{13} Pertencer.

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Kairo trabalhou a tarde toda depois do encontro com Elysia, se ela soubesse que ele não descansou, levaria uma grande bronca. Mas infelizmente ficou atolado até a noite, quando parou já passava da hora do jantar e um bom sono cairia bem.

Sorriu ao lembrar da cara de brava que ela fingiu ao intimá-lo sobre isso. Elysia era uma mulher excepcional, sempre se mostrou preocupada com todos ao seu redor, menos consigo mesma. Sentia que isso a machucava, mas jamais abriria mão.

Ela carregava consigo tantas bagagens difíceis de lidar, mas era forte o suficiente para seguir em frente, mesmo com algumas quedas. Admirava a força de vontade. Gostava de saber um pouco mais sobre ela a cada conversa que tinham.

Gostava de conhecer cada nuance, o ar de mistério ao redor dela deixava ansioso para descobrir tudo. Era uma mistura de curiosidade com medo. Talvez a paixão causasse todos esses sentimentos, sentia-se um pouco sufocado às vezes, mas também sentia-se verdadeiramente feliz com tudo isso.

O ser humano é insatisfeito com tudo e todos, então ele como uma pessoa como qualquer outra, era insatisfeito e insaciável. Existiam coisas que o agradavam, mas havia outras que não. E a mesma coisa era com seus sentimentos.

Ao mesmo tempo que se sentia bem e genuinamente feliz, também sentia-se sufocado. Tinha momentos que não sabia lidar com eles e entrava em um túnel sem saída. Era desesperador, mas intenso. Sensações opostas que faziam parte do que era.

A mesma coisa era com sua família, houve momentos que se sentiu parte dela e foi feliz — durante a infância, em especial —, mas agora era tão difícil até dividir o mesmo ambiente que eles. Principalmente com seu irmão. Tudo que sobrou de seus pequenos momentos de felicidade, foram pedaços minúsculos de vidros quebrados pela falta de afeto e amor.

Em qual momento de sua vida sua família tinha se tornado tão distantes? Onde havia errado como filho? Foi essa pergunta que pintou em sua mente durante anos a fio, atormentando e assombrando. Principalmente durante a adolescência, que já não foi uma época muito boa e o afastamento dos pais só piorou tudo.

Sua maior vontade era cortar de uma vez por todas os laços, mas algo ali ainda o impedia. Uma força maior, um sentimento de querer pertencer a algum lugar. Kairo nunca se sentiu pertencente a algo, mas gostaria de sentir pertencer a sua família.

E os jantares em família, por mais caóticos que fossem, ainda se sentia na obrigação de ir. Mesmo que seja difícil entrar na casa que cresceu e encarar todas as memórias, em sua maioria ruins. Mas ainda era o lugar que nasceu e viveu boa parte de sua vida.

Ainda era sua casa de qualquer forma. Ainda poderia voltar quando estivesse com medo. Mesmo que aquilo significasse conviver com seu irmão.

E o sentimento que queria destruir de vez, surgiu ao receber uma mensagem de Kevin. Seu corpo inteiro tremeu ao ler o convite para jantar na casa dos pais. A última ida até lá resultou em um lábio cortado e provavelmente aconteceria o mesmo de novo.

Tinha um tempo para pensar se deveria ir ou não. Já que só seria na noite seguinte e até lá, colocaria sua cabeça no lugar.

Depois do jantar foi tentar dormir e preparar sua mente para o que vinha a seguir, pois sabendo como terminou o último jantar, seu irmão apontaria alguma coisa.

O dia passou voando para infelicidade dele, seu corpo tremia de uma ansiedade ruim. Odiava essa sensação, todavia, era a única que sentia quando tinha que voltar para a casa dos pais. E esse sentimento o perseguiu durante toda vida, quando estava na escola era a mesma coisa.

Sempre teve receio de voltar para casa. Como alguém poderia ter medo de voltar para casa? Isso martelou em sua mente durante anos, mas nunca obteve respostas.

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