança, quando costumava dar voltas pelo seu majestoso e sombrio jardim, então nada é novo para mim. A quanto tempo estou aqui fora? Eu deveria entrar antes que fechem definitivamente. Assim o faço. Pondo os pés na entrada, olho para a direita e comprimento Olga, a bibliotecária. Ela sempre me dá um belo sorriso junto de um boa noite calmo, pergunta como estou e diz algo como "fique a vontade, garoto", e assim o faço de forma tão automática que nem mesmo reparo. O interior deste lugar sempre me fascina com essas luzes baixas, mas boas o suficiente para uma leitura. A organização das velhas estantes de madeira, por categoria e ordem alfabética, me dão uma sensação de ordem sentida somente aqui.
Olho ao redor, dou alguns passos para frente, em análise, examinando cada detalhe. Não sei muito bem o que estou procurando, então começo a andar livremente pelos corredores a espera de algo me chamar à atenção, mesmo que seja um pouco entediante. Vou até o final do corredor principal, viro à esquerda e paraliso, tentando encontrar algo diferente. Instantes depois, bem no fim do corredor eu vejo, me fazendo caminhar enquanto olho atentamente o último conjunto de livros. Sim, algo por lá me chamou a atenção! Chegando mais perto, me agacho próximo ao chão, tendo uma visão mais ampla das obras ali guardadas. Examino novamente uma a uma, até que meus olhos brilharam ao notar uma espécie diferente de aura ao redor de um dos livros. Não esperei nada e o peguei em minhas mãos, com uma certa ansiedade envolvida em meu ato, confesso. É um livro relativamente grande, capa dura na cor de vinho, mais pesado que o normal. Abro ele na primeira página, que está em branco. Sem surpresas, isso é completamente comum. Segunda página, branco. Terceira página... branco? Ok, isso é incomum. Perfeito, vamos à diante! Quarta página, nada. Quinta página, sim, algo escrito! Uma única palavra no centro da folha.
"Olá!"
Certo. É um começo diferente do comum, mas é um começo. Isso pode me animar. Mas, por mais que eu não queira, não consigo parar de pensar no que pode estar acontecendo na minha antiga escola enquanto estou distante dela. Será que a festa já acabou e todos saíram para uma segunda rodada? Ou talvez ainda estejam lá tirando fotos e gritando feito loucos uns com os outros com copos enormes e cheios de bebida nas mãos. Me pergunto se alguém está vivendo uma situação parecida com a minha agora, deplorável e solitária, tentando fugir desesperadamente de seus próprios pensamentos. Enfim, próxima página.
"A solidão se fortifica nos pensamentos que te distanciam da realidade, ficando mais e mais longe a cada passo."
Hum? Um livro sobre lições de moral? Quem teve essa ideia? Fecho o livro e leio cada canto de sua capa em busca de algum norte, mas o título dourado do livro é a única coisa especificada. "Exilio". Sem nomes de pessoas, datas, frases ou explicações, apenas uma palavra. De certa forma faz sentido com o que acabei de ler, vou dar uma chance para este livro coaching, talvez com isso eu me anime. Pensando nisso me levanto e caminho de volta até a entrada da biblioteca, estendo o livro para Olga, em sinal de que encontrei o que procurava, e ela rapidamente anotou meus dados num computador antigo. Confiro as horas e vejo que faltam apenas vinte minutos para o fechamento do lugar. Quando ela me entrega o livro, me despeço gentilmente e me retiro, dou uma boa olhada ao redor e penso em qual será meu próximo destino. A rua está praticamente vazia, com apenas alguns comerciantes fechando suas lojas, mas considerando que são quase meia noite, acho tarde. Por mais que eu não esteja com muita fome, talvez eu devesse comer alguma coisa antes de voltar para casa.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Exílio
General Fiction"[...]O remédio para o tédio é a liberdade. Liberte-se de si mesmo e se sentirá completo. Foi um prazer conhecê-lo, garoto, nos veremos em breve.- E novamente na escuridão, o ser celestial se foi, me deixando sozinho naquela rua deserta, úmida, e fr...