Marília assistia, perplexa, enquanto Cassandra terminava de se preparar para explicar tudo o que já sabia. Findava a organização de um quadro que tinha montado depois que chegou na delegacia. O quadro era digital, exibido em um monitor grande. Além da delegada, havia outros colegas de trabalho que estavam ali para assistir.
— Certo, vamos aos fatos. — Cassandra esfregou as mãos e apontou a foto que estava no centro. Era de Sebastião, ainda em vida. — Este é Sebastião Bueno, a nossa primeira vítima, que foi encontrada no Parque Brito. Sebastião era o famoso dono de uma serralheria, casado com Inezita, outra vítima, proprietária de uma clínica. Nessa clínica trabalhava outra de nossas vítimas, cujo nome era Ingrid. Ingrid trabalhava na clínica de Inezita e foi encontrada morta no Lago Diacuy; ela era de uma família composta por quatro pessoas, sendo ela e mais três: a mãe, o pai e o irmão. O irmão de Ingrid trabalhava para Virgínia Tamanduá, e era açougueiro. E o irmão de Ingrid namorava Marina, que era funcionária da Serralheria e, como consta até o presente momento, estava grávida de Sebastião Bueno. Apesar do incêndio na casa deles e das mortes na família, o filho foi buscar Marina com vida, ainda esta manhã, em um hotel onde ela estava hospedada porque pretendia fugir. Ao que tudo indica, foi ele o executor de Marina, de Ingrid e do próprio Sebastião. Não temos certeza, mas é preciso encontrá-lo com vida, de toda forma. Já pedimos as imagens das câmeras nos arredores da rodoviária.
"Por outro lado, temos a morte de Inezita. Inezita, ao que parece, tinha um caso com Virgínia Tamanduá. Temos um vídeo de Virgínia executando um animal enquanto se despedia de um amante. O amante nos informou que Virgínia tinha casos extraconjugais e que o marido dela, Pablo Tamanduá, também adotava essa prática. Pablo tem um caso com Rogério, dentista famoso aqui na cidade. Rogério foi apontado na cena de morte de Inezita. A questão é: o açougueiro, Filipe, trabalhava para Virgínia... E Virgínia, tinha um caso com Inezita. Seria unir o útil ao agradável se ela mandasse executar Sebastião."
— Mas se a culpada é ela, como Inezita acabou morta? — Marília questionou.
— Ótima pergunta! Talvez ela tenha sido executada por Rogério ou por Pablo. Não sabemos ao certo o motivo, mas devemos investigar isso com urgência.
— E como você sabe tanto? — Alguém do grupo de investigações questionou.
— Eu trabalho. Temos muitas evidências apontando para Virgínia, Pablo e Rogério. Eu soube, pelo próprio Rogério, que ele teve um desentendimento com Inezita por um aparelho celular furtado enquanto ele estava na clínica dela. Ele não registrou a ocorrência do furto, de modo que resolveram entre si. Claro que isso é comum, mas me faz pensar que há algo de muito duvidoso em toda essa questão, pois a denúncia do furto não traria prejuízos para Inezita e nem para Rogério, certo? Ou traria? Desde que eu soube desse furto, há uma dúvida que me persegue: o que havia naquele celular? Há outras questões também, como o fato de Inezita não ser daqui e guardar segredo a sete chaves sobre isso. E todo esse embolo sendo que eles são praticamente da mesma família. Um núcleo familiar bastante caótico que, de certa forma, supostamente arrastou consigo uma família inteira. — Cassandra respirou um pouco. Não era de falar tanto, mas queria por tudo para jogo e obter colaboração. — Há muito para descobrir ainda, como: por qual motivo a exibição pública dos assassinatos? Seria uma briga? Bem... Não podemos contar tanto com a tecnologia, mas as imagens das câmeras próximas ao Hotel Oásis do Cerrado já foram solicitadas. Nossas testemunhas estão escassas e nos resta conversar com as três principais pessoas relacionadas: Virgínia, Pablo e Rogério. E eu duvido muito que qualquer uma dessas três pessoas deseje colaborar conosco.
Cassandra respirou fundo diante dos olhares e do burburinho que se formava. Estava perdida ao mesmo passo em que tinha informações demais. Terminou a apresentação e sentou-se em uma cadeira para ver tudo o que os colegas tinham.
Em resumo, testemunhos da noite da morte de Inezita que não somavam tanto, mas reforçavam a presença de Rogério. Ninguém viu nada de suspeito.
Uma estranha sensação começou a sufocar a investigadora, porque, de súbito, ela foi atingida por um sentido quase epifânico: ela parecia estar dentro demais do caso, diferente de seus colegas. O assassino sabia seus passos, talvez a estivessem vigiando por todo aquele tempo sem ela sentir. Puxou na memória qualquer movimentação suspeita, mas não se lembrava.
Ao fim da reunião, caminhou até seu computador, onde preencheria as papeladas. Observou se alguém lhe dava uma atenção especial, mas não. Procurou por possíveis grampos e violações em seus registros, entretanto, não encontrou nada.
Porém ela tinha sido sequestrada. Foi por acaso? Porque estava mexendo onde não devia?
Os pensamentos se avolumavam e enroscavam, deixando-a maluca. Então começou a pensar naquilo que não podia passar despercebido: Santa Arena. Parecia uma conversa estranha.
— Santa Arena... — Cassandra murmurava enquanto tamborilava os dedos na mesa e se questionava quando as imagens das câmeras seriam entregues. Precisavam de Filipe. — Santa Arena...
A mulher abriu o site de busca.
Por mais que Vigílio não fosse confiável, seu testemunho dava a entender que Virgínia chantageava Rogério por algum motivo. Havia algum negócio entre eles? Sim, parecia que sim.
Cassandra digitou Santa Arena na barra de inserção do site e pesquisou, entretanto, não encontrou nada de relevante. Então abriu um mapa do Brasil na região norte, onde normalmente se usava a gíria "égua". Lembrou-se das viagens de Inezita para Belém. O Pará.
A investigadora fez pesquisas de combinações de palavras, não alcançando sucesso em sua labuta. Expressava sua frustração cada vez com mais energia.
Apoiou os cotovelos na mesa, enfiou os dedos entre os cabelos e estava prestes a voltar para seus relatórios. Fechou as guias daquela pesquisa irritante, até que um ponto no mapa do Pará chamou a sua atenção.
Santarém.
Cassandra procurou pelo gentílico de Santarém. Era santareno. Não era Santa Arena, o que Vigílio ouviu. Era santarena.
O coração de Cassandra acelerou.
*****
O correio passou pela casa de Cassandra, deixando em sua caixa postal um pacote de cerca de um quilo.
*****
Logo após a reunião, três pessoas saíram de dentro da delegacia para fumar. Uma dela sacou um celular e efetuou uma ligação.
— Chefia? Sinto muito, mas vou ter que tirar a sua paz enquanto digo que Cassandra está se aproximando. Eu lavo as minhas mãos.
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Assassinato no Parque Brito
Mystery / ThrillerTetragonisca Angustula é o nome científico - e branco - de um poderoso e belo inseto de cor dourada. Uma abelha sem ferrão, pequena, nativa de regiões latino-americanas, que produz um delicioso mel, cuja suavidade é incomparável. Não fosse o suficie...