Vestidos não ficavam bons em mim. É verdade, não uma desculpa! Ou tinham muitos babados, ou eram muito decotados, muito rendados ou muito sem graça. Nada ficava bom. E não era como se eu quisesse conquistar alguém por causa da droga de um vestido. Acontece que minhas criadas não entendiam aquilo. Elas eram jovens, diria ter minha idade, e não tinham medo de que suas atitudes parecessem impróprias para tal trabalho. E, naquele momento, o que elas faziam era tentar me convencer a largar as calças que havia lá, penduradas no armário, tão lindas e tão maravilhosas pra mim.
"Mas, senhorita! Este é seu primeiro jantar no castelo!"
"Você deve estar deslumbrante! Todas as garotas querem estar, elas vão batalhar para isto."
"É, dezessete garotas de vestidos e unhas afiadas prontas para fisgar o príncipe. Isso não é mole!" Elas continuavam a falar, uma atrás da outra, e eu apenas encarei o chão, meus pés afundados em um mar de vestidos na qual eu havia descartado.
"Nenhuma vai querer ir de jeans em uma noite como essa," comecei, a voz bem baixinha, e elas pararam de falar apenas para me olhar atentamente, esperando eu dizer que aceitava ir com um belo e correto vestido. "e é exatamente por isto que eu vou com uma." Fui até meu guarda-roupas, passei as mãos por entre as calças e, por fim, escolhi uma vinho de veludo. "Vocês me ajudam?" perguntei, tímida, com a esperança de que elas não estivessem magoadas. Após bufarem e suspirarem, elas vieram até a mim, determinadas a me deixar linda.
"Se eu estivesse no seu lugar, iria com um vestido dourado e um decote até o umbigo! Queria ver se o senhorzinho Kaylon não me repararia." Resmungou Lailina, ainda inconformada. "Mas vamos ver o que poderemos fazer com uma calça. Rainha America nunca deveria ter feito aquela brincadeira do usam jeans e moletons quando quiserem, certas pessoas não conseguem entender as piadas."
Fiquei calada. Sorrindo, mas calada. Ela tinha razão, afinal, pois eu não era a única a usar calças por aqui. Tá, provavelmente, nenhuma vai ir de calças no jantar, mas em nossos tempos livres - digo, salão das mulheres - a maioria prefere ficar de moletons e blusas larguinhas, muitas vezes até de pijama. E America, nossa rainha, também não ficava de fora! Pela manhã de hoje, ela estava de roupão e pantufas, e apenas os tirou na hora do café, e de repente a vimos em um magnifico vestido azul claro. Era assim que funcionava, em um estrar de dedos, todas nós ficávamos prontas.
"Mandamos bem, até." Lailina colocou as mãos na cintura, me encarando de cima a baixo. "Acho que o príncipe vai conseguir notar a senhorita com esta coisa aí, também." Ela apertou os olhos para a calça que eu vestia, ainda um tanto revoltada com ela.
"Quê isso, Lai! Ela está maravilhosa!" Mixele exclamou, os olhos que estavam pousados em mim eram cheios de orgulho.
"Acho que a senhorita vai arrancar mais olhares do que os do príncipe." Brenda piscou um olho pra mim, um sorriso malicioso nos lábios finos. Na hora, me lembrei do filmador atrapalhado do castelo, no jardim. Então, antes de sair do quarto e ir rumo a sala de jantar, enfrentar todas aquelas garotas, eu agarrei minha câmera, apertando-a nos meus braços contra o peito.
"Agora sim, estou perfeita." Elas sorriram, as mãos no peito, e então me empurraram pra fora do quarto, dizendo que eu já estava atrasada. Concordando, saí de lá, correndo pelas escadas.
E eu estava certa. Não havia uma que se escapasse, todas estavam usando vestidos dos mais notáveis e esvoaçantes. Mas, podia ser o que for, uma simples calça jeans era a estrela daquela noite. Até a rainha havia ficado surpresa, mas, em seguida, me enviou um sorriso e apontou para minha cadeira, onde logo me sentei.
"Você está linda, Carm." Me sussurrou Lilith, dando um sorriso. Nos conhecemos no aeroporto, antes de vir ao castelo. E naquele momento, parecíamos já ter virado melhores amigas de tanto que conversamos. Ela até tinha me dado um apelido, Carm, pra ficar mais fácil de todas me chamarem.
"Calça jeans. Que incrível." Charlote revirou os olhos azuis, franzindo o nariz. Ela é quem fazia mais encrencas até então, e onde ela estava havia sempre uma confusão. Ela era a rainha do drama, ninguém a vencia. Tinha também sua amiga, Kath, uma morena arrasadora de saltos. Mas também as mais tímidas, quietas, como a Calian, uma menina magra e de pele macia que possuía uma rara doença onde afetava os pulmões. Qualquer um que olhasse para ela diria que sua alma não estava mais exatamente aqui, viva, os olhos com tão pouco brilho e a boca sempre fechada, sem nunca dizer um A.
E em questão de horas, cada uma já tinha seu rótulo. O meu? Falsa mexicana fotógrafa. E na verdade, achava bem a minha cara.
Peguei a câmera, erguendo só um pouco, escondendo-a o máximo que podia entre minha mãos. Arrastei a lente por cima da mesa e observei o que ela conseguia captar, muitas vezes apenas as mãos dos selecionados que ficavam na fileira a nossa frente. Mas outras vezes, conseguia flagrar um sorriso do príncipe, lá no canto, vendo os pais, ou até uma troca de olhares da rainha e do rei. Acontece que eu via um outro mundo dentro das câmeras, e o resto das pessoas não costumava entender isso. Era um mundo só meu.
Sorri, olhando para eles, e quando voltei a olhar para o visor da máquina, vi aquele filmador do jardim. E ele parecia estar encrencado, já que um grandão de gravata borboleta vermelha cutucava o dedo gordo em seu peito, não parecendo nem um pouco amigável. E então ele jogou um monte de fios em seu rosto, saindo de perto, deixando para trás um rapaz entristecido. Olhei para o lado, onde a câmera havia o gravado, e foi quando o vi ajoelhado, recolhendo tudo.
Me levantei, fazendo uma reverência ao príncipe e seus pais, e me retirei da mesa.
"Outro dia difícil?" Me abaixei para ajuda-lo, agarrando quantos dos fios meus dedos conseguiam.
"Outro dia difícil." Ele suspirou, devagar, apertando as mandíbulas.
"Fosse expulso da gravação de novo? Aquele cara parecia bem estressado." Quis saber, embora mantivesse uma voz calma, como se eu estivesse dizendo apenas um Olá.
"Ah não, dessa vez eu nem cheguei perto das máquinas." Ele olhou em direção ao salão, onde aos poucos os câmeras saiam, finalmente deixando os selecionados jantarem em paz. E foi então que percebi o quão longe estávamos de lá, em um corredor qualquer que eu ainda nem havia passado. Senti suas mãos tocarem as minhas, e me lembrei o que tinha vindo fazer aqui. Soltei meus dedos envolta dos fios e deixei que ele os pegasse. O Observei colocar tudo em sacolinhas, separando cada tipo, e depois ele se levantou e ergueu a mão pra mim. "Já te disse que eu sou o mais normal daqui, não te disse?" Meus olhos agora pousaram em seu rosto, dentes lindos sorrindo pra mim.
"É, acho que já citasse algo assim em algum momento. Eu sou a menos louca, também."
"Menos louca?" Ele sorriu, as sobrancelhas arqueadas, olhando para minha calça. E então voltou a mirar meus olhos, um brilho interminável em suas íris.
"Sem dúvidas." Novamente o vi colocar a bolsa preta nas costas, e ele fez um cumprimento como a de um soldado, se despedindo. "Nunca vás me falar de você, não é?"
Ele parou de andar e se virou para mim. "Há uma vantagem quando as pessoas não sabem quem você é. Ninguém pode se decepcionar por algo que não conhece."
Emburrei a cara, encostando o ombro na parede.
Qual é! Eu só quero conhece-lo! pensei, nervosa. Isso é pedir demais?
"É apenas um nome. Prometo não te zoar se ele for feio." Mostrei as mãos, provando que não estava cruzando os dedos nem nada.
"Bom, costumam me chamar de sacola preta." Ele arrumou a bolsa negra em seu ombro mais um vez, sorrindo. Ele parecia adorar mostrar aqueles lindos dentes reluzentes. Era tão fácil vê-lo sorrir, que até eu sentia vontade de também o fazer.
"Prazer, sacola preta. Eu sou a falsa mexicana fotógrafa." Ri, imaginando o quão ridículo seria combinar esses apelidos.
"Achei a sua cara." Agora, pela última vez, ele ajeitou a bolsa nas costas, dando meia-volta. "Obrigado pela ajuda, garota menos louca."
Confessatório: Eu vivo agarrada com um livro, e nunca saio de casa sem um mesmo que eu não vá ler, assim como a Carmelita e a sua câmera. E vocês, são assim também com algo?
#ACaçadaDosSelecionados
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Projeto Princesa
FanfictionVocê já imaginou como seria viver no sótão de uma velha escolinha, escondida de tudo e todos por toda a vida? Essa era a realidade de Celina, uma garota que fora abandonada pelos pais e acolhida por uma desconhecida, que por sinal, era professora. ...