TEMPESTADE

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A noite já estava caindo quando Cassandra recebeu uma ligação do Centro Médico, vinda de um número desconhecido. A vizinha, Marínia, já podia voltar para a casa onde morava, entretanto, o filho não estava lá e nem atendia as ligações, enquanto a idosa não tinha dinheiro para pegar uma condução paga.

— Nem tomei banho ainda. — Cassandra falou para si mesma enquanto ia tirar o carro da garagem. Era melhor ajudar, e rápido, porque logo uma chuva violenta começaria.

Havia uma ventania violenta carregando as folhas soltas das árvores, para toda parte, e levantando partículas de terra vermelha que invadiam moradias por entre as frestas. Jataí estava coberta por nuvens pesadas, muito escuras, da cor do chumbo, que tapavam as luzes emitidas por todos os astros, impedindo-as de chegar na cidade, como uma muralha. A investigadora tratou de ir mais rápido quando viu, ao longe, um poste declinando rumo ao chão. Demorou cerca de quinze minutos para Cassandra estacionar na frente do Centro Médico, onde pessoas abraçavam seus próprios corpos enquanto esperavam pelo transporte público, tremendo de frio. Ela não era a única querendo, desesperadamente, chegar a algum lugar. E provavelmente seria a única que não se molharia.

Desceu do carro no estacionamento e caminhou até a recepção ampla, com luzes frias e paredes de cores claras. A senhora Marínia estava sentada em uma das cadeiras de espera, com a face exausta. Trazia consigo uma sacola de supermercado cheia de roupas sujas e outros pertences. A imagem fez o coração de Cassandra doer, pois o abandono de idosos é uma realidade dolorida e presente. Ela fazia tudo pelo filho, mas ele não podia ajudá-la um pouco. Seria ainda pior quando ela chegasse em casa e não visse o cachorro lá.

Cassandra arrancou forças do âmago de seu ser, abriu um sorriso e tentou lidar com a situação com uma atitude positiva.

— Dona Marínia! — Chamou. — Vamos? Pegar vazando.

A idosa abriu um sorriso triste e se levantou com dificuldade.

— Deixa eu carregar isso — Cassandra tirou a sacola das mãos de Marínia.

— Tenho saudades de quando eu era jovem e forte. — Marínia disse com a voz fraca, arrastada e cheia de pesar. Dava para notar que sua boca estava seca. — Logo eu morro e isso acaba.

Cassandra olhou para o lado, pensando na possibilidade de conseguir algumas informações sobre atendimento psicológico. Desistiu, contudo, porque pensou que não adiantava.

— Para com isso, dona Marínia! — Cassandra repreendeu, sabendo que não era a melhor forma de lidar. — Sabe, eu tenho uma curiosidade. Qual é a sua comida favorita?

A senhora olhou com estranheza enquanto dava passos curtos. Primeiro ela enrugou a testa, mas depois sorriu.

— Faz algum tempo que não respondo do que eu gosto. — Então ela realmente riu.

— Estou interessada. Com certeza é alguma coisa que não conheço. — Cassandra incentivou.

— Que nada, menina. — A mulher dispensou com um gesto da mão. — A minha comida favorita é a galinhada. Minha mãe fazia uma galinhada muito gostosa e colocava queijo fresco para derreter em cima. Sinto fome só de lembrar do gosto.

Ela fechou os olhos para lembrar melhor. Podia sentir o sabor outra vez. Cassandra abriu a porta do carro para Marínia entrar. Auxiliou-a, colocou os pertences dela no porta-malas e sentou no seu lugar.

— Eu ainda não jantei, vamos procurar um restaurante? É por minha conta! Precisamos passar na farmácia para comprar remédios? — Cassandra mal deu tempo de a mulher falar e já colocou o carro em movimento.

Depois de passarem na farmácia que tinha os melhores descontos, foram até um restaurante self-service, que ficava na Avenida Veriano de Oliveira, e funcionava à noite.

Assassinato no Parque BritoOnde histórias criam vida. Descubra agora