No Astroporto de Guarulhos uma nave da Embraer Acrux vII da Classe Narval, estava sendo preparada para receber um seleto grupo de 50 expedicionários em nome do Gabinete. Outras pessoas físicas e jurídicas tinham tanto quanto ou mais condições e recursos para empregar em tal missão, mas não o fizeram por medo da fúria dos marcianos.
Alguns comparavam a missão com molhar o dedo na água para aferir se a temperatura era agradável, outros mais pessimistas diziam que era jogar um boi velho e pouco valioso no rio Araguaia para ver se tinha piranhas que se ocupariam com aquele boi enquanto o gado atravessava.
Hipátia estava perto do portão de embarque fascinada ao ver uma nave da classe Narval pela primeira vez, no espaço interestelar não havia necessidade de mandar naves ao espaço, pelo menos não com frequência. Houve uma lembrança de quando ela era criança com 10 anos, seu pai Andrei contou das três únicas vezes que mandamos naves a outros planetas no meio da viagem interestelar de nosso planeta até então órfão pela segunda vez.
"O primeiro foi o Tupã" Disse Andrei apontando pro teto do quarto da Hipátia onde as imagens eram projetadas enquanto seu pai contava histórias. No teto apareceu um grande círculo girando com círculos menores girando dentro, o objetivo era sempre usar a força centrífuga do giro para emular uma gravidade artificial. "O planeta estava passando perto de um sistema solar mas não era igual ao Sol I, o planeta precisava ficar muito perto desse sol para receber uma luz significativa e ficava sujeito a tempestades solares."
"Se a estrela não era boa pra gente então por que foram?" Perguntou a pequena.
"O Gabinete quer que seja idêntico ao Sol I, quem quiser pode ir para outro sistema solar e viver no subsolo, ou construir uma superesfera igual a gente."
"Eu queria que tivessem mais naves, como as que o senhor projeta." A menina fez um bico como era o costume quando pedia algo ou ficava chateada.
"Na próxima parada, uns 15 anos só, vai ser nossa estrela definitiva, eu vou projetar naves de todos os tipos e tamanhos para você viajar." Disse selecionando os projetos dele nos arquivos, no teto foi projetado dezenas de naves otimizadas para dezenas de finalidades. As naves muito bem organizadas em classes com nomes de cetáceos para dar uma ideia de tamanho, Hipátia não se lembrava se as classes eram arbitrárias ou se seu pai desenvolveu uma lógica para relacionar os tamanhos.
Ela via que a classe Vaquita era a menor de todas, só ocupavam uma pessoa; a classe Golfinho ocupava 5, a Boto 10, Beluga ocupava 20, na Terra não havia necessidade de uma Beluga. Ela não tinha interesse nas classes menores, gostava dos grandes cetáceos e das grandes naves, a Cachalote era um couraçado para regiões em que poderia haver impacto com o casco, como os antigos anéis de Saturno. A classe Franca era uma nave elegante, projetada para percorrer distâncias de algumas dezenas de anos-luz, a classe Baleia-Azul obviamente era a maior de todas e a única sem dimensões exatas definidas, projetada para evacuar toda a humanidade caso fôssemos obrigados a deixar nosso planeta.
"O que era um Narval?" Perguntou a menina, testava o nome algumas vezes, parecia-lhe engraçado, mas depois adquiria uma sonoridade de algo altivo e elegante.
"Sabe o que é uma beluga, né?" Perguntou o homem, sabendo que precisaria explicar o e procurando meios de comparação.
"Não sei." Foi a resposta, Andrei deu um comando para colocar imagens dos cetáceos ao lado das respecivas naves com seus nomes, da menor para a maior a Hipátia viu com curiosidade o boto que ela conhecia. Em seguida viu a beluga que parecia um boto maior e com um calombo na cabeça, por fim depois da beluga viu o Narval que era parecido com a anterior mas tinha o que parecisa ser um chifre acima da boca. "Uau, ele tem chifre! É um unicórnio do mar?"
"Era exatamente assim que os antigos chamavam eles! Eram lindos, o que parece ser um enorme chifre espiralado era o dente superior esquerdo, não se sabe até hoje a exata função desse dente." Ao terminar seu devaneio pelo mundo dos belos cetáceos Andrei viu sua filha chorando, sorriu lembrando que quando era criança também chorou pela morte dos antigos cetáceos e outros seres belos quando a Estrela Assassina nos exilou do sistema solar. "O que foi filha?"
"Eles morreram papai, nunca mais vão existir?" Disse a menina com os olhos embaçados de lágrimas.
"Vão existir filha, enquanto tivermos o código genético deles podemos fazer um novinho, mas não temos habitat ainda, os que fizemos artificialmente não sobrevivem por muito tempo em cativeiro por causa dos 'chifres'." Ele abraçou a menina que chorou até dormir em seus braços.
Lá estava ela vendo a nave projetada por seu pai, havia algo de irônico ser da classe Narval, ela a levariam para o L'Astrolabe, de um modo não tão elegante como as antigas decolagens de foguetes e até de aviões, cheias de rituais e fraseologias.
Ao fim de um monólogo interno viu entrarem pelo portão de embarque seus colegas do Gabinete, da USP, da UNSP e até da NMIT (New Massachusetts Institute of Technology), ela sempre ria por terem mantido a língua original e acrescentado o "New".
Por fim chegou o Chandra III, sempre com uma cara azeda de quem cheirou bosta, se dirigiu para a ponte de embarque seguido pela pior laia do Rio de Janeiro que era alguns membros da família Crepaldi. Os Crepaldi tinham mania de boicotar os projetos do pai de Hipátia na intenção de promover os da Astrobus, sempre inventando mentiras ao invés de apontar algum erro de verdade no projeto na vã esperança de que se o projeto falhasse eles pudessem se beneficiar.
Ao entrar na nave ela ficou decepcionada o ver filas de bancos, mas era só até chegarem no L'Astrolabe onde teriam suas confortáveis cabines privativas com tudo o que tinham direito. Os motores rugiram e sentiram-se mais pesados, dentro de alguns minutos estariam num grande cilindro prateado e giratório que era o L'Astrolabe, Hipátia se decepcionou por parecer um momento banal, talvez a maioria dos momentos históricos tenham sido banais de se viver.
* Oi pessoal, desculpa por ser só esse capítulo mas vou tenter escrever mais, eu só precisava de alguma ideia legal que estava adormecida e resolvi aproveitar essa das naves por enquanto. *
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Os Astrocratas
Science FictionO capitão de uma nave de exploração interestelar detecta sinais de rádio da Terra, os primeiros sinais de rádio que saíram da atmosfera foi a transmissão das olimpíadas na Alemanha nazista em 1936. Depois disso ocorrem catástrofes na humanidade e pr...