Fim

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Era uma manhã de quarta feira como qualquer outra.

Normal.

Eduardo se preparava para sair, sua família havia marcado um rodízio de pizza em comemoração ao seu aniversário. Enquanto se perguntava se havia pego as chaves de casa quatro batidas na porta são ouvidas.
Ao abrir Eduardo se depara com uma mulher um pouco mais baixa que ele, cabelo crespo armado e bem cuidado, um piercing no septo, e roupas próximas do estilo gótico, camiseta e jeans pretos, coturno até o meio da panturrilha e pelo menos umas três correntes só no jeans.

O que mais chamou atenção dele foi a pele, que deveria ser negra, mas estava estranhamente pálida.

-Eduardo Pena, né?

Sua voz era como um pássaro cantando, melodiosa mas firme, cada nota usada na composição das palavras era perfeitamente afinada.

-Uh, sim, sou eu, posso ajudar?

-Sim, preciso tratar de assuntos com você, posso entrar?

Normalmente ele não permitiria, principalmente na atual situação, mas algo nela o fez dizer um "sim" confuso.

-Bom, erhm....eu preciso de algo de você, na verdade de você em si.

-Como assim? Você precisa de, sei lá, uma vela preta?

Entre risos ela responde em um tom suave.

-Sempre adorei suas piadas, mas não. Eu vim pra te acompanhar.

-Acompanhar? Até a pizzaria? Isso é uma pegadinha da minha irmã?

Ela solta um suspiro profundo e é nítido uma grande tristeza na sua expressão.
Ela apoia a mão no braço do rapaz e encara o fundo de seus olhos.

-Eduardo Da Silva Pena, eu vim por você.

-Como...mas...

A confusão misturada com certo divertimento no rosto do rapaz dá lugar á um olhar de espanto. Ele dá um tapa na mão da mulher e cai sentado no braço do sofá.

-Eu sinto muito, Eduardo.

Ele olha para ela mas não a ouve, na verdade ele não escuta mais nada, os pássaros, a televisão e até o vento estão mudos, como que em luto antecipado.

-Não, eu...eu...é meu aniversário....como que... você é ela?

-Sim.

Uma lágrima desce bela bochecha pálida do rapaz.

-Mas eu....

-Hey, tá tudo bem, respira, vai no seu tempo.

Ele encara o vazio por longos minutos até voltar a si o suficiente para perguntar.

-Como que eu..?

-Daqui a 20 segundos, nesse sofá.

Ele se levanta rapidamente, se afastando do sofá.

-Não não, eu acabei de fazer 30, como assim?

-Escuta, tudo bem, só respira ok? Você vai ficar bem.

Ele se apoia em uma das cadeiras de madeira por mais algum tempo.

-Eu posso....só....ligar pra minha mãe?

Ela solta o ar e um leve sorriso se forma no canto de seus lábios.

-Claro, e não precisa se apressar ok?

Ele assente com a cabeça e pega o aparelho com as mãos trêmulas.
Os cliques na tela são como horas para ele.
A voz da mãe o tira do breve torpor.

-Filho? Que foi? Conseguiu chamar o carro?

Silêncio.

-Amor? Tá tudo bem?

-Sim, sim, tô bem, eu...queria te pedir uma coisa mãe.

-Ô meu bem, claro, o que?

-Você pode vir pra cá?

-Quer que eu te busque?

-Não é só....sei lá, tô precisando de um abraço seu.

-Meu amor, claro, já tô indo tá?

-Ah e, mãe, mais uma coisa.

-Diga.

-Eu te amo tá? Muito mesmo.

-Eu também te amo meu amor, já já tô aí.

-Ok.

Seus lábios ensaiam um "adeus", mas essas palavras nunca serão ouvidas, ele deixa o celular na mesa ainda com a tela ligada e encara a mulher.

-Você pode tomar um copo de água se quiser também. Ajuda.

Ele permanece olhando fixamente para ela.

-É difícil?

-Frequentemente. Pode não parecer, mas eu morro um pouquinho sempre que eu levo um de vocês.

Ele solta um riso nervoso.

-A morte morre?

Ela ri.

-Pelo menos 100 vezes por dia.

Ele lentamente senta no braço sofá, respira fundo uma, duas, três vezes. Quando se sente pronto ele a encara novamente.

-Posso te pedir mais uma coisa?

-Claro.

Ele abre timidamente os braços com lágrimas nos olhos.

Ela por sua vez o acolhe em seus braços, o gesto, quase maternal, faz a ceifadora derramar uma lágrima, que encontra uma gota solitária do ceifado, elas se misturam em uma dança fúnebre e prosseguem para seu destino, ao molhar o azulejo marrom da sala de estar, o único ser vivo na casa é a Mãe.

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