02 - Crueldade

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       Abro os olhos e fito o teto de madeira pensando logo no que farei durante o dia. Depois do jantar mamãe me disse que queria fazer uma torta de maçã pela manhã, então com certeza eu teria que ir apanha-las.
Esfrego minhas mãos nos meus olhos antes de olhar para a porta do meu quarto e tomar um tremendo susto ao ver Lyli, parada me olhando.
Solto um grunhido irritado e ela permanece sem expressão.

– O que quer Lyli? – Pergunto baixo, só Deus e eu sabemos o que me acontece se eu ao menos levantar um pouco que seja a voz para ela.
– Mamãe mandou você ir colher maçãs! – Diz-me apontando o dedo. – Se demorar a ir, terei que chamar o papai. – Então ela cruza os braços. Arregalo os olhos com a sua última frase e subitamente levanto-me começando a vestir minha roupa, o que faz Lyli se afastar.
– Eu já estou indo! – Aviso e em seguida escuto a porta a se fechar.

Arrumo meus cabelos assim que percebo que ele ficou bagunçado ainda mais após meus movimentos e marcho até a porta. Sem falar nada apenas pego meu chapéu e a cesta, caminhando em passos rápidos para fora da casa.

Minhas botas completamente gastas se molham graças ao orvalho das pequenas plantas que enfeitam todo esse lugar. Aspiro o ar da manhã antes de voltar a caminhar até a macieira mais próxima, o que não é nada perto. Caminho em passos lentos, a verdade é que eu odiava a ideia de voltar para casa. Aquilo era tudo, menos minha casa.

Cantarolo uma música qualquer baixinho enquanto observo meus pés passarem entre a grama verdinha, levanto o olhar procurando alguma sombra próxima, vejo a grande árvore e logo constato que estou próxima da macieira. Praticamente corro até a árvore e me deleito sob sua sombra generosa. Ponho a cesta ao meu lado e faço uma careta assim que sinto meu estômago roncar, não comia a alguns bons dias. Olho para meu lado esquerdo e vejo a macieira ao longe.

Ai ai ai

Já estava cansada só de olhar a distância que faltava. Levanto-me praticamente arrastando meu próprio corpo e volto a caminhar.

Meu pai podava a árvore desde que me lembro então ela era baixa o suficiente para me permitir alcançar as maçãs, enchi a cesta já que não sabia a quantidade que minha mãe queria, e também não gostaria de voltar aqui de novo tão cedo.
Sem evitar eu imagino o cheiro da torta de maçã recém saída do forno, mas que infelizmente eu só iria saborear o cheiro.

Abano a cabeça espantando os pensamentos e pego a cesta no chão, voltando a caminhar para casa.

As gargalhadas já são ouvidas assim que passo pelo pequeno campo de legumes. Olho para o céu e penso se irei conseguir fugir por 5 minutos para conseguir tomar um banho, o sol estava com certeza mais quente que ontem.

Me aproximo do batente da porta e adentro a casa, escutando a voz de papai, mamãe e de Lyli. Paro a porta da cozinha ao ver o que estão fazendo. Lyli está com um avental, mamãe havia costurado especialmente para ela. Papai fazia cócegas nela e a mãe ria-se junto, sinto uma pontada de inveja, nunca tive qualquer interação como essa vinda dos meus pais, agora com 17 anos já não doía tanto quanto antes. Hoje já entendo que não sou a filha que eles queriam, mas Lyli sim.

– Finalmente! Que demora! – Minha mãe exclama e só então percebo seu olhar em mim, as risadas já não existem mais e sim carrancas de ódio direcionadas a mim. Ela se aproxima em passos largos e toma a cesta das minhas mãos com brutalidade fazendo algumas maçãs caírem.
– Aryn, temos uma surpresa para seu aniversário de 18 anos. – Escuto a voz do meu pai e em seguida seus passos até mim. Permaneço sem reação, eles lembram do meu aniversário?.
– Mas só saberá no dia. – Ele força um sorriso e eu permaneço calada. Olho para mamãe que me repreende com o olhar.
– Sim, obrigada. – Prontamente agradeço sentindo uma ansiedade absurda para o dia chegar o mais rápido possível.

Após o curto diálogo com meu pai, fui me banhar no lago, super feliz. Será que finalmente eles irão me considerar parte da família? Sorrio com a ideia.

Rodopio na água por mais um tempo e com um sorriso grande no rosto eu volto para casa.
Mas assim que entro no meu quarto, o sorriso se desfaz: Lyli estava em pé ao lado da janela como se já estivesse me esperando, com o vaso que nossa tia trouxe de presente para minha mãe de Paris.

– O que você está fazendo com isso? Lyli? – Indago, engolindo em seco.
– O que eu vou fazer... – Ela fala em tom ameaçador. E eu logo me toco que ela ficou com ciúmes do nosso pai para comigo, por conta do meu aniversário.
Logo após sua frase o som do vaso se estraçalhando no chão é ouvido e eu fico sem reação, meu Deus!
– Mamãe! – Ela grita, saindo do quarto correndo chamando nossa mãe. Eu serei castigada...

Abaixo-me sob o chão e tento juntar os cacos do vaso de cerâmica caríssimo, alguns até me rendem uns cortes, mas eu estava desesperada demais para me importar.

– Caralho! Que porra você fez sua maldita! – Minha mãe grita e em seguida sinto a dor no meu couro cabeludo, pela força deduzo ser meu pai. Com força ele esfrega meu rosto nos estilhaços e meu grito preenche o quarto, sinto o sangue escorrer do meu rosto.

Murros e socos me é deferido por todo meu corpo e mal consigo assimilar ao mesmo tempo que escuto gralhadas as gargalhadas de Lyli.

– Você sabe que esse vaso foi uma fortuna e era importante para sua mãe! Não cansa de estragar nossa vida?! – Ele grita e eu só sei chorar. – Terá que aprender na dor! – Papai me solta e sai do quarto e eu sei que ele está indo pegar o chicote.
– Já sabe o que fazer. – Minha mãe diz antes de sair puxando a Lyli.

Tento me levantar o mais depressa possível antes que ele volte, tento tirar minhas roupas ignorando meu corpo recém machucado. O chicote tinha uma pequena lâmina na ponta, além de cortar minha pele, também cortava minhas roupas.

Trêmula eu tento desfazer o nó do velho vestido e já escuto os passos pesados de papai se aproximando. Consigo me livrar da roupa assim que ele chega ao quarto. Tremendo eu me afasto mas ele logo me apanha novamente pelos cabelos. Me jogando de volta ao chão eu gemo de dor.

– Vire-se! – Manda. Deito com o peito para baixo no chão, sinto a primeira chicotada de muitas.
– Será 70 desta vez. Conte! – Grita. E consigo sentir o vento do chicote sendo levantado antes de bater na minha pele.
– U-um.




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