Capítulo 6

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Minha cabeça ainda não processou tudo o que aconteceu nas últimas horas, mas me forço a dormir após tomar meu remédio para que possa voltar a normalidade ao acordar.

Sinto meu corpo relaxar e então o cenário é mesmo. Estou em frente a cafeteria, sem poder me mover, e me afundo em lembranças.

Estou com um vestido longo, preto, cheio de pessoas ao meu redor. O espaço é amplo, com um prédio antigo próximo. Reconheço esse lugar. Mas onde é? Me vejo procurando algo ou alguém, minha cabeça não consegue entender o que é sonho ou o que é realidade.

Escuto vozes e automaticamente me viro, mamãe. Com roupas mais antigas e pouca maquiagem, mas definitivamente mamãe.

_ Olhe como é lindo. Tudo aqui é maravilhoso - Diz ela.

Sinto meus olhos marejarem. É a primeira vez que sonho com ela após o acidente de carro que a tirou de minha vida

_ Querida, seu marido está muito longe? Podemos ir buscá-lo.

Marido?

_ Mamãe, sou eu, Adi. Não me casei ainda. Estava com tanta saudade. – A procuro para um abraço.

_ Querida. Seu pescoço, está vermelho novamente. E pela milésima vez, não demos esse nome à você, você se chama Amelie.

E instantaneamente ao relar em meu pescoço, pulo sobre minha cama.

Olho para a janela, já amanheceu. Meus olhos caem sobre as fotos na estante de meu quarto. Mamãe, quanta saudade.

Me recordo aos poucos do sonho que acabara de ter. Amelie, marido... e o local, eu definitivamente reconhecia o local. Forcei minha mente por alguns minutos, busquei em todas as viagens que já fizemos juntas, em todos os lugares que ela já disse ter visitado quando jovem e então me dei conta, Louvre. Museu do Louvre, Paris. Era lá. Sorri ao me dar conta de que nossas passagens estavam compradas quando ela veio a falecer e nunca de fato fomos até Paris.

Me levanto da cama para afastar todos esses pensamentos e decido tomar uma atitude e agradecer Jeon MinSeok por me ajudar ontem, não poderia ficar devendo um ato de gratidão a ele, já que nos veríamos bastante pela região.

Coloco a primeira roupa que vejo no guarda roupa e decido ir até a cafeteria. Me olho no espelho com a certeza de que estou simples o suficiente para não parecer estar interessada nele e somente ir agradecer pelo acontecimento.

Quando dou por mim, já estou em transe e entrando na cafeteria, me dirigindo a ele e a mesa a qual ele está atendendo.

_ Posso falar com você? – finalmente consigo falar em coreano com ele.

Ele me olha por cima do ombro e acena com a cabeça, apontando em direção a uma mesa para qual me dirijo e por fim me sento. Sentindo sua presença atrás de mim a todo momento, minha cabeça começa novamente a dar algumas pontadas porém de maneira mais branda.

_ Olá. Meu nome é Adália, sou brasileira e estou em fase de treinamento na policia cientifica aqui de Seul. Ontem foi meu último dia e acredito que o cansaço tenha se acumulado, então acabei simplesmente desmaiando em meio a rua. Moro a dois prédios daqui, por isso estava passando por esse local. – Respiro fundo e continuo – Enfim Sr Jeon, obrigada por me ajudar ontem e por me segurar para que algo pior não acontecesse. Caso tenha algo que eu possa fazer algo por você, faço com muito prazer. Novamente, obrigada – Digo me curvando a ele em sinal de respeito.

_ Sou mais novo que você. Não precise me chamar de senhor ou mesmo se curvar. Somente fiz o que qualquer um faria. Não se sinta mal, essas coisas acontecem. – Disse sorrindo.

_ Certo. Obrigada novamente! – Afastei-me da mesa mas suas mãos me seguraram.

_ Fica. Toma um café.

_ Claro - disse sem jeito - Aceito sim. Poderia trazer algo salgado para que eu possa comer também?

_ Posso escolher?

Assenti em relação a sua pergunta e logo em seguida ele voltou com meu pedido.

_ Então – disse puxando a cadeira para se sentar novamente – Brasil?

E automaticamente consegui imaginar suas ideias: Neymar, Ronaldo, muito futebol. Mas o que saiu de sua boca me surpreendeu.

_ Adoro o Brasil. Já viajei muito pela américa do sul. Morei muito tempo na Argentina. Já esteve lá? Eu adorava. Mas sempre preferi o Brasil, conheci várias praias... como se chamava mesmo? Tem o mesmo nome de uma banda. Sepultura, ne? Ali tem as praias mais lindas.

Meu queixo caiu.

_ É lindo mesmo. Na cidade de Bombas, ne? Que legal. A primeira pessoa que ouviu falar que eu era do Brasil aqui me perguntou sobre futebol. Não me leve a mal, eu adoro, tenho meu time do coração. Mas sinto que o Brasil é mais do que só isso.

_ A com certeza, eu adoro futebol também, mas somente entende isso quem é ou vai para o Brasil. É igual dizer que a Coreia só tem idols de kpop.

Me vi rindo do comentário sarcástico de Jeon e felizmente o vi rindo de volta.

Automaticamente coloquei a mão em meu pescoço pois as fisgadas ainda estavam ali e, surpreendentemente, aconteceu novamente. Os dois, ao mesmo tempo.

Jeon sorriu sem graça para mim e pediu licença pois tinha mais clientes para atender. Confirmei com a cabeça e sai da mesa, me levantando e indo em direção ao caixa para pagar. Foi quando o sino da porta ressoou pelo ambiente e vi Jihoon entrar com Mar.

_ Estávamos procurando você. Você cancelou o jantar ontem mas não nosso piquenique de hoje. Vamos! – Disse meu amigo logo ao me encontrar na cafeteria.

Olhei para Jeon, ele observava Jihoon com olhares baixos e um tanto quanto sombrio, como se quisesse pular no pescoço dele a qualquer momento.

Me despedi de longe e fomos embora.

Cheguei ao parque com Jihoon e Martina, estava sem paciência para aquilo, parecia que eu estava sobrando a todo momento. Eles tinham assuntos em comum, ambos moravam na Coreia a tempos, sempre podiam comentar sobre o clima com propriedade, sobre os pontos turísticos e sobre os amigos em comum. Eu? Eu estava sozinha, da mesma maneira que estava no Brasil.

Comi algumas frutas com eles, enquanto os ouvia conversar e marcar de ir em algum show que iria ter aos arredores na próxima semana. Neguei incessantemente que não queria ir e eles acabaram por entender. Não fazia a menor ideia de quem iria se apresentar, onde seria e a data exata, nada me interessava mais naquele momento.

Minha cabeça deu um nó, pois somente me lembrava de Jeon falando que morou na Argentina por um tempo. Meus pensamentos se realinharam e me lembrei da noite anterior onde o chamei de Anjo, e então tudo se alinhou, por isso ele riu.

_ PORRA! – Pensei em voz alta. E Quando me dei conta, meus amigos me olhavam.

_ O que foi Adi? Tudo bem? – Martina me perguntou com sincera preocupação e então já entendi que Jihoon havia contado a ela sobre a crise do dia anterior.

_ Tudo bem, preciso ir embora – Disse levantando-me – Esqueci que precisar lavar roupa para poder ir ao trabalho amanhã. Até, pessoal. Vejo vocês! – Não me despedi com beijinhos ou abraços, me senti invadida porque Jihoon havia contado a Mar sobre meu problema pessoal. Somente queria ir ate minha casa e me preparar para meu primeiro plantão.

Diversas vezes durante o caminho pensei em entrar na cafeteria e me desculpar, dessa vez por ser indelicada demais. Mas me recusei, não iria atrás dele novamente. Ele não deveria entender do que o chamei e enfim, eu estava zonza, mesmo que entendesse, ele iria compreender minha confusão com os idiomas.

Subi através do elevador e adentrando no corredor consegui ver uma cesta com cafés solúveis sob meu tapete. Havia um bilhete, com uma única palavra.

ANJO. 

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⏰ Última atualização: Jun 27, 2024 ⏰

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