Capítulo 8 - Promessas Difíceis

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[anteriormente]

— Eric, só quem joga a maldição, ou outro sussurrador, é que tem o poder de retirar a maldição. Ele queria ter a certeza de que isso não seria possível.

Sinto um buraco no estômago e a respiração falha. A cabeça lateja. Os gritos me dizem para matar, mas não sei o quê. A única certeza de que tenho é que quero... que quero matar.

[Narrado por Ben]

Eric sai da sala onde estávamos antes de todo mundo. Os quatro soldados de sua guarda pessoal o seguem, mas ele anda mais depressa que eles, como se não quisesse a presença deles, como se quisesse sumir e evaporar. Penso no que minha avó disse e faço uma anotação na mente de falar com ela o mais rápido possível sobre o sussurrador e sobre alguma maneira de ajudar Eric.

Vejo Enrique Sierra e Tamara conversando, a Rainha observa a saída de Eric e eu mesmo não sei como reagir. Eu sempre passei por fases em que tudo o que eu mais queria era desaparecer e, mais que tudo, ficar longe de tudo e de todos, e por isso meu primeiro instinto é não seguir Eric. Mas, depois de tanto tempo, já sei que naqueles dias em que eu sumia e me afastava, o que eu realmente queria era que alguém se importasse comigo o suficiente para estar comigo. Me afastei sempre de todo mundo para manter uma imagem de que eu não precisava de ninguém, e funcionou por muito tempo, mas isso não era verdade.

Saio da sala e vou na direção já conhecida muito bem por mim, mas não me apresso. Por mais que eu queira ficar junto de Eric e mentir para ele que tudo vai ficar bem, como muitos sempre mentem em situações sobre as quais não entendem, dou passos lentos enquanto atravesso o corredor que dá acesso à torre leste e subo as escadas em espiral pensando num jeito de ajudar Eric de alguma forma. Quando chego no topo, o vejo de pé, de costas, olhando para o mar, não digo nada por um instante e apenas o observo, respeitando o máximo que posso seu espaço.

Em certo momento, ele percebe minha aproximação e se vira.

— Não queria te incomodar. — digo, e vejo seus olhos brilhando por conta das lágrimas. — Ei...

Me aproximo, mas ele se vira.

— As vozes estão mais claras agora — ele diz, enquanto fico do seu lado, também virado para o mar. — Acho que a força que eu estava fazendo em negação se extinguiu.

— O que dizem?

— Algo sobre eu me tornar uma sombra de mim mesmo, sobre eu destruir meu próprio reino, sobre pessoas morrendo.

Demoro a dizer uma coisa, e sei que isso é pior para Eric do que se eu tivesse feito alguma piada boba.

— Isso não vai acontecer, Eric. — Digo.

— Como você sabe disso?

— Porque estou planejando não deixar isso acontecer.

Ele dá um sorriso sem graça e mais uma lágrima percorre seu rosto. Limpo-a com o dedo e ele apoia o rosto em minha mão.

— Desculp...

— Ei.

Eric chora, e eu o abraço. Tudo vai ficar bem, penso em dizer, mas não sou essa pessoa. Mesmo que eu saiba que farei de tudo para que as coisas realmente fiquem bem, não acho justo dar uma esperança que não posso sustentar, infelizmente. Nem tudo na vida fica bem, e o problema não é esse. O problema é não saber deixar a parte ruim para trás e buscar as partes boas.

— Vou estar aqui com você. — digo, tendo a certeza de que isso eu posso cumprir..

Ele me aperta mais.

— Obrigado, Ben.

***

Duas noites depois do ataque na Coroação, acordo com pingos violentos de chuva batendo nas janelas do quarto onde durmo. O céu brilha com relâmpagos de vez em quando e trovões estalam sobre o castelo de Aurora. Me levanto depressa e olho pela janela a tempestade que cai do lado de fora e um sentimento ruim me diz que algo está errado.

Abro a porta do quarto, não espero que Kord me acompanhe, mas ele vem atrás de mim. Na porta do quarto do príncipe, estão dois guardas.

— Onde ele está?

— Sua Alteza saiu.

Desço as escadas correndo, chegando ao andar dos salões e saio em uma das saídas que dão para os jardins.

No centro do jardim, próximo à estufa de rosas da Rainha, Eric está de pé, no meio da chuva.

— Eric — chamo, e sinto frio quando as muitas gotas de água começam a me molhar. Ele não reage. Chamo seu nome novamente enquanto corro na direção do príncipe, em meio ao vento e à chuva.

Me aproximo dele e sei que estou enfraquecendo seus poderes. Toco em seu ombro.

— Eric...

Ele se vira para mim, como se acordasse de um sono pesado.

— Ben?

Eric está encharcado, mas a chuva agora é fina. Seu olhar parece perdido.

— O que está acontecendo? — Ele pergunta.

— Você saiu do seu quarto e...

Ele balança a cabeça.

— Não, eu... ah... — ele tenta negar o inegável, até que olha em meu rosto e seu olhar se entristece. — Está acontecendo, não é?

— Não se preocupe. — digo, puxando o príncipe para perto de mim. Eu o abraço.

— Ben — ele diz com a cabeça enfiada no meu ombro.

— Oi.

— Não me deixe fazer nada disso...

— O quê?

— Quero que você me prometa que vai me impedir de fazer qualquer coisa ruim.

Meu coração parece cair em um buraco profundo. Me afasto por um instante, retiro a correntinha que meu pai me deu quando me disse para eu me esconder enquanto a Vila Vermelha era invadida.

— Toma — a coloco em seu pescoço — para te proteger.

— Ben... eu.

— Nada de ruim vai acontecer com você.

— Você não sabe disso. Por favor. Prometa que vai me impedir de me transformar em alguém que eu não sou...

— Não vou...

— Ben, por favor...

— Eu prometo — digo, com dificuldade. E preciso descobrir como cumprir essa promessa. 

***

Um capítulo menorzinho pra gente começar a semana bem rsrsrs!

Obrigado sempre pelas leituras, os favoritos e, principalmente, os comentários. Amo ler os surtos/opiniões/ideias de vcs <3

A Profecia do Plebeu - Livro 2 - A Canção do ReiOnde histórias criam vida. Descubra agora