— Katherine.
Detestava aglomerações. Todos se empurrando, falando alto e ignorando completamente as pessoas ao redor, como se fossem os únicos. Um zumbido incômodo irritava meus ouvidos, e todos os sons de repente pareciam ser altos de mais.
O saguão principal da galeria era decorado com esculturas, como uma introdução para o que havia dentro das outras salas. Bancos de tampo eram ocupados por artistas amadores que tentavam recriar as obras, enquanto os artistas profissionais, me incluo nessa divisão, estavam competindo entre si, fuzilando-se com os olhares e expressões enojadas enquanto se combatiam em uma batalha silenciosa pela atenção para as próprias obras, onde as principais armas eram a falta de modéstia e a presunção.
– Oh, Kat, querida, vejo que aprendeu o básico sobre pintura, voltou ao jardim de infância? – Tomma Santini, o imigrante italiano, escultor e secretamente pós doutorado em enfurecer todos os artistas que eram patrocinados pela galeria. Era um sujeito mesquinho, relativamente novo, magro, tinha o rosto afilado, o nariz grande e reto, as têmporas contornadas pelas ondulações de seu cabelo castanho claro, dividido exatamente no meio. Ele sempre dava um jeito de se vestir de uma paleta propositadamente monocromática para ser repugnante.
De repente me sentia enojada da cor azul.
– Achei incrível seu trabalho mais recente, fez com massinha de modelar que roubou de alguma criança? – Eu acompanhei seus movimentos pelo canto dos meus olhos e pude ver ele respirar fundo e passar a mão direita no cabelo. – A sra. Bradfort já te deu uma bofetada hoje?
– Você é cruel, querida, mas é dissimulada também. Fala como se todos aqui me odiassem e com você fosse diferente. – Ele tornou a sibilar, ficando a menos de um metro de distância de mim, como se fôssemos algo próximo do que seria considerado amigos, num conforto desconfortável. – Sabe bem que você não é nenhum anjinho.
Eu continuei com meu olhar fixado no movimento de pessoas que entrava e saía da galeria, com uma expressão tediosa e preguiçosa no rosto, expressando minha pouquíssima vontade de estar ali. Um suspiro exasperado saiu dos meus pulmões pelas narinas e senti um lampejo de dor de cabeça. Precisava de café.
– Fique do seu lado da galeria, criança. – Eu rosnei, o dando as costas e adentrando para a área delimitada para pinturas à óleo, passando por um pequeno corredor que dava à sala de funcionários, onde tinha uma mesinha de madeira com pés de ferro enferrujado, e três cadeiras dobráveis não muito confiáveis. A jarra de café estava no balcão acoplado à parede junto com os copos de papel descartável.
Quando abasteci meu suprimento de café suficiente para três dias, e tive certeza de que não faltaria, voltei para a ala das pinturas, na pretensão de ficar próxima aos meus quadros expostos para abordar algum possível comprador, ou vigiar qualquer idiota que tentasse destruir meus quadros pra chamar atenção. Diferente dos grandes museus, a galeria que me patrocinava não disponibilizava telas de acrílico para proteger as pinturas.
Parei ao lado do meu quadro que havia chamado de 'Vermelho', tentando decifrar as expressões das pessoas que se aproximavam para ver o motivo patético da minha frustração. Ouvia os elogios dirigidos à mim de quem reconhecia que eu era a autora da obra, e agradecia com um sorriso minimamente educado no rosto. Mas no fundo eu sabia que aquele quadro poderia ser um dos piores, se não o pior que eu já havia feito em todos os anos da minha carreira, me recusava a olhar para ele, e só olhava quando alguém me perguntava sobre algum detalhe, o qual eu respondia tentando não vomitar ao olhar o tanto de erros ridículos que havia cometido.
Uma senhorinha até havia me perguntado se eu era gótica, ou tinha algum envolvimento com satanismo. Forçadamente eu sorri com um falso divertimento e expliquei que não.
Houve um momento em que eu finalmente pude respirar, até que um homem se aproximou do quadro, seu rosto sem emoção alguma.
Pela primeira vez, senti que não podia adivinhar o que alguém estava pensando sobre meu trabalho. Ele ficou lá, imóvel. Olhando para o quadro como se a vida dele dependesse daquilo. Me deixou em estado de total perplexidade. Como ele conseguia ficar olhando por tanto tempo para aquela barbárie que eu havia feito?
Ele era grande. Não. Enorme, devia passar de um metro e oitenta de altura, além da massa muscular que ele carregava, e o silencio que fazia questãode manter, o fazendo ter uma presença ainda mais marcante, que atiçava minha curiosidade.
A primeira vista, ele não parecia ser uma pessoa que aprecia arte, a cicatriz no osso de sua bochecha e no lábio superior provavelmente passavam essa imagem. A expressão carrancuda, a postura perfeitamente reta, os braços para trás das costas denunciavam a possível vida que ele levava.
Tinha um militar na minha frente.
– Quanto você cobra por esse quadro? – Ele perguntou, sua voz, mesmo baixa e um pouco rouca, não necessitava de esforço pra ser ouvida, sequer retirou os olhos da tela, como se ela fosse desaparecer à qualquer momento.
Eu engoli em seco, passando minhas mãos suando frio pelo tecido do vestido. Mas quando olhei relutantemente para a tela, meu ódio e desgosto voltaram no mesmo momento.
– Eu a daria de presente, se você quisesse. – Eu respondi, lançando adagas com meu olhar sobre as camadas de tinta carmesim.
Ele finalmente desviou os olhos de seu objeto de desejo e me olhou, seu rosto ainda inexpressivo, mas os olhos professando sua curiosidade e confusão, como se pedissem explicação.
– Provavelmente esse foi um dos piores quadros que já fiz em toda minha carreira. – Eu suspirei, maneando a cabeça, me demorando nas palavras.
– E por que acha isso? – Ele perguntou, virando lentamente sua cabeça em minha direção, num movimento mínimo dos ombros para se virar para mim.
– É medíocre, fútil, a proporção está errada e as cores são muito previsíveis! – Eu exclamei, com um suspiro exasperado, colocando uma das mãos na minha nuca, como se de alguma forma pudesse puxar meus cabelos que estavam presos. – Mas, além de tudo, não tem sentimento. É um quadro frio.
Ah, se ela apenas soubesse as inúmeras coisas que aquele quadro havia despertado dentro dele...
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Loneliness. ' Simon Riley '
FanficDestruirei a mim mesmo e a todos que me rodeiam em um esforço para trazer à tona minha inspiração, e meu martírio será a insígnia de minha legitimidade criativa. ★ "Não se sente sozinha?" "Estou por mim mesma há tanto tempo que já esqueci como é a s...