Capítulo 1 - Mateus

105 2 0
                                    

Para alguns, a arrogância é considerada um pecado, mas para mim, assim como a ganância, ela me fortalece. Crescer em meio ao dinheiro e ao poder exige uma armadura para permanecer de pé. Sem essas 'falhas', poderia ter sido derrotado no primeiro embate.

As pessoas podem pensar que, por ser filho de um dos cirurgiões mais importantes do país, tenho apenas privilégios, mas ninguém fala sobre a pressão de ser cobrado desde a infância graças a esse status. Quando minha mãe partiu, há exatos vinte e nove anos, ela não se preocupou com o meu bem-estar. Em como uma criança de cinco anos ficaria sem a presença materna. Embora não tenham me comunicado diretamente o motivo do divórcio, eu sabia perfeitamente a razão.

Conforme os anos passaram, percebi todos os prós e contras de ser filho de alguém como meu pai. Estudei nos melhores colégios e recebi a melhor educação, porém, quando as pessoas não se aproximavam de mim por interesse, elas me ignoravam pelo simples fato de eu ser um Mariani. Por isso, na adolescência, compreendi que precisava ocultar minhas dores e preocupações. Se continuasse permitindo que indivíduos fracos e desprivilegiados me atingissem, não seria digno de seguir os passos de meu pai.

Eu sabia que, se considerasse outra profissão, estaria entrando em uma grande guerra com meu pai. Então, de certa forma, comecei a me preparar mentalmente para seguir a medicina. Por mais estranho que possa parecer, acabei me identificando e gostando dessa área. Hoje, aos trinta e quatro anos, sou ortopedista e sigo cuidando da minha imagem, para em um futuro não muito distante, assumir a diretoria do hospital Mariani.

─ Por que diabos você me chamou para beber, quando parece que estou há horas falando com uma parede? ─ Pedro bebe um gole generoso de sua bebida. ─ Aconteceu alguma coisa para você está tão disperso, Mateus?

─ Só estava pensando em algumas coisas, não precisa exagerar.

─ Mateus, infelizmente eu o conheço há quase trinta anos, não tente me enganar. É alguma coisa com o hospital? Seu primo voltou a incomodar.

─ Ricardo sempre incomoda, afinal de contas, ele é a maldita pedra no meu sapato.

Ricardo é o tipo de pessoa que não mede esforços para foder com alguém, desde que ele consiga alcançar o seu objetivo. Apesar de termos a mesma idade, nunca nos demos bem, afinal, esse idiota sempre teve inveja de mim. Lembro que quando estávamos no mesmo colégio, todas as garotas com quem eu tinha algum envolvimento, assim que terminávamos, eles apareciam juntos. Costumava dizer que ele adorava sentir a minha saliva, já que com tantas opções, só queria aquelas que passaram por minhas mãos.

Dito isso, ele também se formou em medicina, mesmo seu pai sendo da área do direito. Não teria nenhum problema com o Ricardo se me deixasse em paz, como se já não bastasse tudo o que aconteceu na adolescência, esse maldito também está de olho no comando do hospital.

Acredito que uma das suas maiores funções na terra seja atrapalhar a minha vida, Ricardo sempre tentou dar uma de bom moço principalmente na frente do meu pai. Sempre soube que esse babaca era um filho da puta, mas o meu pai não fazia ideia, então as comparações entre nós dois sempre existiam, apesar de ser melhor que ele em tudo.

─ Ele ainda não desistiu da ideia de tomar no seu lugar?

─ Assim como você convive comigo há quase trinta anos, também o conhece o suficiente para saber que Ricardo não vai desistir. De verdade, espero que meu pai não invente de dar a ele o que é meu por direito.

─ Quando o seu pai pretende se aposentar?

─ Não faço a menor ideia. Ele sempre disse que faria isso quando encontrasse uma boa companheira, para que juntos viajassem o mundo sem se preocupar com responsabilidades. No entanto, todos os seus casamentos fracassaram, não sei por que insiste nessa palhaçada de amor.

─ Não seja tão amargurado, seu pai está certo em procurar sua outra metade, ninguém é feliz sozinho.

─ Agora você está falando besteira, é totalmente possível ser feliz sozinho. Olhe só para mim, nunca estive em um relacionamento e não posso dizer que sou infeliz.

─ Mateus, toda semana você está com uma mulher diferente, então não dá para dizer que é uma pessoa sozinha.

─ Você parece estar me julgando, quando faz a mesma coisa, Pedro. Não venha dar uma de bom moço, sei que todos os dias você tem uma mulher nova em sua cama, ou pensa que engana alguém, senhor promotor?

Ele me encara com a testa franzida, segundos antes de gargalhar na minha cara.

Pedro e eu somos bem parecidos no quesito relacionamento, a única diferença entre nós dois, é que esse idiota já esteve em um relacionamento, até ficou noivo e semanas antes do casamento sua noiva fugiu com outro homem.

Para mim, amor nada mais é do que uma fraqueza. Pode trazer felicidade, mas a forma como machuca, pode levar alguém a morte.

Encerramos esse assunto e olho em volta, procurando alguém para passar a noite. Depois de enfrentar um plantão de mais de doze horas, preciso liberar toda endorfina acumulada em meu corpo e nada melhor do que uma boa noite de sexo.

(...)


─ Quando você me dará netos, Mateus? ─ Se eu soubesse que esse seria o assunto do jantar, não teria me dado o trabalho de encontrar com o meu pai. ─ Estou ficando velho, preciso ter certeza de que você terá uma família.

─ Pai, quando me passará o comando do hospital?

─ Quando eu achar que chegou o momento, apesar de você ter trinta e quatro anos, não acho que seja apropriado ainda.

─ Pronto, então utilize essa mesma resposta para a pergunta que me fez há alguns segundos. ─ Levo um pouco de comida a boca, sendo fuzilado pelo seu olhar.

─ Para você, tudo que importa é a diretoria do hospital? E a minha felicidade em ter um neto, não vale de nada, filho?

─ Pai, no atual momento da minha vida, um filho seria um completo desastre, pois me faria recalcular todas as rotas que preestabeleci. Quando me sentir confortável para entrar em um relacionamento e ter filhos, o senhor será o primeiro a saber, não se preocupe.

Pela enorme janela, avisto uma mulher loira passando sorridente enquanto fala ao telefone. Ela usa uma camisa com a logo do bar que costumo frequentar, mas não lembro de tê-la visto, alguém com uma aparência tão angelical não passaria despercebido por mim.

─ Você está me escutando, filho?

─ Não, repete por favor.

─ Pela cara, aposto que estava vendo algum rabo de saia. Você não vai mudar nunca, Mateus? ─ Encaro-o com um sorriso de canto, o velho me conhece há trinta e quatro anos, não sei porque o espanto. ─ Você é um ortopedista renomado, comporte-se.

─ Pai, o senhor ou qualquer outra pessoa tem algo de ruim para falar do meu lado profissional? ─ Nega com a cabeça. ─ Então, o que faço da minha vida pessoal, nada tem a ver com isso. Eu gosto de mulheres, qual o problema? Além disso, o senhor não é diferente. Se me lembro bem, esse é seu sexto casamento, não?

─ As coisas são diferentes, Mateus.

─ Sim, claro que são. Enquanto o senhor entra em um relacionamento sem nem conhecer direito a sua parceira, eu prefiro aproveitar o melhor da solteirice. Sexo sem compromisso!

Motivos para (não) te amar - DEGUSTAÇÃOOnde histórias criam vida. Descubra agora