Por alguma razão, desejei que ele desaparecesse dos meus pensamentos, ao mesmo tempo em que sentia meu coração doer ao pensar na possibilidade de passar ao seu lado numa rua qualquer e nem nos olharmos, como se fôssemos estranhos.
Durante a escola, minha cabeça só funcionava se eu o visse chegar cedo, como sempre, com a mochila preta nas costas, cabelo caído pra frente acima dos olhos e com o seu sorriso radiante. Eu o tinha como o único motivo para frequentar a escola todos os dias, até mesmo doente, pois algumas vezes a minha expectativa dizia que eu podia estar diante de seus olhos por alguns minutos e uma pergunta simples causaria um alvoroço no meu coração.
Meu sentimento doce e exagerado me permitia imaginar situações que me deixavam confortável, apesar de não ser normal esperar por algo que ele nunca irá retribuir, pois nunca teria a coragem de lhe confessar. Porém, as minhas expectativas só falaram mais alto quando finalmente, em um dia nublado e frio, ele parou do meu lado, com as mãos no bolso e o rosto sereno. Seus olhos castanhos de uma intensidade inexplicável estavam em mim, pela primeira vez. E a pergunta simples alavancou tanto as batidas do meu coração, que eu não fui capaz de lhe responder.
"Você está bem?"
Talvez ter ficado em silêncio tenha sido bom, já que ele se aproximou um pouco mais e inclinou o corpo para olhar com mais precisão. Sua altura não era compatível com a minha e, obviamente, nossa coragem também não.
"Está com os olhos inchados", ele pronunciou. "Estava chorando?"
Aquela frase me pegou de surpresa. Nunca tínhamos nos cumprimentado, falado qualquer coisa um para o outro, mesmo que tenhamos sido colegas de turma por oito anos seguidos. E agora ele me pergunta uma coisa que seria óbvia para todos os outros, e talvez seja pra ele também, mas que na minha cabeça é só uma possível desculpa para falar comigo. Isso me deixou em completo desespero.
Ele piscou algumas vezes, antes de jogar a sua atenção para outro lugar e voltar para a sua postura. Engoliu seco e colocou as mãos nos bolsos novamente, me pedindo para entrar por causa do frio, já que não estava de casaco. Apenas balancei a cabeça afirmando e segui com passos rápidos logo atrás dele.
Sorri de forma descontrolada, admirando seus ombros largos, me perguntando quando seria a sua próxima pergunta e se eu teria capacidade de lhe responder para que pudesse ouvir minha voz pelo menos uma vez.
Foi a primeira vez que guardei um momento de forma tão preciosa na minha memória. Talvez eu não queria perder a sensação de um desejo realizado, mas acabei por me deixar levar por emoções ainda não conhecidas, que só ele me fazia sentir. E por isso, preferi deixar partir a única pessoa que seria a melhor escolha da minha vida.
Agora, na faculdade, meus olhos se fixam a outras pessoas quando o vejo subir pela escada principal, meu coração não acelera quando o vejo sorrir, meu rosto não esquenta quando o vejo jogar futebol ou basquete. Porém, sinto um vazio e sei que é por me culpar de tê-lo perdido. Sei que é por me culpar em ter desejado que ele desaparecesse dos meus pensamentos.
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Mais Uma Vez: eu e meus textos
AlteleEsses são os pensamentos que rondam a minha cabeça em qualquer hora do dia. Talvez sejam românticos demais, melancólicos demais, dramáticos demais, porém, são verdadeiros.