Fase 4| A Neta e a Avó

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Faliza e Yritrius deram-se por si estendidos num grande relvado colorido. Salgueiros místicos de folhas de tons desviantes das tonalidades habituais das clorofilas e dos carotenóides balançavam os ramos flexíveis, deixando-se levar pela cadência harmoniosa da Natureza. Pequenos pontos bioluminescentes esvoaçavam, pousando ocasionalmente numa planta verde-água ou numa flor fúcsia.

A cientista estava estupefacta com a beleza natural daquele Universo. A tranquilidade, a paz e a plenitude que ali se viviam suplantavam o temor causado pelo silêncio. A Natureza mitológica impregnada em todos os cantos dava as boas-vindas aos viajantes interdimensionais, esboçando um sorriso alegre. Os pássaros, perdendo a vergonha, começaram a entoar uma canção tão melodiosa que quaisquer ouvidos a podiam ouvir eternamente. Às aves, juntaram-se as rãs de um charco, tenores que acompanhavam os sopranos dos seres que, livres, cruzavam o céu azul-petróleo interrompido por milhares de pontos cósmicos cintilantes. Para finalizar, uma orquestra de cigarras, atrapalhada com o seu atraso, anunciou a sua chegada com uma canção em tom piano que foi aumentando até ecoar por toda a floresta.

As árvores balançavam as folhas ao som da cantoria. As flores abriam-se perante o concerto, ainda que a luz do Sol, o gatilho para que a maioria das plantas de pétalas coloridas do mundo de Faliza desabrochassem do sono noturno, não se fizesse sentir nem por sombras.

- Que lindo! - Exclamou a cosmóloga, boquiaberta.

Ambiente onírico do mais belo conto de fadas, assim era aquele Universo aos olhos da mulher. Por momentos, aquela paisagem fê-la esquecer-se da sua busca extenuante. Sentia-se preenchida por uma energia inexplicável que adentrava o seu corpo, atribuindo-lhe um propósito esperançoso.

- Não faço a mínima ideia onde estamos. E eu já viajei por tudo quanto era Universo. Não sei se me maravilho ou se me preocupo. - Disse Yritrius.

- "Maravilha" é pouco para descrever este mundo.

Faliza observava atentamente um inseto bioluminescente que entretanto pousara na sua mão. O bicho, muito atarefado, coçava as antenas com as patas dianteiras. Depois de se ajeitar, contemplou atento a cientista que o segurava, com os milhares de omatídeos que refletiam o brilho estelar. Tinha um ar curioso. Girava a cabeça rapidamente, intrigado com a presença da estranha de madeixas lilases, cujo tom se assemelhava à cor de algumas estruturas florais que ali cresciam.

A cientista vivia uma verdadeira utopia, contrariamente a Yritrius. O ser do Universo futurista lutava desesperado contra a bicharada voadora. Limpava aborrecido os óculos, esfregando as lentes freneticamente, com receio da presença de algum mosquito nos vidros que lhe compensavam a baixa visão. Gesticulava enquanto resmungava consigo mesmo. Paraíso para a cosmóloga, inferno para o mutante.

- Há uma coisa que me tem intrigado. - Começou a mulher. - Tanto quanto sei, és um viajante interdimensional, tal como eu. Eu uso o Sperantia para me deslocar no espaço-tempo. Como é que viajas?

- Não interessa. - Respondeu o outro, ainda a afastar os seres alados que pairavam em enxames no ar.

- Recebi indicação da tua existência através de um rapazeco cuja mãe, que era bruxa, te encontrou. O miúdo ficou órfão e eu prometi revisitá-lo. Quando fui vê-lo, encontrei um menino viajante, o Lyoko, que atravessava as dimensões sem qualquer dispositivo. Dizia que seguia a energia para abrir portais. Foi chocante. Nunca pensei que existisse um Universo em que os habitantes conseguissem abrir portais inatamente. É uma capacidade extraordinária! Queria saber mais pormenores, mas não quis perguntar mais nada ao menino. Coitado! Andava sozinho agarrado a uma baleia de peluche à procura da mãe e, pela conversa, o pai estava doente.

- Não me estou a sentir bem... - Interrompeu Yritrius, agarrado à cabeça.

- É aquela enxaqueca habitual, não é? Isso passa. Mas eu queria saber como é que viajas. Tens algum dispositivo ou é inato?

A esperança é a última a morrerOnde histórias criam vida. Descubra agora